Topo

Esse conteúdo é antigo

Mercadante: MEC tem que combater todas as formas de preconceito na educação

Do UOL, em São Paulo

13/07/2020 13h19

O ex-ministro da Educação Aloizio Mercadante (PT) criticou hoje no UOL Entrevista a existência da guerra cultural nas universidades brasileiras e a questão de ideologias na educação.

Tem 8.000 jovens e crianças que vão para casa humilhados por sua orientação sexual. Isso não é problema do MEC? O MEC tem que tratar com respeito e acolher todo tipo de cidadão brasileiro, com carinho, e combater todas as formas de preconceito. Isso não é ser de esquerda, isso é ser humanista. São princípios que estão na constituição brasileira e que o MEC tem que adotar.

Na conversa com os colunistas do UOL Leonardo Sakamoto e Carla Araújo, Mercadante criticou também as falas do pastor Milton Ribeiro, escolhido para comandar o MEC (Ministério da Educação), sobre feminicídio e educação de crianças com castigos físicos. "Espero que esse novo ministro não seja aquilo que ele diz ou o que ele disse no passado. Que ele esteja aberto a aprender com a experiência, visitar as escolas públicas, as universidades. Eu gostaria que a educação fosse preservada nessa tragédia. Espero que ele não seja as declarações que eu ouvi, que eu acho que são incompatíveis com uma educação humanista."

Mercante, que durante os governos de Dilma Rousseff (2011-16) atuou como ministro da Ciência e Tecnologia, ministro-chefe da Casa Civil e esteve à frente do MEC por duas vezes, defendeu a autonomia das universidades do Brasil.

"É secular. As primeiras universidades do mundo são de 1500. Nós chegamos muito atrasados, a educação superior brasileira é tardia, chegou nos anos 20, e temos que superar o tempo perdido. Ninguém entra para ser docente em uma universidade federal sem concurso. Às vezes o concurso público não é bom, tanto que o [ex-ministro Abraham] Weintraub entrou. Não tinha título de doutor e não podia ter entrado. Mas é concurso público, transparente, auditável. Os reitores são eleitos pelas suas comunidades", disse.

Governo de terraplanistas

Na conversa com os colunistas do UOL, o ex-ministro citou uma "insatisfação brutal" da população em relação ao governo de Jair Bolsonaro (sem partido). Para ele, o governo tem "visão obscurantista".

Por isso tem um monte de terraplanista nesse governo. A universidade tem que se basear na ciência, na pesquisa. Eles não acreditam em evidência científica. Está aí o caso que fizeram com a covid, a cloroquina. Como um presidente da República faz propaganda de um fármaco que não foi atestado? Isso é mais um sinal.

Marcadante disse, no entanto, que é otimista com o futuro. "Acho que isso vai passar. Essa insatisfação é brutal, as agressões que eles fazem à liberdade de imprensa e aos valores civilizatórios é incompatível com um país do tamanho do Brasil no seculo 21. Temos que lutar, nos organizarmos para interromper o mais cedo possível esse desastre histórico que temos adiante, que é o governo Bolsonaro (...) A gente precisa lutar para não haver mais retrocesso na educação, porque eles foram muito graves nesse período."

Auxílio deve continuar

Mercadante defendeu ainda que o auxílio emergencial de R$ 600 deve continuar enquanto durar a pandemia do novo coronavírus. Ele afirmou que "os R$ 600 têm que ficar enquanto tiver pandemia, porque precisamos de uma lei em defesa da vida. Não há alternativa. E as pessoas que não têm renda não têm como se defender e ficar em isolamento social".

A renda básica é para você evitar a fome e proteger o conjunto da sociedade. Nós já estamos com 70 mil mortos [em decorrência do coronavírus]. Não há nada parecido na história documentada do país. A renda emergencial de R$ 600 é para ficar durante a pandemia. Na saída tem que ser um outro programa.

Para o ex-ministro, o programa Mais Brasil, anunciado pelo governo de Jair Bolsonaro (sem partido), "é um Bolsa Família com a inflação corrigida".

IR progressivo e taxação de fortunas

Mercadante também defendeu uma maior progressividade no Imposto de Renda — ou seja, quanto maior o salário, maior o imposto — e a taxação de grandes fortunas e heranças como formas de reforçar as receitas do país. Segundo ele, essas medidas poderiam ser utilizadas para compensar a perda de arrecadação com a desoneração da folha de pagamentos, proposta pelo economista Bernard Appy.

Nós temos que desonerar a folha. Por quê? Para gerar emprego. Mas você tem que substituir isso por outra forma de receita, porque vamos sair dessa crise com dívida. Quem vai pagar essa conta? Esse é o grande debate. Quem tem que pagar isso são os ricos, é o grande capital financeiro. Nós precisamos falar em progressividade do IR, de taxar grandes fortunas e heranças.

Mercadante criticou a postura de Paulo Guedes durante a crise gerada a partir da pandemia do novo coronavírus, principalmente em relação às pequenas e médias empresas. O ex-ministro afirmou também que os bancos centrais "do mundo inteiro" foram eficientes na crise para recuperar a bolsa, mas não a economia e a atividade produtiva em geral.

"As pequenas e médias empresas estão quebrando, inclusive o Guedes deixou claro naquela reunião [22 de abril, que veio à tona após decisão do Supremo Tribunal Federal] que ele não tem compromisso com essa gente", diz.

Governo sem coordenação

Entre as críticas que fez contra o governo de Jair Bolsonaro, Mercadante citou que não há coordenação do Executivo e não houve preparação para a crise que viria durante a pandemia do novo coronavírus. "Nós temos uma tragédia sanitária muito maior e isso contamina a economia. Muitas das projeções trabalham com uma segunda onda do coronavírus, e nós temos um cenário muito difícil", avaliou o ex-ministro.

"As primeiras medidas que o governo tomou eram de uma brutalidade que revela a incompreensão da crise", argumentou Mercadante. "E o Paulo Guedes falando da agenda [de reformas], como se isso fosse resolver a crise. A crise vai precisar de um plano de reconstrução do país."

Para Mercadante, não há saída da atual situação econômica sem o estado, e o auxílio emergencial de R$ 600, que chegou a esse valor após intervenção do Congresso, é "indispensável para gerar demanda amenizar o impacto".