Para cientista político, lei de cotas deverá incentivar melhora em todo o ensino público
A lei que reserva metade das vagas em universidades e escolas técnicas federais a estudantes que cursaram todo o ensino médio em colégios públicos, sancionada ontem (29) pela presidente Dilma Rousseff, divide a opinião de especialistas em educação e políticas públicas. Um dos argumentos dos que criticam a lei, é que ela fere a autonomia universitária; já os defensores, acreditam que ela poderá ser um incentivo para a melhora de todo o ensino público brasileiro.
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Para João Feres Júnior, cientista político do IESP/Uerj (Instituto de Estudos Sociais e Políticos da Universidade do Estado do Rio de Janeiro) e coordenador do GEMAA (Grupo de Estudos Multidisciplinares da Ação Afirmativa), a lei representa um “avanço no ensino superior brasileiro” e também terá reflexos positivos na valorização da escola pública, em especial do ensino médio.
“Vai ser um incentivo para melhorar a qualidade do ensino médio e, com isso, esperamos um incentivo para melhorar o ensino fundamental também”, afirmou. Sobre as críticas de que os alunos vão entrar menos preparados na universidade, ele afirma: “Tem que olhar para frente - se o aluno vai entrar com deficiência, faz programa de permanência, dá aulas extras. Isso não é só para cotistas, outros alunos também precisam”, completou.
Segundo Feres, estudos mostram que o desempenho acadêmico dos cotistas é comparado ao dos não cotistas e que, inclusive, a taxa de abandono é menor entre os alunos que entram na universidade pelo sistema de cotas. “O aluno que consegue acabar o ensino médio e entrar pela cota é um cara que tem méritos e merece oportunidades para se formar”, falou.
Carlos Henrique de Brito Cruz, ex-reitor da Unicamp (Universidade Estadual de Campinas) e diretor científico da Fapesp (Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo), afirma que a lei viola o princípio da autonomia universitária acadêmica, mesma crítica feita pela Andifes (Associação Nacional dos Dirigentes das Instituições Federais de Ensino Superior). “Acho que isso é muito grave, porque um dos momentos mais importantes da vida acadêmica de uma universidade é o da seleção dos candidatos. O ensino progrediria muito mais se as universidades tivessem autonomia para fazer a inclusão usando sua experiência, história e conhecimento, ao invés de fazer por um processo uniforme”, afirmou.
Já para Feres, o argumento da autonomia universitária virou “bandeira dos anti-cotas”. “Autonomia universitária é uma coisa relativa, a universidade é bancada com dinheiro público, ela não pode ser totalmente autônoma com relação ao Estado. É preciso seguir várias regulamentações e essa lei, agora, é uma delas. O que a lei está pedindo me parece muito razoável do ponto de vista do interesse público”, disse o cientista político.
Outro ponto criticado por Brito é o fato da lei priorizar a inclusão considerando a cor autodeclarada da pele, quando, para ele, deveria ser utilizado apenas o critério social: “O que acontece no Brasil hoje é que a questão social afeta muito mais o acesso à universidade do que a questão da cor da pele autodeclarada.”
Entenda como irá funcionar
As vagas reservadas para cotas serão prioritariamente preenchidas por alunos negros e indígenas, seguindo a proporção dessa população em cada Estado. Além disso, das vagas reservadas, 50% serão destinadas a alunos de escolas públicas que tenham renda per capita familiar igual ou inferior a um salário mínimo e meio.
Já para o próximo processo seletivo, afirma o MEC (Ministério da Educação) 12,5% das vagas precisarão estar reservadas. O próximo Sisu (Sistema de Seleção Unificada) já levará em conta o critério. As universidades terão até 2016 para implantar a nova regra.
Em setembro, segundo o ministro Aloizio Mercadante, deve sair a regulamentação do texto.
Foi vetado o ponto que determinava o uso das médias dos alunos, o chamado coeficiente de rendimento, como um dos métodos de acesso à universidade. Mercadante anunciou na semana passada que Dilma vetaria o artigo. O critério de seleção será o Enem (Exame Nacional do Ensino Médio).
"Nada adianta eu manter uma universidade fechada e manter a população afastada em nome da meritocracia. Também de nada adianta eu abrir universidade e não preservar a meritocracia”, afirmou Dilma.
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