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Pais reclamam de falas homofóbicas de diretor de colégio em Santo André

Colégio Liceu Jardim fica em Santo André, na Grande São Paulo - Reprodução
Colégio Liceu Jardim fica em Santo André, na Grande São Paulo Imagem: Reprodução

Ana Paula Bimbati

Do UOL, em São Paulo

13/11/2021 04h00

Pais de alunos do colégio Liceu Jardim, em Santo André, na Grande São Paulo, denunciam o diretor e dono da instituição por falas consideradas homofóbicas. Daniel Contro teria chamado as famílias para uma reunião sobre o retorno presencial das aulas e o impacto pós-pandemia, em 3 de novembro. Ao longo do encontro, segundo os pais, a conversa foi "mudando de rumo".

Procurados pelas famílias, o vereador Ricardo Alvarez, de Santo André, e o deputado federal Ivan Valente, ambos do PSOL, enviaram ao Ministério Público uma representação criminal contra o diretor (leia mais abaixo). O UOL entrou em contato com o diretor e com a assessoria de imprensa do colégio, mas não obteve retorno até a noite de sexta (12). O espaço fica aberto para atualização.

Um grupo formado por representantes da Educafro, Ubes (União Brasileira dos Estudantes Secundaristas) e do partido Rede também entrou com um pedido de ação civil contra o diretor. Em nota, o MP informou que a Promotoria de Santo André recebeu a representação, que está sob análise.

A reportagem teve acesso ao áudio da reunião. "Não temos nada contra quem tem opção homossexual. É um direito da pessoa, é um direito de cada um, a escola não vai interferir na escolha de ninguém. E nesta escola, dentro do nosso ideário pedagógico, há conjunto de valores dos quais não abriremos mão. Isso não será admitido como normal", disse Contro aos pais.

Uma das mães disse, na condição de anonimato, que começou a procurar uma nova escola para suas filhas logo após o encontro. Ela afirmou também que o diretor tem promovido palestras com temas religiosos, o que ela garante não ter acontecido em anos anteriores.

As mensalidades no Liceu variam de R$ 1.500 a R$ 4 mil e ele é considerado um dos melhores colégios da região.

Na reunião, Contro também disse que alguns pais teriam saído recentemente da escola chamando sua equipe de "quadrados, homofóbicos, preconceituosos" por não aderir ao banheiro neutro. "Exceto por força de lei, não vai ter", completou o diretor.

O diretor também usou o termo "ideologia de gênero". O conceito é pejorativo e utilizado pelo campo ultraconservador, muitas vezes ligado ao fundamentalismo religioso, contra os avanços nos direitos sexuais e reprodutivos e na igualdade de gênero, em especial a população LGBTQIA+.

"Não existe homossexualismo no Oriente. Putin [presidente da Rússia] e o discurso nacional dele se posicionando contra a ideologia de gênero. China não permite a existência dos homossexuais. Oriente Médio, islã não tolera. O Ocidente entrou nessa, que é o projeto da escola de Frankfurt, destruir os valores ocidentais. Enfraquecendo e destruindo a família ficaria tudo mais fácil para fazer a revolução. A família transmite os valores, a propriedade", disse Contro na reunião.

Uma outra mãe de aluno que participou do encontro ficou "revoltada" e "sem reação". Segundo ela, o colégio nunca havia se posicionado dessa forma, "sem qualquer respeito" com relação aos alunos e às famílias.

Alunos do colégio Liceu Jardim fizeram protesto na quinta-feira (11) contra homofobia  - Arquivo pessoal - Arquivo pessoal
Alunos do colégio Liceu Jardim fizeram protesto na quinta-feira (11) contra homofobia
Imagem: Arquivo pessoal

No total, três famílias ouvidas pelo UOL afirmaram que estão procurando novos colégios para seus filhos. Uma outra mãe, que havia matriculado sua filha para começar a estudar no próximo ano, vai cancelar o contrato.

Durante a reunião, Contro comentou que, caso os pais se sintam "desconfortáveis" com a posição da escola, "com respeito, talvez não seja essa a escola dos filhos".

Na quinta-feira (11), um grupo de alunos fez um protesto dentro da escola com cartazes com as frases "LGBTfobia é crime", "Nós não queremos LGBTfobia" e "O Brasil é o país mais mata pessoas LGBTs no mundo". Por outro lado, nas redes sociais há pais de alunos defendendo as declarações do diretor.

Pedido de esclarecimento

O vereador Ricardo Alvarez, de Santo André, e o deputado federal Ivan Valente pediram ao MP a intimação de Contro para explicar as declarações feitas, além de "promoção de ação penal cabível" e "de ação civil pública".

"A discriminação é nítida e direta, porque decorrente da intenção explícita de incluir na formação das crianças e adolescentes uma visão humilhante e constrangedora em relação a toda a população LGBTQIA+, causando prejuízo no exercício adequado do direito fundamental à cidadania e risco aumentado de violência por discursos como este", justificam Alvarez e Valente.

Em 2018, uma professora disse ter sido demitida do colégio por ser contra o presidente Jair Bolsonaro (sem partido), segundo reportagem da Ponte Jornalismo. Nas redes sociais, a educadora afirmou que passou a ser cobrada pelos alunos pelo seu posicionamento político durante o período eleitoral.

"Por várias vezes quiseram que eu abrisse meu voto, mas eu sempre me esquivava, até que sinalizei em quem não votaria em hipótese alguma, Bolsonaro, obviamente, uma vez que seu projeto de país era excludente e, como ele mesmo diz, para as maiorias", escreveu em uma publicação. Segundo ela, os pais de alunos pressionaram a direção por sua demissão.

Na época, o colégio negou.