Regime militar - A imprensa alternativa e a liberdade de expressão
A imprensa alternativa e a liberdade de expressão
Nos anos 1970 mais que se ler o Pasquim, na verdade, esperava-se por ele, em suas edições semanais. Eram os anos de chumbo da ditadura e nem tudo podia ser dito claramente. Era a época em que se lia pelas entrelinhas. Um jornal publicava receitas culinárias em seus editoriais, para avisar que estava sendo censurado, enquanto outros veículos buscavam formas diferentes para fugir da repressão. E isso não acontecia somente com a imprensa. O teatro, o cinema, a literatura também penavam para exprimir suas ideias.
Foi nesse clima que nasceu o Pasquim e outras publicações da chamada imprensa alternativa, ou os “nanicos” como também eram conhecidos. Criados para combater os desmandos da ditadura instaurada no Brasil, essas publicações primavam pela crítica ao poder estabelecido e acabaram por fazer história.
Dentre inúmeros periódicos dessa época, o jornal Movimento foi uma das publicações que mais se destacaram no combate à ditadura. Idealizado por um grupo de profissionais da imprensa e intelectuais, do qual fazia parte o jornalista Raimundo Rodrigues Pereira, o Movimento era financiado pela venda de cotas a vários apoiadores e contou com a colaboração de nomes como Fernando Henrique Cardoso, Ricardo Kotscho, Nelson Werneck Sodré, Dirceu Brizola, Elifas Andreato e Aguinaldo Silva.
Movimento e Opinião
Com alcance nacional, chegou a ter sucursais em vários estados brasileiros e grande número de assinaturas, que eram angariadas junto a simpatizantes do jornal por um grupo de entusiasmados colaboradores.
Antes mesmo da criação do Movimento, outro órgão da imprensa independente que se notabilizou na luta pela democracia foi o jornal Opinião. Fundado em 1972 pelo editor Fernando Gasparian, o semanário procurava nos modelos clássicos do jornalismo a sua forma de expressão. Em sua fase mais combativa teve como editores os jornalistas Raimundo Pereira e Tonico Ferreira.
Concebido como veículo da oposição ao regime militar, o jornal contribuiu para a projeção de nomes como Luiz Carlos Bresser Pereira, Maria da Conceição Tavares e Francisco Weffort entre outros. Fernando Henrique Cardoso foi um desses nomes. Mais conhecido nos meios acadêmicos, é a partir dos artigos assinados para o Opinião que o sociólogo começa a expandir suas ideias para um público mais amplo.
Em seu auge, o jornal Opinião teve muito prestígio e chegou a alcançar tiragens próximas à da revista Veja. Entretanto, vencido pelo desgaste em sua luta contra a censura, deixou de circular em 1977.
Nasce um fenômeno editorial
Em meados de 1969 nasceu o Pasquim, que imediatamente se tornou um fenômeno da imprensa alternativa daquele período. Concebido de início pelos jornalistas Tarso de Castro e Sérgio Cabral e pelo cartunista Jaguar, o jornal logo ficou famoso pela crítica irreverente e bem-humorada.
Contribuíram para esse sucesso muita gente famosa que aderiu ao projeto. Millôr Fernandes, Henfil, Paulo Francis, Ruy Castro, Ziraldo foram apenas alguns entre tantos colaboradores que tornaram o semanário uma publicação reverenciada no cenário nacional.
O Pasquim se dedicava ao escracho total. Anárquico, ousado e brilhante, passou a ser um parâmetro para um novo jornalismo e se transformou em símbolo de resistência ao regime militar. Paradoxalmente em seu início não foi um jornal de cunho marcadamente político. Sua crítica era social, de costumes, seu humor satírico era uma gozação permanente com o próprio caráter do brasileiro.
Sobrevivência
Mas incomodava. Pela liberdade com que tratava suas pautas, pela autonomia de suas reportagens, a exemplo da célebre entrevista com a atriz Leila Diniz, responsável por deflagrar a censura prévia nas redações do país. Com o passar do tempo, a repressão aumentou até ao ponto em que a redação inteira do jornal foi presa e precisou ser substituída por outros colaboradores para que o jornal não acabasse.
Entretanto, mesmo sofrendo todo tipo de repressão, enfrentando dificuldades financeiras e inclusive perdendo espaço para novos jornais que surgiam, o Pasquim sobreviveu até o início da década de 1990.
Censura, uma velha conhecida
A supressão da liberdade de imprensa foi um dos mecanismos de controle estabelecidos pela ditadura militar no Brasil, mas não foi prerrogativa desse período. Há notícias que desde a época do império já se tentava controlar a informação, e em alguns momentos da história brasileira a censura foi imposta de modo incisivo.
Um desses momentos se deu com a implantação do Estado Novo, quando Getúlio Vargas assumiu o poder e inaugurou uma das fases mais autoritárias de nossa história. Foi nessa época, por exemplo, que o jornal O Estado de São Paulo sofreu intervenção e passou a ser administrado pelo DIP (Departamento de Imprensa e Propaganda), órgão criado por Vargas como instrumento de censura e propaganda.
Seja pela censura explícita, seja por pressões econômicas exercidas pelos governos, inclusive sobre eventuais anunciantes, a verdade é que não é de hoje que a liberdade de imprensa é questionada pelos poderosos de plantão. Sempre foi assim e continua sendo. Mesmo que de modo velado, escondido pelas espertezas políticas daqueles que procuram manter o poder a qualquer custo.
Controle social da mídia
Exemplos, inclusive da história recente, não faltam. Vide as tentativas de controle da mídia que são assunto recorrente ora dentro do próprio Congresso Nacional, ora nas declarações de facções políticas que veem na liberdade de expressão um perigo iminente. Uma tentativa de controle que respinga até mesmo nas chamadas mídias sociais, tão festejadas ultimamente como um dos meios mais democráticos de informação.
Em resumo, liberdade de imprensa sempre significou, em última instância, a liberdade da escolha e da divulgação das informações que possam nos situar no mundo. Longe de ser uma conquista das democracias e pseudodemocracias vigentes, sua manutenção deve ser incondicionalmente a primeira pauta e o norte para o bom jornalismo.
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