EAD, verbas sindicais e eleições: os interesses na reforma do ensino médio

As redes sociais simplificam a disputa na educação a um Fla-Flu político. Vira o quepe das escolas cívico-militares do bolsonarismo contra a barba de Paulo Freire da esquerda. Mas isso é uma cortina de fumaça que esconde interesses políticos e econômicos por trás da reforma do ensino médio.

O que aconteceu

O projeto da reforma deve ser votado amanhã na Câmara. Durante duas semanas, o UOL perguntou a parlamentares dos dois campos políticos quais os interesses em cada proposta.

Houve acusações mútuas entre direita e esquerda. Elas passam por verbas do MEC (Ministério da Educação), financiamento de sindicatos e nichos eleitorais e motivam ambos os lados a defender determinado modelo.

Discussões sobre a reforma do ensino médio levaram alunos às ruas em 2016
Discussões sobre a reforma do ensino médio levaram alunos às ruas em 2016 Imagem: J. Duran Machfee/Futura Press/ Estadão Conteúdo

Os interesses por trás da proposta da esquerda

A esquerda prioriza o aprendizado de disciplinas tradicionais. O entendimento é se concentrar em entregar um básico bem feito.

A flexibilização é contemplada, mas numa velocidade menor. O entendimento é que falta estrutura para quatro opções de aprofundamento, como quer a direita.

Também defende que começar com duas opções de aprofundamento significa um ensino de melhor qualidade. A velocidade menor ainda permitiria preparar a estrutura das escolas.

A atuação da esquerda atende a três interesses, de acordo com políticos de direita ouvidos pelo UOL. Dois setores da esquerda querem 13 disciplinas tradicionais na grade curricular. A parte corporativista da reivindicação partiria de professores universitários.

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Já os departamentos de educação das faculdades querem manter a prerrogativa de preparar os professores que vão atuar no ensino médio. Desta maneira, ditariam o conteúdo e os valores transmitidos em sala de aula.

Professores e profissionais da área de humanas, como história, filosofia, sociologia, são considerados "agentes ideológicos". Eles pregam a continuação destas disciplinas na grade curricular para "defender uma narrativa", alega a direita.

Direita alega que sindicatos atuam para manter sua relevância política na reforma do ensino médio
Direita alega que sindicatos atuam para manter sua relevância política na reforma do ensino médio Imagem: Henrique Barreto/Futura Press/Estadão Conteúdo

Para a direita, o projeto do ministério é um guarda-chuva dos interesses da esquerda. Isso incluiria até sacrificar o ensino técnico.

O MEC propôs 2.400 horas de aulas de matérias tradicionais —o total do ensino médio é de 3.000 horas, distribuídas nas 1ª, 2ª e 3ª séries. Para a direita, isso foi pressão desses dois setores pelas 13 disciplinas.

Além disso, haveria interesse dos sindicatos de professores para continuar elegendo os diretores de escola. Na chefia, eles atuariam para aumentar o financiamento das entidades sindicais e pressionar a participar de atos da esquerda.

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A manutenção do poder sindical também estaria por trás da resistência em contratar pessoas com notório saber —como um engenheiro ensinar matemática, por exemplo, já que isso permitiria substituir professores alinhados à esquerda por profissionais com outros valores e filiados a outros sindicatos.

Os interesses por trás da proposta da direita

A direita tem dois conceitos em sua proposta de reforma do ensino médio. Ambos estão alinhados a uma visão mais liberal do mundo.

O primeiro é oferecer uma educação voltada a preparar bons profissionais. Seus integrantes alegam que o ensino técnico forma mão de obra capaz de evitar subempregos.

O outro princípio seria a possibilidade de flexibilização das aulas. A direita entende que o aluno tem melhor aproveitamento se estudar disciplinas com que tem mais afinidade.

Para a esquerda, a direita tem mais interesses econômicos do que políticos na reforma do ensino médio. Por isso o modelo proposto levará ao repasse de dinheiro do MEC para a iniciativa privada. Existem três caminhos para forçar isso a acontecer:

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Priorizar o ensino técnico. Carente de laboratórios e de professores de disciplinas técnicas, os governos se veriam obrigados a contratar grupos empresariais.

Abrir brecha para universidades particulares receberem recursos. Professores precisarão ser treinados porque a proposta da direita permite que alunos aprofundem os estudos em disciplinas que têm mais afinidade. A alta demanda obrigaria a contratar faculdades privadas.

Impulsionar a venda de equipamentos de ensino a distância. Como pequenas cidades não possuem faculdades, a alternativa viável seria treinar os professores por EAD.

Esquerda afirma que projeto de ensino médio da direita pretende impulsionar venda de equipamentos de EAD
Esquerda afirma que projeto de ensino médio da direita pretende impulsionar venda de equipamentos de EAD Imagem: Pollyana Ventura/Getty Images

Com cursos a distância, estados e prefeituras precisariam comprar equipamentos. Seria mais uma forma de o dinheiro público ir parar nas mãos de empresas.

A esquerda ainda critica a uberização dos professores. Contratar profissionais com notório saber limitaria o envolvimento sindical e ignoraria direitos trabalhistas, um dos pilares da esquerda.

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Outra consequência seria estrangular financeiramente os institutos técnicos, que passariam a competir por fatias do orçamento com grupos privados contratados para fazer o ensino técnico. Historicamente, instituições de educação federais têm militância na esquerda.

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