Sem coordenação nacional, residentes denunciam falta de salário e de EPIs
Residentes de diferentes áreas da saúde estão com salários atrasados há quase dois meses e alguns reclamam que ainda estão sem os EPIs (equipamentos de proteção individual) necessários para trabalhar na linha de frente do combate à covid-19. Os profissionais afirmam ainda que a CNRMS (Comissão Nacional de Residência Multiprofissional em Saúde), responsável por zelar pelas atividades do setor, está sem qualquer atividade desde abril de 2019.
"A gente já recebeu muitos relatos de residentes que não receberam a vacina ou não foram incluídos no quadro de funcionários e por isso ficaram sem os EPIs ou a imunização", contou uma residente que não quer ter o nome revelado ao UOL. Segundo ela, com a falta de uma coordenação nacional, não há um órgão que possa cobrar das instituições onde os residentes atuam.
Os residentes ganham dois tipos de bolsas:
- A bolsa salário, e
- Uma bonificação do programa Brasil Conta Comigo, lançado na pandemia pelo governo federal.
Essa segunda remuneração é oferecida apenas aos profissionais que trabalham na linha de frente da covid-19.
A residente de nutrição Clarice Miranda, que trabalha em uma clínica da família na comunidade do Jacarezinho, no Rio de Janeiro, disse que recebeu apenas a bonificação de R$ 677. "Não posso me dar ao luxo de fazer uma compra no mercado. Não existe previsão nenhuma de quando iremos receber", afirmou.
Outros residentes já disseram que não vão conseguir trabalhar, pois não têm dinheiro para o transporte. Esses profissionais, que englobam todos os residentes da saúde excluindo os médicos, trabalham 60 horas semanais. Cada área é distribuída de uma forma, mas o trabalho é exclusivo, então a única fonte de renda é a bolsa salário.
Levantamento parcial feito pelo Fórum Nacional dos Residentes de Saúde com 700 residentes apontou que pelo menos 150 estão com algum tipo de atraso na remuneração.
Sem coordenação nacional
A ausência de uma coordenação nacional, como a CNRMS, traz "prejuízos" para os profissionais. Um coordenador de residentes em uma cidade paulista, que também pediu anonimato, disse que a falta da comissão inviabiliza uma série de decisões.
"Uma aluna quer pedir o trancamento de matrícula, mas quem faz essa liberação é a comissão e a gente fica em uma situação que não consegue nem dar um retorno", pontuou.
Ele contou que nem informações como número do diploma não são fornecidas. Duas turmas de residentes que ele coordena estão sem seus diplomas. "Nós emitimos um certificado de conclusão, mas eles não têm ainda um diploma registrado no MEC [Ministério da Educação]", disse.
A única justificativa que alguns residentes chegaram a ouvir foi que o governo federal estava enfrentando problemas para cadastrar os profissionais e realizar o pagamento. No entanto, o motivo só serviria para residentes do primeiro ano, que teriam a sua primeira bolsa na primeira semana de abril. Para os residentes veteranos, esse cadastro já foi feito no passado.
Outro prejuízo apontado pela falta de coordenação nacional é relacionado à carga horária dos residentes. Profissionais que ficaram de licença após serem contaminados pelo coronavírus, segundo os residentes, terão de repor esses dias. "Isso significa um dia a mais de trabalho ou até mesmo aumentar nossa residência", disse uma profissional.
Residentes grávidas, por exemplo, têm tentado licença médica, mas sem a presença da comissão a situação é dificultada.
Os profissionais pretendem entrar em greve, caso os problemas não sejam solucionados.
As residências são administradas pelo MEC e o Ministério da Saúde. A reportagem entrou em contato com as duas pastas, mas não teve retorno até o momento da Educação.
Depois da publicação desta reportagem, a pasta da Saúde explicou que identificou inconsistências em 203 cadastros entre os 22.783 residentes financiados pela pasta e isso "ocasionou problemas no processamento do pagamento referente ao último mês de março".
O ministério, chefiado por Marcelo Queiroga, afirmou que comunicou as instituições responsáveis e o pagamento deve ser realizado até o "quinto dia útil do mês subsequente".
Sobre a bonificação do programa Brasil Conta Comigo, a pasta culpou as instituições, já que "envio planilhas fora do prazo ou inconsistências nas informações enviadas à pasta podem afetar os pagamentos dos residentes". Do pagamento de abril, cerca de 3,5 mil dos 52.262 residentes declarados pelas instituições elegíveis, tiveram inconsistências nos dados.
A pasta garantiu ainda que a comissão nacional passa por "processo de reformulação" e que está em discussão com o MEC para retomar as atividades. No entanto, não deu um prazo para isso.
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