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Parceria entre escola, família e sociedade desafia, mas é a chave para o desenvolvimento

Anna Helena Altenfelder

26/12/2017 04h00

“A educação, direito de todos e dever do Estado e da família, será promovida e incentivada com a colaboração da sociedade”. É o que o diz o artigo 205 da Constituição Federal, na abertura do belíssimo capítulo que trata da educação em nosso país. Além de nos lembrar que a educação é um direito social de todos os brasileiros, o texto afirma que ela deve ser promovida em parceria entre o Estado – materializado, entre outras, na instituição escolar – a família e a sociedade, com o objetivo de promover o “pleno desenvolvimento da pessoa, seu preparo para o exercício da cidadania e sua qualificação para o trabalho”, ainda conforme o texto de nossa lei maior.

Trata-se de uma concepção de educação que abarca, mas vai muito além da instrução ou do domínio de conhecimentos científicos e técnicas em áreas específicas do conhecimento. Ela indica também a importância de se trabalhar habilidades e competências para o desenvolvimento integral. Ou seja, não basta ao estudante aprender português, matemática e ciências, é preciso conhecer a história e constituição social do país, sua diversidade regional, étnica e religiosa, entender sua organização política, seus direitos e deveres. Enfim, tudo o que é necessário para sua atuação na esfera pública como cidadão pleno, capaz de reconhecer e manejar saberes, práticas sociais e culturais de seu país.

Diante desses objetivos da educação, fica a pergunta: o que caberia à escola, à família e à sociedade na garantia desse direito? De que forma essas instituições devem se complementar? As parcerias premiadas recentemente na 12ª edição do Prêmio Itaú-Unicef – iniciativa da Fundação Itaú Social e do UNICEF com coordenação técnica do CENPEC – Centro de Estudos e Pesquisas em Educação, Cultura e Ação Comunitária – trazem alguns exemplos de como a sociedade pode colaborar com uma educação pública de qualidade.

Em Major Sales (RN), o projeto “Circulando a Cultura na Escola”, parceria entre a Associação Comunitária Sociocultural de Major Sales e a Escola Municipal Antônio José da Rocha, aposta na cultura popular como estratégia educativa. As diversas atividades desenvolvidas têm o intuito de promover e difundir as manifestações culturais tradicionais da comunidade.

Já em Bragança (PA), 150 adolescentes são beneficiados pela parceria entre a Fundação Nossa Senhora do Rosário e a Escola Estadual de Ensino Fundamental do Rocha no projeto “Aluno Repórter – A Imprensa na Escola”. Entre as ações desenvolvidas, profissionais de rádio e televisão ministram palestras e oficinas audiovisuais para todos os alunos participantes.

Outra das parcerias premiadas, o “Projeto Olho Vivo”, é fruto de parceria entre a Associação Experimental de Mídia Comunitária – Bem TV e a Escola Estadual Guilherme Briggs. Ela ajudou a formar crianças e adolescentes de Niterói (RJ) em comunicação e, assim, ampliar suas perspectivas para o futuro. A quarta iniciativa premiada, o projeto “Cultura, Esporte e Cidadania”, de Criciúma (SC), realiza atividades que visam promover o exercício do protagonismo, da liberdade e da democracia com os alunos da Escola Estadual Padre Paulo Petruzzellis.

Além dos exemplos citados, as mais de 1.650 iniciativas participantes desta edição do prêmio mostram como as organizações da sociedade civil podem atuar sem substituir o papel do Estado, mas numa perspectiva complementar à da escola.

Família e escola

A parceria entre família e escola, por sua vez, parece ser um debate ainda mais importante de se retomar diante de algumas iniciativas a que assistimos neste ano. A quem caberia, por exemplo, a discussão sobre temas como sexualidade, religião e política: à família ou a escola?

Ainda que pareça fazer sentido que a chamada “educação moral” se dê no âmbito familiar, do ponto de vista pedagógico, é preciso lembrar que a diversidade de formas de vivenciar questões comportamentais constitutiva de nossa sociedade está presente no cotidiano de todos e também nas escolas. Ela se faz ainda mais presente nas escolas públicas, em que convivem filhos de pais com uma infinidade de arranjos familiares e, portanto, com vivências e formações diversas.

Ao contrário do que apregoam os defensores do movimento Escola Sem Partido, com base no medo e na desinformação, a escola não pretende substituir o papel da família e nem ditar qual o padrão comportamental de seus alunos. Mas é também seu papel constitucional abordar essa realidade social e estimular o respeito e a tolerância para formar um cidadão ético. É disso que se trata, por exemplo, quando se pretende que a escola aborde questões de gênero e sexualidade: apresentar a diversidade e promover o respeito às diferenças como valores humanos. 

É claro que a família pode e deve participar dessa discussão e existem mecanismo legais para isso: os conselhos municipais e estaduais de educação, da merenda e do Fundeb; os conselhos de escola; as associações de pais e mestres; os projetos políticos-pedagógicos participativos, entre outros. Todos ganham quando família e escola conseguem estabelecer um diálogo efetivo, quando os pais conhecem os currículos, quando professores e responsáveis atuam juntos para acompanhar e apoiar o desenvolvimento de todos os estudantes em suas dimensões cognitivas, físicas, afetivas, intelectuais, éticas e sociais.

Não faltam exemplos de como o diálogo tende a ser mais efetivo do que a desconfiança ou a tentativa de judicialização. São justamente as escolas que se abriram à participação dos pais e da comunidade as que mais têm se destacado como exemplo de qualidade nas redes públicas de ensino do país. Sei que a construção de parcerias entre escolas, famílias e sociedade desafia, mas é também a chave para o desenvolvimento integral de crianças, adolescentes e jovens. Por isso, gostaria de deixar aqui o meu apelo para que, em 2018, o diálogo possa a ser a tônica da relação entre diretores, professores, alunos, pais e a sociedade como um todo.