Morador de comunidade no Rio consegue vaga em duas universidades dos EUA
Negro e morador de uma favela na Pavuna, zona norte do Rio de Janeiro, o estudante Lucas Bernardo Furtado, de 19 anos, contou que já foi parado algumas vezes pela polícia, onde mora, sem razão aparente. “Isso é comum, infelizmente – se estou com outras pessoas brancas, o único a ter que abrir a mochila e explicar por que estou ali sou eu. Mas acho que é pelos exemplos a melhor maneira de as formarem um juízo melhor sobre o outro”.
O exemplo que o jovem espera deixar, por si, é o de seguir adiante nos estudos, tentar se superar e contar, como base para isso, com o apoio da família. É essa a receita que ele afirma ter seguido para conquistar vaga de graduação em duas universidades americanas, a pública Colorado State University e a Univesity Of Kentucky.
Furtado acabou de concluir o ensino médio técnico no Instituto Federal do Rio de Janeiro. Dos oito aos 13 anos, teve aulas em um centro social que ministrava conteúdo interdisciplinar como artes e esportes. Depois foi bolsista em colégios particulares, até conseguir a vaga no IFRJ.
Há um ano, o jovem participou de uma semana de workshops promovido por uma fundação com dicas sobre como se candidatar a uma vaga em universidades americanas.
“Entendi o processo, pelo passo a passo, e estudei em cinco meses o que, em geral, se estuda em dois anos”, contou. Indagado se algum conteúdo específico foi exigido, o estudante brasileiro disse que não – fora o inglês. “Cobravam muito inglês e matemática, disciplinas em que eu vou bem. Tratei de melhorar o inglês, e, em outra etapa da seleção, nas quais eu podia selecionar três matérias, escolhi química, física e matemática e tive êxito em algumas delas”, relatou.
Aprovado nas duas universidades, Furtado disse que tende a escolher a do Colorado, mas a partir de agosto do ano que vem. “Pedi um ano para eles porque tenho alguns projetos com jovens na minha cidade e quero tocar isso até lá, ver o que mais aparece nesse período e decidir”, afirmou. A própria escolha pelo curso, disse, é feita depois de dois anos de estudos na instituição. “Quero algo entre engenharia química, nanotecnologia ou engenharia mecânica, mas escolherei isso com o tempo”.
Enquanto não viaja para os EUA, o jovem faz outra viagem internacional, para a Rússia, onde participa, por uma semana, de um curso sobre jovens líderes globais (em inglês, o Preparing Global Leaders Summit). Ele contou que foi selecionado para a bolsa de estudos junto com outros 60 candidatos, em uma seleção para a qual, em média, eram 700 por vaga.
Furtado fez uma vaquinha online para arrecadar dinheiro para as passagens. Ele estipulou a meta de R$ 7 mil, mas, até a tarde desta terça-feira, já havia arrecadado R$ 9,8 mil.
A reportagem quis saber: o que ele teve que outros jovens da comunidade onde ele vive não tiveram? Furtado não hesitou: apoio da família – sobretudo dos pais, ambos, técnicos de enfermagem.
“Meu suporte familiar é muito forte, meus pais estão sempre me acompanhando sobre o que eu aprendo. O que eu vejo, em geral, são outros jovens buscando se adequar à realidade em que vivem, desestimulados e com sonhos perdidos; em casa, sempre otimismo e a vontade de dar a volta por cima, de buscar aquilo que parecias distante, foram um norte”, concluiu. “A trajetória de qualquer um é cheia de altos e baixos; não é por causa dos baixos que a gente precisa desistir”, ensina.
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