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As vantagens de cada idade para aprender um novo idioma

Algumas pesquisas mostraram que jovens adultos têm certas vantagens sobre crianças quando se trata do aprendizado de línguas - Getty Images
Algumas pesquisas mostraram que jovens adultos têm certas vantagens sobre crianças quando se trata do aprendizado de línguas Imagem: Getty Images

Sophie Hardach

BBC Future

15/12/2018 19h27

É mais uma manhã de outono movimentada na Spanish Nursery, uma creche bilíngue no norte de Londres. Pais ajudam os filhos a descer da bicicleta, professores cumprimentam as crianças com um abraço e um entusiasmado Buenos dias! No parquinho, uma garotinha pede para fazer uma coleta (maria-chiquinha, em espanhol), brinca com uma bola e grita: Catch! (pega, em inglês).

"Nessa idade, as crianças não aprendem um idioma - elas o adquirem", diz Carmen Rampersad, diretora da escola. A declaração parece resumir a invejável naturalidade dos pequenos poliglotas ao seu redor.

Para muitas crianças, o espanhol é o terceiro ou quarto idioma. Entre suas línguas maternas, estão o croata, hebraico, coreano e holandês.

Ao comparar a desenvoltura deles com a dificuldade de um adulto em cursos de idiomas, seria simples concluir que o melhor é começar a aprender uma nova língua na infância.

Mas a ciência oferece uma visão muito mais complexa de como nossa relação com os idiomas evolui ao longo da vida - e pode encorajar quem começa a estudar mais tarde.

De um modo geral, cada fase da vida nos oferece diferentes vantagens no aprendizado de línguas. Os bebês têm um ouvido melhor para sons diferentes; as crianças conseguem assimilar sotaques nativos com uma velocidade surpreendente. Já os adultos têm uma capacidade de atenção maior e habilidades cruciais, como o grau de instrução, que permitem expandir continuamente o vocabulário.

Uma série de fatores além da idade - como circunstâncias sociais, métodos de ensino e mesmo sentimentos - podem afetar o número de idiomas que falamos e com que desenvoltura.

"Nem tudo vai ladeira abaixo com a idade", diz Antonella Sorace, professora de linguística do desenvolvimento e diretora do Centro de Assuntos Bilíngues da Universidade de Edimburgo, na Escócia.

É o caso do chamado "aprendizado explícito": processo de estudo que se dá em uma sala de aula com um professor explicando as regras do idioma.

"As crianças pequenas são muito ruins no aprendizado explícito porque não têm controle cognitivo, capacidade de atenção e memória", diz Sorace.

Um estudo realizado em Israel descobriu, por exemplo, que os adultos eram melhores em compreender uma regra de linguagem artificial e aplicá-la a novas palavras.

Os cientistas compararam três grupos distintos: crianças de 8 anos, de 12 anos e adultos jovens. Os adultos apresentaram uma pontuação mais alta do que os mais novos, enquanto os de 12 anos também se saíram melhor do que os de 8 anos.

O resultado da pesquisa coincide com o de um estudo de longo prazo realizado com quase 2.000 estudantes bilíngues catalães-espanhóis de inglês: os que começaram mais tarde aprenderam a nova língua mais rápido do que aqueles que iniciaram mais jovens.

Em Israel, os pesquisadores sugeriram que os participantes mais velhos podem ter se beneficiado de habilidades que chegam com a maturidade, como estratégias mais avançadas de solução de problemas e maior experiência linguística.

Em outras palavras, os alunos mais velhos tendem a saber muito sobre si mesmos e sobre o mundo ao seu redor e podem usar esse conhecimento para processar novas informações.

As crianças mais novas se destacam, no entanto, em aprender implicitamente: ouvir nativos falando e imitá-los. Mas esse tipo de aprendizado requer muito convívio com nativos.

Em 2016, o Centro de Assuntos Bilíngues da Universidade de Edimburgo preparou um relatório interno sobre cursos de mandarim nas escolas primárias para o governo escocês. E descobriu que uma hora por semana de aula não fazia uma diferença significativa para crianças de cinco anos. Mas apenas meia hora com a presença de um professor nativo as ajudava a compreender elementos do mandarim que são mais difíceis para os adultos, como os tons.

Fácil assimilação

Todos nós nascemos com um dom natural para línguas. Quando bebês, conseguimos ouvir todos os 600 sons de consoantes e 200 de vogais que compõem as línguas do mundo. No primeiro ano de vida, nossos cérebros começam a se especializar, sintonizando os sons que ouvimos com mais frequência.

Os bebês já balbuciam em sua língua materna. Até mesmo os recém-nascidos choram com um sotaque, imitando o que ouviam enquanto estavam dentro do útero.

Essa especialização também significa eliminar as habilidades de que não precisamos. Os bebês japoneses podem distinguir facilmente entre os sons de "l" e "r". Já os adultos japoneses costumam ter dificuldade.

Não há dúvida, diz Sorace, da Universidade de Edimburgo, de que os primeiros anos são cruciais para incorporar nosso próprio idioma. Estudos com crianças abandonadas ou isoladas mostraram que, se não aprendemos a linguagem humana desde cedo, não conseguimos compensar isso facilmente mais tarde.

Eis que surge a surpresa: esse corte não é o mesmo para o aprendizado de línguas estrangeiras.

"O importante é entender que a idade varia em compasso com muitos outros fatores", diz Danijela Trenkic, psicóloga da Universidade de York, na Inglaterra.

Aprendizado no estrangeiro

A vida das crianças é completamente diferente da dos adultos. Então, quando comparamos suas habilidades linguísticas, "não estamos comparando realidades equivalentes", acrescenta Trenkic.

Ela dá o exemplo de uma família que se muda para outro país. Normalmente, as crianças aprendem a língua muito mais rápido do que os pais. Mas isso pode ser porque elas ouvem o idioma constantemente na escola, enquanto os pais podem estar trabalhando por conta própria.

As crianças também podem sentir um senso maior de urgência, já que dominar a língua é crucial para sua sobrevivência social: fazer amigos, ser aceito, se enturmar. Os pais, por outro lado, são mais propensos a socializar com pessoas que os entendem, como colegas imigrantes.

"Criar o vínculo emocional é o que faz você se aperfeiçoar no aprendizado de idiomas, na minha opinião", diz Trenkic, da Universidade de York.

Os adultos também podem criar esse laço afetivo, e não apenas por meio de relações amorosas ou de amizade com um nativo. Um estudo de 2013 realizado com adultos britânicos matriculados em um curso de italiano para iniciantes descobriu que aqueles que tiveram dificuldade com o idioma foram ajudados pelo relacionamento com outros alunos e o professor.

"Se você encontrar pessoas que pensam como você, é mais provável que você leve adiante o aprendizado do idioma e persevere", explica Trenkic. "Esse é o segredo. Você precisa passar anos aprendendo. Então a menos que haja uma motivação social para isso, é realmente difícil prosseguir."

No início deste ano, uma pesquisa do Instituto de Tecnologia de Massachusetts (MIT, na sigla em inglês) com 670 mil pessoas mostrou que, para obter um conhecimento nativo da gramática inglesa, é melhor começar por volta de dez anos. Após essa idade, a capacidade diminuiria.

Mas o estudo feito por meio de questionário online também revelou que podemos aprimorar os idiomas, incluindo o nosso próprio, ao longo do tempo.

Nós, por exemplo, só dominamos completamente a gramática da nossa própria língua por volta dos 30 anos. E um estudo online, realizado anteriormente, mostra que até mesmo os nativos aprendem quase uma palavra nova por dia em seu próprio idioma até os 50 anos.

Trenkic destaca que o estudo do MIT analisou algo extremamente específico - a capacidade de passar por um nativo em termos de precisão gramatical. Para o estudante de idiomas em geral, isso pode não ser tão relevante.

"As pessoas às vezes me perguntam qual é a maior vantagem das línguas estrangeiras. Vou ganhar mais dinheiro? Vou ser mais inteligente? Vou ficar mais saudável? Mas, na verdade, a maior vantagem de aprender idiomas estrangeiros é poder se comunicar com mais gente", diz ela.

Trenkic, por exemplo, é da Sérvia. E só se tornou fluente em inglês por volta dos 20 anos, após se mudar para o Reino Unido. Ela diz que ainda comete erros gramaticais, especialmente quando está cansada ou estressada.

"Ainda assim, apesar de tudo - e isso é crucial - posso fazer coisas incríveis em inglês. Posso apreciar grandes obras literárias e escrever textos relevantes e coerentes com qualidade para publicação", escreveu ela em um e-mail.

De fato, o questionário do MIT classificou o inglês dela como nativo.

Na creche espanhola de Londres, em que os professores cantamCumpleanos feliz (feliz aniversário, em espanhol) e há um exemplar de O Grúfalo em hebraico na estante, a própria diretora aprendeu o idioma local mais tarde.

Carmen Rampersad cresceu na Romênia e só dominou o inglês ao se mudar para o exterior, por volta dos 20 anos. Seus filhos aprenderam espanhol na creche.

Mas talvez o mais aventureiro em termos linguisticos seja o marido dela. Nativo de Trinidad e Tobago, que fala inglês, ele aprendeu romeno com a família dela, que mora perto da fronteira com a Moldávia.

"O romeno dele é excelente", diz ela. "Ele fala com um sotaque da Moldávia. É hilário."

Errata: este conteúdo foi atualizado
Diferentemente do que informou a primeira versão desta matéria, o idioma oficial de Trinidad e Tobago é o inglês. A informação foi corrigida.