Trote com ferro de passar em escola de elite abre debate na Suécia
Um violento trote aplicado contra calouros de um prestigiado internato sueco, em que um aluno de 14 anos sofreu queimaduras de segundo grau causadas com um ferro de passar, foi parar na Justiça e iniciou um amplo debate na Suécia contra os rituais de recepção a novos estudantes nas escolas.
A Justiça sueca indiciou nove alunos e um funcionário pelo incidente, que levou ao fechamento temporário da escola e à demissão do reitor e de toda a direção do internato de Lundsberg - um dos mais tradicionais do país.
A nova direção do internato proibiu a prática de trotes na escola, que chegou a ser comparada por alguns especialistas suecos a técnicas de tortura.
O ministro da Educação, Jan Björklund, disse em entrevista à TV pública sueca SVT que há uma "ameaça real" de que a escola possa ser obrigada a fechar suas portas.
'Tortura'
Fundado em 1896, Lundsberg é um dos três internatos de elite da Suécia, inspirados no modelo britânico das "boarding schools". Entre os ex-alunos do colégio está o príncipe Carl Philip, filho do rei Carl Gustaf 16 da Suécia. A escola está situada na região de Värmland, a cerca de 400 quilômetros da capital sueca, e tem aproximadamente 200 alunos e alunas com idades entre 13 e 18 anos. As mensalidades são parcialmente subsidiadas pelo governo.
O trote que incendiou o debate sobre os rituais contra calouros na Suécia ocorreu em uma noite de sábado, no dia 24 de agosto passado. Nove estudantes veteranos, atualmente com 18 anos de idade, entraram subitamente no dormitório onde viviam quatro alunos recém-chegados à escola. Segundo relatos publicados na imprensa sueca, os estudantes apagaram as luzes, mandaram os calouros deitar no chão e vendaram seus olhos, após mostrarem a eles um ferro de passar roupa sendo ligado na tomada e ameaçar queimá-los.
"Vocês estão surdos? Deitem no chão", teriam dito os estudantes aos calouros. Momentos depois, segundo o calouro ferido, os estudantes jogaram água nele e em seguida colocaram o ferro em suas costas.
"Eu gritei, porque doeu. Senti bastante medo", disse o aluno no tribunal, segundo a SVT.
Os estudantes responsáveis pelo trote afirmam que não tiveram a intenção de ferir os calouros. Eles alegam ter esquecido de verificar se o ferro ainda estava quente, após ter retirado a tomada do aparelho do interruptor. Os alunos também teriam pedido desculpas ao calouro ferido, que foi levado ao hospital com queimaduras graves.
Poucos dias após a denúncia do trote, a agência sueca de Supervisão Escolar determinou o fechamento imediato do internato. Mas a escola conseguiu reabrir as portas em setembro após uma limiar obtida na Justiça, sob o argumento de que o trote foi praticado em um dos dormitórios e fora do horário escolar. O caso será agora decidido por um tribunal superior.
"É razoável supor que o colégio deve ter responsabilidade sobre o que ocorre com os alunos também nas dependências dos dormitórios", disse o ministro da Educação sueco em declarações à agência de notícias sueca TT.
Os nove estudantes foram formalmente acusados pela prática de ameaças ilegais. Dois deles foram também acusados por crime de lesão corporal. O supervisor do dormitório escolar, de 47 anos de idade, foi acusado de cumplicidade no caso, uma vez que tinha conhecimento do plano dos estudantes e teria supostamente permitido o trote.
Não foi a primeira vez que os rituais estudantis de Lundsberg alcançaram as manchetes dos jornais. Em maio de 2012, alunos da escola denunciaram terem sido forçados à prática de sexo oral. Em outro tipo de trote, chamado de "submarino", os calouros eram obrigados a deitar de costas com um tubo na boca, através do qual os estudantes veteranos bombeavam água.
Na imprensa sueca, especialistas chegam a alertar que a prática de trotes em Lundsberg pode ser considerada uma violação das leis internacionais contra tortura. Em artigo reproduzido pelo site da TV STV, o ex-aluno de um outro internato sueco destaca que os trotes estudantis representam um crime contra a Convenção da ONU sobre os Direitos das Crianças.
"Jogavam água e neve na minha cama, já fui amarrado e chutado", contou em seu blog o escritor Jakob Lindén, ex-aluno do internato sueco de Grennaskolans.
"Se a escola não é capaz de garantir a segurança dos alunos, é hora de o governo fechar as portas de Lundsberg. A sociedade não pode permitir o sadismo nas escolas", destacou o ex-aluno.
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