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Ao 64 anos, idosa volta para a escola e vai para olimpíada de matemática

Arvelina Volpato Vitorino, 64, está na 2º fase das Olimpíadas de Matemática - Arquivo pessoal
Arvelina Volpato Vitorino, 64, está na 2º fase das Olimpíadas de Matemática Imagem: Arquivo pessoal

Eduardo Schiavoni

Colaboração para o UOL, em Ribeirão Preto

15/09/2015 05h00

As últimas semanas foram de ansiedade e dedicação para a estudante Arvelina Volpato Vitorino. Craque na matemática, ela está entre os 136 mil estudantes paulistas classificados para a segunda fase da OBMEP (Olímpiada Brasileira de Matemática das Escolas Públicas), realizada no último sábado (12). Mas Dona Lina, como é conhecida, faz parte de um outro grupo ainda mais restrito. Aos 64 anos, ela está entre as 217 pessoas com mais de 60 anos que fizeram a prova em todo o país.

Modesta, Dona Lina admite que não esperava se classificar para a segunda fase. “No meu tempo, a matemática era diferente, tinha mais problemas. Hoje é mais complexo, tem mais coisas envolvidas do que fazer conta, mas eu fui bem nas aulas, os professores me convidaram e, como sou muito curiosa, resolvi ver como é”, conta. “Quando vi que passei, levei um imenso susto”, disse.

A olimpíada tem o objetivo de estimular o interesse pela ciência e de revelar talentos da área independente da faixa etária. Em todo o país, quase 18 milhões de alunos foram inscritos, sendo que 888,8 mil passaram para a segunda fase.

Para esta etapa, ela diz que estudou pelo menos quatro horas por dia. "A prova foi tranquila, acho que fui bem. Estudei bastante e resolvi quase todas as questões. Vamos ver o resultado, mas estou feliz de ter participado dessa segunda fase", disse.

Os 6,5 mil melhores colocados receberão medalhas de ouro, prata e bronze e serão convidados a participar do PIC (Programa de Iniciação Científica) no ano que vem.

A vida na escola

Dona Lina parou de estudar aos 12 anos, quando estava na 4ª série. À época, ela trabalhava como babá em uma casa de família em Ilha Solteira (SP) e só poderia estudar no período noturno. O pai, austero, não permitiu e ela acabou abandonando a escola.

Aos 19 anos, casou-se com Mauro e foi para Jaú (SP). “Eu tinha vontade de estudar, sempre adorei a matemática, mas aí vieram os cinco filhos e não teve como”, contou.

A falta de estudo não impediu que ela exercesse, por 16 anos, a função de merendeira em escolas da rede municipal de Jaú. Lá, conviveu com professores e tomou gosto pelos estudos. “Eu não estudava, mas aprendia muito. Sempre adorei trabalhar em escolas e poder aprender”, disse.

Mas só com a aposentadoria, no ano passado, pode realizar o sonho de infância e voltar à sala de aula. Ela se matriculou em uma turma do EJA (Educação de Jovens e Adultos). “Meus filhos, meu marido, meus amigos, todos me apoiaram e eu voltei para a escola. Devo concluir o ensino fundamental até o fim do mês”, conta ela, orgulhosa.

Dona Lina conta que pegou gosto pelos estudos e que pretende cursar o ensino médio e, quem sabe, uma faculdade. “Também vou prestar concurso, quero voltar a ser merendeira. E depois, quem sabe, professora.”

Novos sonhos aos 60

Longe de ser uma exceção, casos como o de Dona Lina podem ocorrer com frequência cada vez maior. Essa é a opinião do gerontologista Fernando Bignardi, da Unifesp (Universidade Federal de São Paulo).

O profissional cita como exemplo o fato de que o total de pessoas inscritas no Enem (Exame Nacional do Ensino Médio) com idade superior a 60 anos ter crescido 41% de 2014 para 2015, totalizando mais de 15,5 mil inscritos.  "Antes, dizia-se que a terceira idade era marcada por um declínio da capacidade de aprendizado. Hoje, vemos, cada vez mais, um envelhecimento ativo. Os idosos de hoje querem oportunidades, querem concretizar seus sonhos", afirma. “Hoje, uma pessoa com 60 anos está apenas começando”, disse.