Irã: ontem e hoje - Síntese histórica
Érica Turci
O Irã, país que se localiza no Planalto Iraniano (Oriente Médio), era chamado de Pérsia do século 6 a.C. até 1935, apesar de o nome Irã já ser utilizado pelos persas desde o século 7. Durante a Antiguidade, a Pérsia foi um grande império, que englobava desde a atual Turquia até o Punjab, incluindo o Egito (África).
Depois de muitos séculos sob domínio de outros povos ou em guerra para conquistar seu antigo império, a Pérsia foi anexada pelo Império Árabe (século 7 até 11). A partir de então, o islamismo se tornou a religião local, mas os iranianos adotaram a versão xiita como forma de reação nacionalista, já que o Império Árabe era sunita. Da mesma forma, a língua persa foi mantida em oposição à língua árabe, dos dominadores.
Até hoje a língua persa e o xiismo são defendidos pelos iranianos como sua forma de resistência diante dos séculos em que foram subjugados.
Irã no século 19 e início do 20
Nos séculos 18 e 19 os iranianos tiveram que enfrentar duas novas potências imperialistas: a Rússia, que queria ampliar seus domínios sobre a Ásia Central, e o Império Britânico, que desejava o controle sobre a exploração do petróleo asiático. Em 1907, Inglaterra e Rússia firmaram um acordo que, sem consultar o xá (monarca) da Pérsia, dividiu o território em zonas de influência: norte sob controle russo e sul sob controle britânico.
Dentro dessa conjuntura, a Pérsia foi arrastada para a Primeira Guerra Mundial (1914-1918). Esse grande conflito colocou a Entente (Império Britânico, França e Império Russo) contra a Aliança (Império Alemão, Império Austro-Húngaro e Império Turco-Otomano). A Pérsia, zona de influência de russos e britânicos, era vizinha do Império Turco e possuía os recursos naturais (petróleo) que os dois lados queriam.
Ao final da Primeira Guerra Mundial a situação se agravou para os persas: ao norte, os russos estavam em processo revolucionário (Revolução Russa) e os britânicos, para impedir o avanço dos ideais bolcheviques através Ásia, enviaram tropas para o norte da Pérsia. Terminada a Grande Guerra, o Império Britânico tinha total controle sobre os iranianos e, principalmente, sobre seus poços de petróleo.
A dinastia Pahlevi
Reza Khan, militar persa, aproveitando-se da fraqueza da dinastia Qajar no pós-guerra, tomou o trono, tornando-se o primeiro xá da dinastia Pahlevi na Pérsia (1925), mudando o nome do país para Irã, em 1935.
Reza Xá Pahlevi (novo nome de Reza Khan) foi responsável pelo impulso de modernização que o Irã viveu na década de 1930, submetendo-se ao modelo ocidental.
Durante a Segunda Guerra Mundial (1939-1945), Reza Xá teve seu país invadido por tropas britânicas e soviéticas, devido a sua simpatia pelo regime nazista alemão, e por isso abdicou do trono em nome de seu filho, Mohammad Reza Pahlevi (1941).
O novo xá, Reza Pahlevi, manteve a política de aproximação e submissão do Irã ao ocidente, ao mesmo tempo em que cresciam movimentos nacionalistas, exigindo a independência econômica do Irã.
Em 1949 surgiu a Frente Nacional do Irã, liderada pelo nacionalista Mohammed Mossadegh, preso durante o governo de Reza Xá por ser um grande critico da política pró-ocidente dos Pahlevi. Contando com a simpatia popular, Mossadegh foi eleito 1º Ministro em 1951.
Mossadegh conseguiu nacionalizar o setor petroleiro em 1953, até então nas mãos dos britânicos, e por isso a Grã-Bretanha iniciou um bloqueio econômico ao Irã. Em plena Guerra Fria, a União Soviética, a fim de ampliar sua influência sobre a região, passou a comprar o petróleo iraniano, levando os Estados Unidos a apoiarem o bloqueio britânico.
Durante esse episódio, Reza Pahlevi deixou o Irã, mas por pouco tempo. Por meio de um golpe de Estado conhecido por Operação TP-Ajax, arquitetado pelo serviço secreto britânico e pela CIA, Mossadegh foi deposto e o xá voltou a governar o Irã.
A partir de então, o governo de Pahlevi se tornou ditatorial. As reformas introduzidas, na chamada Revolução Branca, visavam principalmente: a modernização do Irã (ampliando as relações do Irã com os Estados Unidos) e a separação entre o Estado e o clero xiita (sendo que a maioria da população iraniana é xiita).
Qualquer oposição às medidas tomadas pelo xá era reprimida pela brutal Savak - polícia política iraniana. A censura agia de forma a proibir tanto as organizações trabalhistas quanto os nacionalismos - e até mesmo os ideais religiosos.
O governo iraniano mostrava ao mundo um Irã moderno, símbolo de desenvolvimento. Ao mesmo tempo, os governos ocidentais acreditavam que o Irã era a possibilidade de "evolução" dentro Oriente Médio, região considerada por eles como pobre e retrógrada. O fato de o Irã possuir uma das maiores reservas de petróleo do mundo justificava o grande apoio militar e econômico recebido pelo xá, principalmente dos Estados Unidos.
Mas a repressão da Savak descontentava todos os setores da sociedade, que viviam em condição de pobreza, apesar de toda a pompa e riqueza ostentada pela monarquia. Além disso, a rápida ocidentalização do país amedrontava o povo, que desde muito tempo lutava para manter sua cultura persa milenar.
Em meados da década de 1970, na cidade de Qom, principal centro religioso do Irã, o clero xiita iniciou um amplo movimento exigindo a democratização do país, com apoio da elite comercial local, que se ressentia do controle econômico estrangeiro.
Em pouco tempo, esse movimento se expandiu para as regiões industrializadas, levando à adesão dos operários. Desse momento em diante, foram os trabalhadores das fábricas (a maior parte delas estrangeiras) que lideraram a luta democrática e anti-imperialista: a grande greve de outubro de 1978 acirrou o embate entre a monarquia ditatorial e o movimento popular.
Nos Estados Unidos, o grande país aliado de Reza Pahlevi, o presidente Jimmy Carter tinha iniciado a chamada "política dos direitos humanos", recusando-se a auxiliar governos ditatoriais no mundo, o que esfriou as relações com o Irã, possibilitando a ampliação do questionamento da autoridade do xá entre os iranianos
A Revolução Islâmica
Irã: ontem e hoje: Síntese histórica
Entre o final de 1978 e inicio de 1979, manifestações contra Reza Pahlevi tomaram várias cidades do Irã. A população aclamava o clérigo xiita Ruhollah Khomeine com um imã, quer dizer, como o líder político e religioso dos iranianos.
Ruhollah Khomeine estava fora do Irã desde 1964, devido sua oposição ao governo dos Pahlevi. Khomeine, na década de 50, tinha recebido o título de aitolá, ou seja, o "mais alto conhecedor da lei islâmica", o mais importante cargo da hierarquia do clero xiita. A facção xiita dentro do islamismo acredita que o Estado deve ser controlado por um líder religioso, a daí o aitolá Khomeine ser visto como o representante dos iranianos contra Reza Pahlevi.
As manifestações populares cresciam vertiginosamente. Como o exército e a Savak não conseguiam conter a população, em 16 de janeiro de 1979 Reza Pahlevi deixou o país. Os Estados Unidos ainda tentaram manter o 1º Ministro Chapour Bakhtiar. Mas em 1º de fevereiro de 1979, o aitolá Khomeine retornou ao Irã, assumindo a liderança da revolução.
Entre 10 e 12 de fevereiro uma insurreição popular armada tomou conta das principais cidades do Irã. Quando o exército iraniano passou a defender a revolução, Bakhtiar também teve que deixar o país.
Nesse processo, a Guarda da Revolução Islâmica (PASDARAM), milícia religiosa ligada ao clero xiita, tomou o controle da insurreição, iniciando quase que imediatamente a repressão aos líderes não religiosos do movimento (trabalhadores, intelectuais, políticos), instaurando no Irã um Estado teocrático que perdura até os dias de hoje, sob o nome de República Islâmica do Irã.
O novo governo rompeu relações diplomáticas e comerciais com vários países, acusados de explorar a economia iraniana. Em novembro de 1979, a embaixada norte-americana de Teerã (capital do Irã) foi invadida, como represália pelo fato de os Estados Unidos terem acolhido Reza Pahlevi.
As relações entre o Irã e os Estados Unidos se tornaram mais difíceis quando esses últimos apoiaram a invasão do Irã pelo Iraque (setembro de 1980). A Guerra Irã-Iraque durou 8 anos, sem que nenhum dos lados tenha vencido efetivamente, e serviu, mais do que qualquer outra coisa, para unir os iranianos em apoio a Khomeine, fortalecendo ainda mais o poder teocrático dentro do Irã.