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SP: Escolas vão comunicar Conselho Tutelar e MP sobre criança não vacinada

Apesar de pedirem carteira de vacinação, escolas de SP não devem barrar matrículas de crianças não imunizadas - Getty Images
Apesar de pedirem carteira de vacinação, escolas de SP não devem barrar matrículas de crianças não imunizadas Imagem: Getty Images

Ana Paula Bimbati e Lucas Borges Teixeira

Do UOL, em São Paulo

30/01/2022 04h00

Como ocorre todos os anos, escolas das redes pública e privada de São Paulo estão cobrando a carteira de vacinação dos alunos. Nos próximos meses, se constatarem que as crianças não tomaram a vacina contra covid-19, as instituições de ensino vão entregar os nomes ao Conselho Tutelar e ao MP (Ministério Público).

Ao UOL, a Seduc (Secretaria Estadual da Educação) e a associação de escolas particulares disseram que a prática já é comum com relação a outros imunizantes incluídos no PNI (Plano Nacional de Imunização) e que não vão proibir matrícula de não vacinados contra o coronavírus, mas esperam conscientizar os responsáveis. Na rede pública, a comunicação junto aos conselhos e ao MP se dará ao fim do primeiro bimestre. Na privada, a partir de julho.

A Secretaria de Educação do Estado de São Paulo determinou, em resolução publicada no sábado (29), que estudantes da rede estadual apresentem comprovante de vacinação contra a Covid. As regras preveem que alunos sem imunização não podem ser impedidos de frequentar a escola, mas que a documentação deve ser apresentada em até 60 dias —se o prazo não for respeitado, o Conselho Tutelar e as autoridades sanitárias serão acionadas.

O MP-SP declarou que deverá tomar "as medidas necessárias" para garantir a vacinação das crianças. Advogados indicam que possíveis sanções ainda devem ser debatidas, como multa a pais negacionistas e, em último caso, pode-se discutir até perda da guarda.

No Brasil, a vacinação infantil começou um mês após a autorização da aplicação da Pfizer em crianças de 5 a 11 anos pela Anvisa (Agência Nacional de Vigilância Sanitária), em 14 de janeiro. No dia 20, a CoronaVac também foi aprovada e começou a ser aplicada no público a partir de 6 anos.

Com isso, a exigência de comprovante de vacinação nas escolas tem causado polêmica. Pelo menos cinco estados já confirmaram que vão pedir comprovante de vacinação nas escolas. São Paulo optou por não restringir matrícula, mas estimular a imunização.

O prazo estabelecido pela secretaria se dá para que haja tempo hábil para pelo menos a iniciação do ciclo vacinal (primeira dose). Com a CoronaVac, o intervalo entre a primeira e a segunda dose é de 28 dias (quatro semanas) e com a Pfizer, 56 dias (oito semanas). Até então, são os dois únicos imunizantes para o público infantil.

Apesar de não ser impedimento para realização da matrícula, uma vez que fere o direito à educação, a escola, por lei, tem a obrigação de informar os órgãos responsáveis (Conselho Tutelar) da não apresentação do comprovante de vacinação para que as medidas cabíveis sejam tomadas."
Nota da Seduc

Segundo a pasta, a cobrança se dará ao final do primeiro bimestre e será publicada em forma de resolução no Diário Oficial "em breve".

A secretaria municipal da capital afirmou que a exigência de carteira de vacinação "já é prática no ato da matrícula e da rematrícula" e "a não apresentação do documento não impede que o estudante frequente a unidade escolar".

Nas particulares, a partir de julho

O UOL procurou 26 escolas particulares na Grande São Paulo para perguntar sobre o pedido do passaporte da vacina. A maioria afirmou que irá seguir as orientações das secretarias estadual e municipal e que terá práticas de incentivo à vacinação junto aos pais e alunos.

Nenhuma irá barrar matrícula de não vacinados. Para Benjamin Ribeiro, presidente do Sieeesp (Sindicato dos Estabelecimentos de Ensino no Estado de São Paulo), que representa as escolas, o impedimento só oneraria os alunos.

"Nossa opção é pela vacina, não tem outra saída, mas, obrigar, não temos como obrigar. Porque a criança não decide por ela, depende do responsável. Mas já estamos conversando bastante com pais e famílias. No final, quem mais se prejudica é a criança", afirma Ribeiro.

Segundo ele, no entanto, o sindicato deverá manter recomendação semelhante à da Seduc. "Vamos esperar até julho e pedir a carteirinha [de vacinação nas escolas particulares]. Quem não tiver [ciclo vacinal em dia, incluindo covid], informaremos e cabe aos órgãos responsáveis tomarem as medidas cabíveis", completa.

MP irá tomar "as medidas necessárias" para garantir a vacinação

A promotora de Justiça da Infância e Juventude do MP-SP, Luciana Bergamo, disse que deverá seguir a recomendação do procurador-geral de Justiça, Mario Sarrubbo, que indicou aos membros do Ministério Público que, "respeitada a independência funcional, empreendam as medidas necessárias para garantir a vacinação das crianças entre 5 e 11 anos de idade contra a covid-19".

"De acordo com a recomendação [de Sarrubbo], a imunização é obrigatória, considerando-se o disposto no § 1° do artigo 14 do ECA [Estatuto da Criança e do Adolescente], já que a vacina recebeu aval da autoridades sanitárias", informou o MP-SP, em comunicado publicado na última terça (25).

"A recomendação lembra ainda que artigo 249 do ECA estabelece que constitui infração administrativa 'descumprir, dolosa ou culposamente, os deveres inerentes ao poder familiar ou decorrente de tutela ou guarda, bem assim determinação da autoridade judiciária ou Conselho Tutelar', sujeita à pena de 'multa de três a vinte salários de referência, aplicando-se o dobro em caso de reincidência'", informa o texto.

Melhor conscientizar antes de punir, sugerem advogados

Advogados dizem que não há consenso entre as possíveis punições a pais que se recusarem a vacinar seus filhos, mas dizem que eles podem ser responsabilizados.

"Não existe nenhuma previsão à não vacinação. A partir de agora, o MP vai começar a atuar e vamos ver o que eles vão fazer. Pode ser imposta uma multa, por exemplo. Certamente são casos que vão acabar judicializados e devem parar até no STF [Supremo Tribunal Federal]", avalia a advogada Nina Ranieri, coordenadora da Cátedra Unesco de Educação da Faculdade de Direito da USP (Universidade de São Paulo).

Ela diz que não seria impossível, no entanto, um processo de perda da guarda em casos mais extremos. "Se for caracterizado abandono ou negligência...O que vai prevalecer, no fim, é o melhor estado da criança", afirma Ranieri.

O constitucionalista Flávio de Leão Bastos, professor da Universidade Presbiteriana Mackenzie, concorda, mas aponta que, antes, é preciso ter todo um processo de conversa e convencimento destes pais.

"É uma questão complexa, pois, além da saúde individual da criança, vacinação também é um assunto de saúde pública, ainda mais na atual situação, com uma variante tão agressiva [ômicron]", pontua o advogado. "Então, cabe à política pública estimular a vacinação e aplicar as possíveis sanções aos responsáveis."

"Antes de atitudes mais extremas, no entanto, acho que é preciso conversar com esses pais, tentar convencê-los. Mas o que falta desde o início da pandemia, infelizmente, é exatamente uma política pública nacional de estímulo à vacinação, para tentar conscientizar antes de penalizar", comenta Bastos.

A presidente do CNPG (Conselho Nacional de Procuradores Gerais), Ivana Cei, tem entendimento semelhante. Em nota técnica publicada na última quarta-feira (26), a procuradora recomenda que os MPs adotem inicialmente práticas extrajudiciais, mas, em caso de recusa, tomem as medidas necessárias.

O Ministério Público deve primar pela atuação na perspectiva resolutiva, prestigiando a intervenção na esfera extrajudicial e mantendo uma postura empática e não autoritária com relação a eventuais dúvidas de boa-fé dos pais ou responsáveis, sem prejuízo de, quando esgotadas as possibilidades de resolução consensual da situação, adotar as medidas cabíveis, inclusive judiciais, porque a vacina é um direito das crianças e um dever dos pais ou dos responsáveis, de modo que a omissão no cumprimento desse dever inerente ao poder familiar pode ensejar a responsabilização destes."
Ivana Cei, presidente do CNPG, em nota técnica