Para fazer com que seus alunos consigam o melhor resultado possível no Enade (Exame Nacional de Desempenho de Estudantes) 2012, faculdades particulares têm feito aulas preparatórias, simulados e chegam a dar tablets e diárias em pousadas de praia para os estudantes que frequentam as atividades.

As instituições dizem que usam desses artifícios para tentar estimular seus alunos a fazer bem a prova. Como ela não tem nenhum valor posterior para o aluno, mas é obrigatória para quem vai receber o diploma, muitos deixam o exame em branco ou o respondem de maneira displicente. O problema para as faculdades é que a nota no Enade influi diretamente na avaliação do curso junto ao MEC (Ministério da Educação). Uma avaliação ruim pode resultar até no descredenciamento do curso.

Diária na praia

A Faculdade Farias Brito, de Fortaleza, é uma das que admite que "estimula" seus alunos a participar (direito) do Enade. "O aluno não se sente estimulado [a fazer o Enade]. Fortaleza ainda tem a praia para tirá-lo disso. Ao invés de ir para a praia, curtir, tomar uma cervejinha, para que eu vou fazer isso [a prova]?", questiona Tales Cavalcante, diretor-superintendente da organização que controla a faculdade.

Para tentar resolver o problema, a faculdade aproveitou o fato de que uma de suas alunas é dona de uma pousada na beira de uma praia a 120 km da capital cearense e decidiu sortear duas diárias para quem frequentasse pelo menos 75% das aulas preparatórias para o Enade. Essas aulas seriam ministradas para o curso de direito, que faz a prova deste ano.

Não que tenha dado muito certo. "A gente vem sentido cada vez mais que os alunos não se interessam pelas atividades do Enade. Para você ter uma ideia, nesse sorteio que a gente fez, não teve frequência e não conseguimos dar as diárias", afirma Fernanda Benardie, diretora acadêmica da Farias Brito.

Após a faculdade ser contatada pelo UOL Educação, a página que anunciava o sorteio das diárias foi retirada do ar. Segundo Cavalcante, a ordem para que a página saísse do ar foi dada diretamente por ele, que diz ter "problemas jurídicos" na região.

Brindes

Outras universidades decidem apelar para brindes –que vão de canetas a tablets.

A Estácio, um dos maiores grupos de ensino superior privado do país, deu tablets aos cinco primeiros colocados nos simulados feitos pela instituição. Mas a reitora da faculdade, Paula Caleffi, diz que o foco "não é a premiação".

"Não é exatamente preparar os alunos em termo de conteúdo, mas fazer simulado, treiná-lo no tipo de questão específica do Enade", afirma.

Treino para o modelo de prova do Enade, que traz questões objetivas e discursivas com bastante contextualização, é o objetivo da gaúcha Unisinos, que também sorteia brindes –e chega a dar uma bolsa de especialização e MBA para quem tirar a melhor nota em cada curso.

Segundo a gerente de desenvolvimento do ensino da Unisinos, Isamara Alves, os próprios alunos pediram exercícios que mostrassem como as questões são formuladas. Por meio de uma espécie de "gincana" no site da instituição, itens são postados pelos professores e os alunos que primeiro os responderem, ganham o prêmio.

De acordo com Isamara, a falta de engajamento dos estudantes é um problema. "O que a gente ouve muito dos alunos? Eles não dão importância para a nota do Enade. Mas o aluno passa e a nota da universidade segue", diz.

"Vale tudo"

Para Lalo Watanabe Minto, professor da Unesp (Universidade Estadual Paulista) Marília, o exame em si estimula esse tipo de comportamento por parte das instituições. "O Enade acaba produzindo uma avaliação muito pontual, que gera um resultado que pode ser divulgado, propagandeado. Daí, vale tudo. É um problema sério", diz.

"[O Enade] Pega o processo, não dá conta de explicar as condições de ensino, mas permite uma artimanha desse tipo", afirma o professor, que se diz crítico do modelo do ensino privado. "Acho que a crítica que deve ser feita ao ensino privado envolve a forma em que ele é organizado, que é para fornecer lucro. Uma coisa vai levando a outra."

O Inep (Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais) diz que não há proibição alguma para as preparações pré-prova e que não pode interferir nas instituições, sob pena de ferir a autonomia universitária. Porém, afirmou o órgão ao UOL, "se houver uma boa prática pedagógica, os estudantes não necessitarão de nenhuma preparação extra para fazer o Enade".