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Entradas e Bandeiras - Bandeirantes expandiram limites do Brasil

Renato Cancian

Especial para a Página 3 Pedagogia & Comunicação

Foi a partir do século 17 que as terras do interior do Brasil passaram a ser rotineiramente exploradas. O desbravamento e povoação dessas terras foram iniciados por expedições pioneiras chamadas de Entradas e Bandeiras. As Entradas geralmente eram expedições oficiais, ou seja, foram organizadas pelo governo da autoridade colonial. Já as Bandeiras tinham motivação particular, isto é, eram organizadas por colonos que se estabeleceram nos povoados.

Os historiadores ainda hoje debatem sobre a caracterização dos dois tipos de expedições, mas ainda assim aceitam a diferenciação mencionada acima. O mais importante é entender os fatores que ocasionaram a criação das Entradas e das Bandeiras e as mudanças que essas expedições provocaram no processo de colonização do Brasil.

Riquezas e escravos

As Entradas e Bandeiras foram expedições organizadas para explorar o interior com o propósito de procurar riquezas minerais, tais como ouro, prata e pedras preciosas. Objetivavam também caçar e apresar índios para escravizá-los. Não era uma tarefa fácil organizá-las, e muito menos explorar o interior do território colonial. Havia a necessidade do preparo de muitas provisões, como alimentos, armas e instrumentos, que deviam ser transportados por animais e pelos próprios exploradores.

Outra tarefa difícil era reunir homens que estivessem dispostos a penetrar mata adentro e permanecer muitos meses no interior, sem a certeza de que retornariam com vida para seus povoados e do êxito que teriam na descoberta de riquezas ou no enfrentamento e apresamento dos índios.

As Entradas tiveram início logo após a descoberta do Brasil. Em 1504, Américo Vespúcio organizou uma Entrada composta por trinta homens que partiu de Cabo Frio e penetrou no sertão. Martim Afonso de Souza organizou duas Entradas. A primeira foi composta por quatro homens, saiu da Guanabara e permaneceu no interior por cerca de dois meses. A segunda foi composta por cerca de 80 homens e chefiada por Pedro Lobo. Saiu da ilha de Cananeia (no atual estado de São Paulo) e jamais retornou. Após o estabelecimento do Governo-Geral, as Entradas passaram a ser organizadas com maior frequência, mas restringiram-se a explorar o interior da Bahia e de Minas Gerais.

São Vicente e São Paulo
As Entradas declinaram no início do século 17. As Bandeiras surgiram no início do desse mesmo século e se estenderam por todo o século seguinte. Foi na vila de São Vicente que surgiram as primeiras Bandeiras. O solo dessa região, impróprio para o plantio da cana-de-açúcar, ocasionou o rápido declínio da produção açucareira levando a estagnação econômica dos povoados. Os habitantes da região tiveram que encontrar outra atividade econômica para sobreviver. A alternativa foi a organização das expedições desbravadoras.

A vila de São Paulo também ficou famosa pela organização de expedições bandeirantes. As Bandeiras organizadas pelos habitantes de ambas as vilas dedicaram-se, inicialmente, à caça e apresamento de índios para vendê-los como mão-de-obra escrava aos engenhos produtores de açúcar, situados nos ricos solos do Nordeste brasileiro. Seus alvos principais eram as missões jesuíticas que concentravam grande número de índios em fazendas, para serem pacificados e depois catequizados pelos religiosos da Companhia de Jesus.

O colégio de Piratininga
Foram os jesuítas, liderados pelo padre Nóbrega, que se estabeleceram na região de Piratininga, fundando um pequeno povoado que cresceu e deu origem a vila de São Paulo. Tudo começou com a construção de um colégio e uma casa, que eram locais para catequese dos índios. Com o surgimento das Bandeiras e das atividades de caça e apresamento dos índios, os jesuítas entraram em conflito com os bandeirantes. Na década de 1640, os bandeirantes expulsaram os jesuítas de São Paulo. Muitas missões jesuíticas, além das que se fixaram em Piratininga, foram destruídas pelos bandeirantes.

Com a substituição do índio pelo negro africano no trabalho escravo da grande lavoura, o ciclo do bandeirismo de caça e apresamento dos nativos declinou. Os bandeirantes passaram, então, a se concentrar na exploração de riquezas minerais. As Bandeiras organizadas pelos habitantes da vila de São Vicente começaram a procura de ouro nos leitos dos rios da região e foram percorrendo a zona litorânea.

As Bandeiras organizadas pelos habitantes de São Paulo, com o mesmo propósito, foram motivadas a penetrar no sertão brasileiro, favorecidas pela situação geográfica da vila e pelo curso dos rios da região, que facilitavam a exploração do interior. Mas é importante assinalar que a caça e apresamento de índios não parou por completo, os próprios bandeirantes passaram a utilizar a mão-de-obra indígena para trabalharem nas pequenas lavouras de subsistência e até nas próprias expedições de exploração.

Povoamento e expansão territorial
As expedições bandeirantes tiveram importância crucial para o povoamento, diversificação das atividades econômicas e expansão territorial do Brasil colonial. Ao longo das trilhas percorridas e dos caminhos abertos pelos bandeirantes foram surgindo diversos povoados. As Bandeiras que percorreram o litoral à procura de ouro, partindo de São Vicente, deram origem às vilas de Itanhaém, Iguape, Paranaguá, Laguna e Desterro, entre outras. A penetração no sertão deu origem a vilas e arraiais como Cuiabá, Vila Rica, Diamantina, Sabará e Mariana, entre outras.

As expedições bandeirantes também possibilitaram a descoberta de riquezas minerais como ouro, prata e diamante, metais preciosos que deram origem a um novo ciclo econômico de exploração colonial. O êxito dos bandeirantes, principalmente na descoberta de metais preciosos, fez com que a Coroa portuguesa passasse a financiar muitas expedições com o objetivo de encontrar essas riquezas minerais e explorá-la como alternativa a crise econômica provocada pelo declínio da produção do açúcar.

Enquanto as Entradas respeitavam os limites territoriais fixado pelo Tratado das Tordesilhas, que dividia as terras do continente americano entre Portugal e Espanha, as Bandeiras geralmente ultrapassavam essa fronteira, em direção às regiões Sul, Norte e Centro Oeste. Entre 1580 e 1640, Portugal ficou sob domínio Espanhol. Durante esse período, também conhecido como a união das Coroas ibéricas, a Espanha governou Portugal e todos os seus domínios. Nessa época, os bandeirantes não encontraram resistências quanto a ultrapassar Tordesilhas. Quando Portugal se libertou do jugo espanhol o território colonial brasileiro havia se ampliado significativamente.

Mitos e monumentos
As Bandeiras deram origem a narrativas épicas, mitos e lendas sobre o desbravamento e conquista do sertão brasileiro, que hoje fazem parte do simbolismo regional. Embora tenham sido responsáveis pela escravização e dizimação de inúmeras etnias indígenas e pela destruição de muitas missões jesuíticas, os bandeirantes são retratados como homens heroicos, portadores de coragem, bravura e espírito aventureiro, que penetraram na mata e desbravaram a vastidão do interior até então desconhecido, enfrentaram e dominaram índios, descobriram e exploraram riquezas minerais e fundaram povoados.

Na capital paulista, outrora vila e centro irradiador das expedições bandeirantes, ergueu-se o Monumento às Bandeiras, de Victor Brecheret, um dos mais importantes escultores brasileiros. E bandeirantes famosos como Bartolomeu Bueno da Silva (conhecido como Anhanguera), Antônio Raposo Tavares e Fernão Dias Pais, foram homenageados tendo seus nomes dados a importantes rodovias que percorrem o interior do Estado de São Paulo.