Relato de um inscrito no Enem: Estranhei as perguntas não serem divididas por matéria
Quando me formei no colegial (ainda tinha esse nome), nos idos de 1996, o Enem (Exame Nacional do Ensino Médio) não existia– viria a ser criado somente dois anos depois.
Acompanhei boa parte da evolução do exame, inclusive a mudança do seu modelo em 2009, nos mais de cinco anos em que cobri educação como repórter. E cansei de ir até a porta das escolas nos dias de prova ouvir candidatos sobre as suas expectativas, medos e impressões sobre as questões.
Foi, então, num misto de nostalgia do colégio com curiosidade de jornalista que fiz, pela primeira vez, a prova do Enem. Veio um sabor doce na boca ao entrar na escola com a leveza da desobrigação de ir bem --fiz o exame para fins de reportagem--, mas me solidarizei com as dezenas de vestibulandos que vi aflitos dando uma última lida no resumo de algum cursinho.
O rigor na identificação dos candidatos e no acesso às salas de prova continuava o mesmo de quando prestei vestibular, com a diferença de que, naquela época, o uso de celular durante o exame não era uma preocupação simplesmente porque os aparelhos eram uma verdadeira raridade e luxo só de alguns.
Fiquei feliz que a primeira prova, no sábado, era a de ciências humanas. Foi bom para me dar confiança e uma certa ilusão de que, talvez, quem sabe, eu teria alguma chance de ir bem no Enem.
Estranhei o fato de as perguntas não serem mais divididas em matérias. Conheço bem a proposta interdisciplinar da prova, mas confesso que, tendo estudado em um tempo em que havia essa separação do conteúdo, tentei no início encaixar a pergunta em uma disciplina para buscar as respostas na respectiva gaveta do meu cérebro. Funcionou para algumas, mas logo vi que estava com a estratégia errada. As respostas, na verdade, não encontraria apenas nos livros. Precisava me valer da minha vivência de mundo e de leituras que fiz fora dos muros da escola.
Minha alegria, porém, durou pouco. Foi só chegar na parte de química, física e biologia (hoje chamada de ciências da natureza) para vir o baque. Algumas até consegui responder, mas apliquei lindamente a tão conhecida técnica do chute.
Embora não lembrasse mais do conteúdo, fiquei contente em ver questões relacionadas a problemas do cotidiano. Ok, continuo sem saber como se faz para adaptar um chuveiro 110V para funcionar em 220V, mas valeu a experiência.
No segundo dia, com a prova de português (linguagens e códigos) e a redação, senti minha esperança renovada. Mas, aí, veio matemática. E, de novo, apelei para o chute, achando que seria a minha salvação. Em vão.
Lembrei do modelo de correção adotado no Enem, o TRI (Teoria de Resposta ao Item), em que as questões são pré-testadas e classificadas de acordo com o seu grau de dificuldade. Basicamente, é um sistema antichute: pela lógica, o candidato não tem como acertar questões difíceis tendo errado as mais fáceis. E isso é levado em conta na nota final.
Tudo bem, sei que não teria como, depois de tanto tempo, me lembrar de um conteúdo que nunca mais vi na vida. Mas, mesmo não valendo nada, fica a curiosidade de saber meu desempenho. Agora, é esperar o resultado em janeiro.
*Fernanda Calgaro é jornalista e fez a prova em Brasília a pedido do UOL
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