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Escola no Rio diz que mãe deve pagar monitor para aluno com deficiência

Sheila e o filho Pedro, que tem 8 anos e um síndrome rara - Arquivo Pessoal
Sheila e o filho Pedro, que tem 8 anos e um síndrome rara Imagem: Arquivo Pessoal

Akemi Nitahara

Da Agência Brasil, no Rio de Janeiro

28/05/2015 09h15

Mães de crianças com deficiência são obrigadas a pagar um "facilitador" para que seus filhos possam acompanhar as aulas em escolas da rede pública municipal do Rio de Janeiro. A denúncia foi feita por Sheila Velloso, que tenta, desde o começo do ano, matricular o filho Pedro, de 8 anos. Ela explica que o filho tem síndrome de Cornélia de Lange, uma doença neurológica rara, e precisa de acompanhamento constante, mas a escola pública em que ele foi matriculado, a Pedro Ernesto, na Lagoa, não oferece o serviço.

“Fiz a matrícula dele e me falaram que no momento não tinha ninguém para acompanhar o meu filho. Concordei que ele não podia ficar sem ninguém. A diretora me apresentou uma menina que estava chegando e era facilitadora de outra criança. Ela disse que ia todo dia com a criança, e que a mãe paga R$ 1.000 para ficar com ele, orientando. Voltei na regional e me falaram 'no momento não temos ninguém, se você conseguir alguém, ótimo, você traz aqui e a gente faz a fichinha'”.

Sheila conta que procurou a rede municipal depois de ter a matrícula negada em cinco escolas particulares e uma amiga elogiar o trabalho oferecido pelo município. Há cerca de um mês, ela resolveu dar visibilidade ao caso por meio de um abaixo-assinado virtual que já conta mais de 10 mil apoiadores.

“O que eu sei é que toda criança tem direito à escola, seja ela deficiente ou não. É o caso do meu filho. Ele é especial, ele precisa de uma orientadora ou facilitadora, e eu fiquei sabendo que na rede municipal tem isso; outras mães têm isso; então eu fui buscar, eu queria isso para o meu filho também. Se tem direito, vamos lá, tem que ter direito, então. O objetivo é conseguir a escola, não quero mais nada”, enfatizou ela.

Sheila explica que não existe associação no Brasil que reúna parentes de pessoas com síndrome de Cornélia de Lange, apenas grupos de apoio em redes sociais. A doença afeta o desenvolvimento físico e intelectual da criança. “Agora ele fica a semana toda dentro de casa, só faz terapia ocupacional e fono[audiologia], atividades paralelas, mas escola mesmo ele não está frequentando”, acrescentou.

Fundadora da organização não governamental Escola de Gente, que trabalha com inclusão, a jornalista e escritora Cláudia Werneck ressalta que é obrigação do município garantir acesso à escola para qualquer criança, já que o direito à educação é tão indisponível quanto o direito à vida.

“Toda criança tem direito à escola, e isso independe de como essas crianças são, se enxergam, se têm uma síndrome genética ou não. Não existe não aceitar uma criança. Nesse caso, a escola condicionou a aceitação da criança à mãe fazer desembolsos particulares de um facilitador, isso também é inconstitucional, a escola pública não pode cobrar nada da família dos estudantes”, ressaltou Cláudia.

A procuradora Regional da República Eugênia Gonzaga, do Ministério Público Federal em São Paulo, especialista em direitos de pessoa com deficiência, explica que os apoios necessários à inclusão de criança com deficiência fazem parte da obrigação do Estado com a educação.

Segundo ela, “é ilegal. Não tem previsão em lei isso, e já tem até uma nota técnica do Ministério da Educação falando que isso é irregular. A gente ouve falar isso há anos no Rio de Janeiro, e agora é que os pais começaram a denunciar. Fere o código do consumidor, fere o direito da criança, é uma discriminação indevida da criança com deficiência”.

De acordo com Eugênia, os pais devem documentar a exigência feita, para comprovar a irregularidade no Ministério Público. “Elas [mães] poderiam comprovar de alguma forma essa exigência da escola, porque às vezes a escola fala isso de boca, mas na hora de colocar no papel não [confirma]. Então, talvez provocar uma resposta por escrito da escola, para que conste essa prova de que a escola está fazendo exigência, e levar isso para o Ministério Público Estadual”, sugere.

A secretária Municipal de Educação, Helena Bomeny, garante que essa não é a prática da rede. “Eu não sei como chegou essa informação à mãe, porque isso não procede. Nós oferecemos um estagiário, voluntário, para ficar como mediador na sala de aula junto com o professor. Então, eu acho que é um grande mal entendido, porque não se pode cobrar nada”, destaca.

De acordo com ela, o caso de Pedro Velloso foi o primeiro que ela soube, e a rede tem mais de 1.500 estagiários e voluntários que fazem a mediação de crianças com deficiência nas escolas. “A gente pode entender que em uma determinada escola, como não havia um aluno incluído, na hora não tem [mediador]. Então, a coordenadoria, junto com o Instituto Helena Antipoff, faz o remanejamento profissional para que a escola passe a ter o mediador. Às vezes demora um dia, dois, três dias, porque a escola não tem e vai passar a ter essa necessidade”, disse ela.

A secretária explica que todas as coordenadorias regionais de Educação têm equipes do instituto, que é uma referência nacional em deficiência e altas habilidades, e que todos os casos de inclusão de criança com deficiência devem ser analisados por especialistas.

“Quando a gente faz a matrícula de qualquer aluno com deficiência é importantíssimo que o instituto esteja presente, porque junto com os pais é que eles vão decidir onde o aluno deve ficar melhor, se numa classe especial, numa sala especial ou se vai ser incluído. A gente advoga sempre tentar incluir o aluno, porque ele evolui muito melhor”, acrescentou.

Sheila Velloso relata que só soube do Instituto Helena Antipoff na última segunda-feira (25), quando ligaram para ela marcando reunião para amanhã (28).