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Estados voltam às aulas com casos de covid, briga na Justiça e medo de pais

Amazonas, Maranhão e Distrito Federal têm volta parcial ou previsão de reabertura das escolas - divulgação
Amazonas, Maranhão e Distrito Federal têm volta parcial ou previsão de reabertura das escolas Imagem: divulgação

Alex Tajra e Ana Carla Bermúdez

Do UOL, em São Paulo

15/08/2020 04h00

Estados que estipularam datas para o retorno das atividades presenciais em escolas públicas ou privadas registram contestações na Justiça, incluindo pareceres contrários do Ministério Público do Trabalho, e preocupação por parte dos pais que não se sentem seguros com a volta das aulas.

Em situações distintas na pandemia do novo coronavírus, Amazonas, Maranhão e Distrito Federal já chegaram a autorizar uma retomada parcial das atividades nas escolas. Nos dois primeiros, há registros de casos de covid-19 entre alunos e funcionários.

Em Manaus, escolas particulares estão abertas há mais de um mês, desde o dia 6 de julho. O estado foi o primeiro a permitir esta reabertura. Já as escolas estaduais começaram a receber alunos na última segunda-feira (10), sob protesto dos docentes. O sindicato de professores acionou a Justiça para tentar barrar o retorno.

No Distrito Federal, as aulas nas escolas públicas retornam, de forma gradual, a partir do dia 31 de agosto. Nas privadas, o governo chegou a autorizar a abertura para o dia 27 de julho, mas decisões da Justiça têm impedido a retomada.

No Maranhão, não há previsão para a reabertura das escolas públicas estaduais, mas as escolas particulares e municipais estão autorizadas a retomar as atividades desde o dia 3 de agosto.

Manaus: Volta às aulas chega à Justiça

O Amazonas foi o primeiro estado a permitir a reabertura das escolas públicas estaduais da capital, que receberam cerca de 55 mil alunos na última segunda-feira (10). Outros 55 mil retornaram na terça (11) às escolas estaduais de Manaus, já que o estado determinou que a volta seja de forma híbrida, com 50% da ocupação das salas de aula e atividades presenciais e on-line simultâneas.

Dentro das escolas amazonenses, as carteiras são sinalizadas e estão dispostas com distância de 1,5 m umas das outras. Pias e frascos com álcool em gel foram disponibilizados. Apesar da liberação na capital, não há uma data confirmada para a volta das aulas no interior do estado.

No primeiro dia, houve baixa adesão dos alunos e protestos dos professores, que fincaram cruzes na frente das escolas, em alusão às vítimas da covid-19. O Sinteam (Sindicato dos Trabalhadores de Educação do Amazonas) defende que as aulas remotas sejam mantidas até que haja segurança para os trabalhadores. O sindicato acionou o Ministério Público estadual nesta semana para tentar barrar o retorno às aulas.

"O protocolo de segurança [do governo estadual] é muito bem desenhado, mas na prática ele não funciona. As escolas do Amazonas, tal qual as do país, não têm estrutura para atender aos protocolos. Tem escola aqui sem janela", diz a professora Ana Cristina Rodrigues, presidente do Sinteam,

Segundo o governo amazonense, 10 casos de covid-19 foram registrados nas escolas — oito professores e dois alunos — e estão sendo acompanhados pela FVS (Fundação de Vigilância em Saúde do Amazonas)

Mesmo assim, a secretaria apenas fez a sanitização das escolas e reabriu no dia seguinte. Se tivemos esses casos em poucos dias, como será daqui um mês?
Ana Cristina Rodrigues, professora da rede estadual e presidente do Sinteam

No mesmo dia da volta às aulas, a Asprom (Associação Sindical dos Professores de Manaus) convocou uma greve de professores e educadores contra o retorno presencial das atividades. Os sindicatos argumentam que pais, alunos e professores estão com medo e temem pela contaminação, já que não há estabilização da pandemia no país.

Na quarta-feira (12), professores cruzaram os braços e permaneceram em frente às escolas em sinal de protesto. No Centro Educacional Arthur Virgílio Filho, que leva o nome do pai do prefeito de Manaus, Arthur Virgílio Neto (PSDB), os docentes foram até o local e decidiram não entrar. O mesmo aconteceu no colégio estadual Maria do Céu Vaz D'Oliveira, onde há um caso de coronavírus confirmado, segundo o Sinteam.

A aposentada Dionice da Silva Bentes, 65 e sua mãe de 80 anos; ela diz estar com medo da volta às aulas em Manaus - Arquivo pessoal - Arquivo pessoal
A aposentada Dionice da Silva Bentes, 65 e sua mãe de 80 anos; ela diz estar com medo da volta às aulas em Manaus
Imagem: Arquivo pessoal

A aposentada Dionice da Silva Bentes, 65, têm 3 filhos matriculados na rede estadual de Manaus. Na mesma casa também vive sua mãe, de 80 anos. "Eu acho um absurdo, como mãe eu não me sinto segura. Eles pensam na proteção que existe dentro do colégio, mas e na condução?", questiona. Ela e os filhos têm de pegar ônibus para ir para a escola, em um trajeto que pode demorar uma hora.

"Aqui em casa moram duas pessoas do grupo de risco. Eu tenho 65, minha mãe tem 80. O diretor da escola não aceita conversa, não houve qualquer diálogo da escola com os pais. Tenho conversado com outros pais que também estão com medo", diz Bentes. Seus filhos poderão ir para a escola no dia 24, quando serão retomadas as aulas no Ensino Fundamental, mas ela diz que provavelmente eles permanecerão em casa.

Em nota, a secretaria de Educação do Amazonas informou que os professores passaram por formações voltadas ao uso de tecnologias e às questões emocionais em meio à pandemia de coronavírus. O secretário Luís Fabian Barbosa informou que os profissionais da educação passarão por uma testagem em massa, o que seria uma demanda do setor.

"Desde o retorno, na segunda-feira (10), as escolas registram pouca ou nenhuma ausência de professores nas salas, contrariando as informações divulgadas pelos sindicatos da categoria", diz a secretaria. "Máscaras, totens de álcool em gel, instalações de pias e tapetes sanitizantes, e vasto material informativo fazem parte das medidas adotadas nas escolas para que os alunos e servidores voltassem às aulas presenciais com a maior segurança possível."

Casos de covid-19 no MA

No Maranhão, um decreto do governador Flávio Dino (PCdoB) autoriza, desde o dia 3 de agosto, a retomada das aulas presenciais nas escolas particulares e municipais. Por outro lado, ainda não há previsão de data para a reabertura das escolas públicas estaduais —no fim de julho, o governo do Maranhão decidiu adiar a volta das atividades presenciais na rede pela quinta vez.

A decisão, segundo a secretaria de Educação do estado, aconteceu após consulta com a comunidade escolar. A pesquisa apontou que a maioria dos pais e responsáveis não se sente seguros com a retomada das atividades: 58% deles disseram preferir que as aulas presenciais ainda não devem ser retomadas.

Presidente da Aspa-MA (Associação de Pais e Alunos de Estabelecimentos de Ensino do Estado do Maranhão), Marcelo Freitas critica a decisão do Estado de autorizar a retomada de parte do setor educacional. "A gente continua criando disparidade entre escolas públicas e privadas. Não deveria existir um protocolo para as particulares e outro para o estado", diz.

Ele também questiona a retomada das atividades na rede privada, as condições em que isso acontece e afirma que a reabertura das escolas aconteceu sem consulta às famílias.

Paulino Pereira, presidente do Sinepe-MA (Sindicato dos Estabelecimentos Particulares de Ensino do Maranhão), diz que as escolas privadas abriram espaço para que os pais se manifestassem por meio de questionários e afirma que as famílias que eventualmente não se sentirem seguras com a retomada das atividades presenciais continuarão tendo acesso ao ensino remoto.

"A coisa não foi imposta, ela foi formatada. Todas as escolas foram orientadas a submeter [um questionário] às famílias, para que cada um pudesse se manifestar, e pudesse ter a decisão de, caso se sentir inseguro, manter o filho no ensino remoto", afirma.

Em São Luís, pelo menos duas escolas particulares registraram casos de coronavírus às vésperas da reabertura ou logo após a retomada. Em comunicado enviado às famílias no dia 9 de agosto, o Colégio Dom Bosco informou que uma colaboradora do ensino médio recebeu o resultado positivo no teste para a covid-19.

A escola então decidiu suspender as aulas presenciais do ensino médio e dos anos finais do ensino fundamental. "Informamos que todas as medidas de segurança foram tomadas para bloquear o foco de contágio. As pessoas que tiveram contato próximo serão testadas e também permanecerão afastadas por 14 dias", diz o texto. A reportagem tentou contato com o colégio, mas ninguém respondeu.

"Fiquei tranquila porque o colégio foi bem assertivo, informou aos alunos de todas as séries, explicou para qual série aquela colaboradora prestava serviço. Como os prédios da educação infantil e fundamental são separados, eu não me senti apreensiva", diz a fisioterapeuta Larissa Gustinelli, que tem um filho matriculado no Dom Bosco, ressaltando que há diferenças na realidade das escolas públicas e privadas.

Ela diz ter ficado receosa em um primeiro momento com a retomada das atividades presenciais porque vive com seu sogro de 78 anos. No entanto, decidiu levar o filho à escola, uma vez que já estava saindo de casa para trabalhar e sentiu que o menino estava com dificuldades em relação às aulas remotas — além de estar ansioso para voltar à sala de aula.

Já o Colégio Batista, que planejava o retorno gradual das atividades para o dia 3, decidiu suspender a volta das aulas após um professor receber, no dia 2, o resultado positivo de um teste rápido para a covid-19. As atividades presenciais foram retomadas no colégio na última segunda-feira (10) e o docente permanece afastado.

Presidente do Sinterp-MA (Sindicato dos Trabalhadores em Estabelecimentos de Ensino da Rede Particular do Maranhão), Luís Jorge Lobão Borges diz que os professores estão apreensivos e têm medo não só de serem infectados, mas também de perder o emprego em meio à crise.

Eles [os professores] estão na linha de frente, assim como os médicos nos hospitais. Vão estar em contato com os alunos, principalmente da educação infantil, etapa em que é difícil manter o distanciamento
Luís Jorge Lobão Borges, presidente do Sinterp-MA

O presidente do Sinterp ainda defende que, enquanto não houver uma vacina eficaz, as aulas sejam mantidas apenas no formato remoto.

O UOL pediu entrevista ao secretário de Educação do Maranhão, Felipe Camarão, mas sua assessoria afirmou que ele estava sem disponibilidade. Em nota, a pasta informou que tomou conhecimento dos dois casos de coronavírus nas escolas por meio dos veículos de imprensa, e que vai apurar os casos.

No DF, vai e volta na Justiça

O governador do Distrito Federal, Ibaneis Rocha (MDB), anunciou, em julho, o retorno das aulas presenciais em instituições de ensino privadas antes das públicas. Mas a retomada das atividades foi suspensa por conta de um embate na Justiça. No dia 4 de agosto, a juíza Adriana Zveiter, da 6ª Vara do Trabalho de Brasília (DF), chegou a derrubar uma liminar e permitir o retorno das aulas nas instituições privadas. Ela é filha de Jaime Martins Zveiter, ex-presidente e membro do Conselho Consultivo do Sinepe, sindicato patronal que defende a reabertura das escolas.

Dois dias depois, a decisão da juíza foi revogada em decisão liminar (provisória). Na quarta-feira (12), a suspensão da volta às aulas foi mantida pelo desembargador do TRT-10 (Tribunal Regional do Trabalho da 10ª Região), Pedro Luís Vicentin Foltran. O governo do DF e o Ministério Público do Trabalho terão dez dias para se manifestar sobre a decisão.

Em nota, o Sinepe informou que Jaime Martins Zveiter "não compõe a atual diretoria executiva. Foi presidente da entidade no período de 1987 a 1990, ou seja, há 30 anos, não atuando com atividades educacionais desde então". O sindicato patronal defende que, se não houver retorno às aulas, mais de cem escolas correm risco de fechar ou declarar falência.

O MPT argumenta que, para o retorno das aulas presenciais, o governo precisa comprovar cientificamente a redução da curva de contaminação da covid-19 no DF. O órgão argumenta ainda que a volta às aulas coloca em risco os trabalhadores do ensino privado, além de ser discriminatório, já que a rede pública não foi autorizada a volta no mesmo período. O CDCA (Conselho dos Direitos da Criança e do Adolescente no DF) também é contra a volta às aulas.

Nas escolas públicas, o retorno das atividades presenciais será escalonado a partir do final de agosto:

  • 31 de agosto - alunos do EJA (Educação de Jovens e Adultos) e da Educação Profissional
  • 8 de setembro - alunos do Ensino Médio
  • 14 de setembro - alunos dos dois anos finais do Ensino Fundamental
  • 21 de setembro - anos iniciais do Ensino Fundamental
  • 28 de setembro - alunos da Educação Infantil
  • 5 de outubro - alunos dos Centros de Ensino Especial e Educação Precoce

Segundo o governo, o cronograma foi elaborado com "base em fatos científicos, cuidados e protocolos". As escolas privadas foram autorizadas a abrir antes das públicas, diz o governo, por conta da logística que seria mais simples nas particulares. Na rede pública, são 686 escolas e 460 mil estudantes, o que requer uma "preparação bem mais complexa".

"A pasta vem acompanhando a curva da pandemia e prosseguirá, conforme os estudantes forem retornando às atividades, para verificar o comportamento da pandemia no DF. Nenhuma decisão será tomada de forma que coloque em risco a saúde de estudantes, de professores, dos demais servidores que atuam nas escolas e das pessoas que precisam ir às unidades de ensino, como os pais", diz o secretário de Educação Leandro Cruz.

O retorno será híbrido e a presença será obrigatória dentro deste sistema. Os alunos que faltarem poderão repor as aulas pela plataforma "Google Sala de Aula".