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Interventores de Weintraub estão há quase 1 ano sem mandato em escola do RJ

O Cefet-RJ está sob intervenção de Abraham Weintraub desde agosto de 2019 - Reprodução/Twitter
O Cefet-RJ está sob intervenção de Abraham Weintraub desde agosto de 2019 Imagem: Reprodução/Twitter

Caio Blois

Do UOL, no Rio

03/06/2020 04h00

Escola técnica centenária e universidade do Rio, o Cefet-RJ (Centro Federal de Educação Tecnológica Celso Suckow da Fonseca) convive há quase um ano com interventores do MEC (Ministério da Educação), quebrando tradição democrática na instituição acadêmica.

Após chapa derrotada contestar a eleição para a direção do Cefet-RJ, o ministro Abraham Weintraub nomeou em agosto um diretor temporário e abriu uma sindicância. Desde então, a cadeira segue ocupada por indicações do governo, e o vencedor não foi empossado mesmo com o arquivamento do processo administrativo.

Alunos do CEFET-RJ protestaram com faixas e cartazes contra o ministro da educação - Reprodução/Twitter - Reprodução/Twitter
Alunos do CEFET-RJ protestaram com faixas e cartazes contra o ministro da educação
Imagem: Reprodução/Twitter

Em 22 de maio, o Diário Oficial da União afirmou que a sindicância havia sido arquivada. O processo foi mantido em sigilo e até agora nenhuma de suas informações foi tornada pública. Assim, ninguém sabe se supostas irregularidades foram comprovadas tampouco a conclusão dos trâmites. O MPF (Ministério Público Federal) e a Associação de Docentes do Cefet-RJ pediram vista ao processo, mas não foram atendidos.

"Esse tipo de procedimento é sigiloso, mas não na lógica de cercear o acesso à informação. O fundamento do sigilo é preservar o servidor. Não justifica o não-acesso da defesa do interesse público", avaliou Salomão Ximenes, professor de políticas públicas na UFABC (Universidade Federal do ABC).

Antes, no dia 18, o diretor-geral temporário Marcelo Nogueira exonerou Luane Fragoso, diretora do Campus Nova Iguaçu, o maior fora da capital fluminense, por mensagem de WhatsApp. Nogueira publicou nota no site da instituição com o título "está na hora de recuperarmos nossa identidade", em que critica gestões anteriores e ameaça novas exonerações por "insegurança jurídica".

Para funcionários e professores ouvidos pelo UOL, a ideia era exonerar todos os sete diretores de campus --subordinados ao diretor-geral, que funciona como um reitor--, mas só em Nova Iguaçu houve interessados em um dos cargos, oferecidos a aliados políticos de Nogueira, como Francisco Eduardo Cirto, escolhido para substituir Luane.

A medida administrativa pode ser anulada após a posse do novo diretor-geral, o que já deveria ter acontecido, uma vez que, encerrada a sindicância, não há mais necessidade de um pro tempore. O processo administrativo aberto no MEC tem duração máxima de 180 dias, já contados possíveis aumentos de prazo a partir de mecanismos jurídicos.

"Tudo isso pode ser anulado. Esta demora em empossar o vencedor da eleição mostra, primeiro, a omissão do governo [Jair] Bolsonaro. Está claro que, após verificação da apuração da sindicância, o candidato vencedor deveria ser nomeado imediatamente depois. Bolsonaro e Weintraub utilizam mais uma vez a tática do lawfare, ou seja, usam a lei como arma para não decidir e, enquanto isso, intervir politicamente", afirma Ximenes.

O ato gerou protestos nas redes sociais. No dia 25, a hashtag #TiraAMaoDoMeuCEFET esteve entre as mais comentadas do Twitter no Brasil. Três dias depois, em reunião de colegiado, Nogueira informou que estava deixando o cargo, sem dar prazos para a saída nem explicações.

Alunos têm feito protestos constantes no CEFET-RJ - Reprodução/Twitter - Reprodução/Twitter
Alunos têm feito protestos constantes no CEFET-RJ
Imagem: Reprodução/Twitter

O que diz o MEC

Questionado pela reportagem na sexta (28), o MEC respondeu com uma nota com erros de informação.

"O Ministério da Educação informa que o campus de Niterói [sic] do Centro Federal de Educação Tecnológica Celso Suckow da Fonseca (CEFET-RJ) está sendo comandando [sic] por um diretor-geral pro tempore até que o processo administrativo instaurado para apurar a eleição do cargo de diretor-geral seja concluído. Com isso, o atual gestor da unidade tem a prerrogativa legal para designar diretores de campus, em caráter pro tempore, ou qualquer outro cargo comissionado, em áreas da instituição", afirmou a assessoria da pasta, por meio de nota.

No entanto, não existe campus do Cefet-RJ em Niterói --as unidades se localizam nos bairros do Maracanã e Maria da Graça, na capital, e nas cidades de Angra dos Reis, Itaguaí, Nova Friburgo, Nova Iguaçu, Petrópolis e Valença. Além disso, o processo administrativo tinha se esgotado seis dias antes.

Em contato com a reportagem após a publicação, o MEC corrigiu o erro da primeira nota:

"O Ministério da Educação (MEC) esclarece que o Centro Federal de Educação Tecnológica Celso Suckow da Fonseca (Cefet-RJ) está localizado em Nova Iguaçu e não em Niterói, como informado anteriormente pela pasta, e pede desculpas ao leitor pelo equívoco."

O Ministério também se posicionou sobre outras questões, explicando a ingerência da direção-geral pro tempore às decisões tomadas neste período.

"Na oportunidade, o MEC reitera que o diretor pro tempore estará à frente da instituição até que seja concluída a análise do processo de escolha do cargo de diretor-geral, a qual estava suspensa em razão da sindicância que encontrava-se em curso. Tal procedimento está dentro do devido processo legal da administração pública. O Ministério reafirma ainda que o atual gestor da unidade tem a prerrogativa legal para designar diretores de cargos, também na condição de pro tempore, em áreas da instituição."

Senador de RR apoia derrotado nas eleições internas

O Cefet-RJ realizou eleições em abril de 2019 para escolher seu novo diretor-geral. A contagem deu a vitória a Maurício Saldanha Motta, por uma pequena diferença de votos. Candidato derrotado, o segundo colocado Sérgio Roberto de Araújo entrou com um recurso no Codir (Conselho Diretor) da instituição, alegando que Carlos Henrique Figueiredo Alves, o Caíque, então diretor, teria utilizado seu cargo para comprar votos.

O Codir não acatou a contestação e informou ao MEC que Maurício Motta era o escolhido da comunidade acadêmica. É obrigatório que o governo acate a nomeação e emposse o vencedor das eleições. Sérgio Araújo mobilizou o Pros (Partido Republicano da Ordem Social), e o senador Telmário Mota (Pros-RR) interveio a seu favor junto a Weintraub e Bolsonaro.

11.mai.2016 - O senador Telmário Mota (PDT-RO) foi o primeiro a declarar voto "não" à admissibilidade do processo de impeachment contra a presidente Dilma Rousseff. Ele falou em "golpe branco" contra Dilma "por não usar armas de fogo, mas a caneta, os conchavos, os oportunismos, as traições" - Eduardo Anizelli/Folhapress - Eduardo Anizelli/Folhapress
Telmário Mota indicou candidato derrotado nas eleições do CEFET-RJ a mando do PROS
Imagem: Eduardo Anizelli/Folhapress

Em reunião com o ministro, Telmário fez lobby por uma sindicância, o que abre possibilidade de indicar um interventor. O senador indicou o candidato derrotado ao cargo, mas Weintraub escolheu o gaúcho Maurício Aires Vieira, seu assessor na pasta, que não tinha nenhuma ligação com o Cefet-RJ e foi recebido sob forte protesto no campus Maracanã, sede oficial da instituição. Vieira depois daria lugar a Marcelo Nogueira, que também é aliado de Sérgio Araújo na política interna.

Procurado pela reportagem, o senador informou que Araújo foi indicado pelo seu partido como "o único apto a assumir o cargo", e que levou o nome a Weintraub mesmo sem conhecê-lo. Telmário Mota perguntou apenas se o candidato era "honesto" e "gente boa".

Abraham Weintraub - Marcelo Camargo/Agência Brasil - Marcelo Camargo/Agência Brasil
Abraham Weintraub indicou diretores temporários no CEFET-RJ
Imagem: Marcelo Camargo/Agência Brasil

O Pros é um dos partidos do centrão que forma a nova base do governo Jair Bolsonaro no Congresso. Três dias após reunião entre Telmário e Weintraub, a sindicância foi instaurada e o primeiro interventor foi nomeado. Na época, o ministro comemorou a intervenção em suas redes sociais.

A exoneração de Luane e a nomeação de Cirto —aliado de Nogueira e Araújo— no campus Nova Iguaçu é um exemplo de quebra da tradição democrática do Cefet-RJ. É praxe que o diretor-geral nomeie um indicado da comunidade acadêmica de cada campus.

Em dezembro, Bolsonaro criou a medida provisória 914/2019 que alterava a forma de escolha de reitores das universidades, institutos técnicos federais, Cefets e do Colégio Pedro 2º, no Rio. O texto gerou polêmica no Congresso e sequer teve a comissão mista formada para analisar seu conteúdo.

Ontem (2), a MP perdeu eficácia ou no popular "caducou". Agora, ela tem um prazo até 16 de agosto para ser analisada, modificada ou até encerrada pelo Senado. Servidores e professores do Cefet-RJ acreditam que isso pode ajudar a acelerar a posse de Maurício Motta na diretoria-geral da instituição.