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Quem foi Getúlio Vargas, presidente que por mais tempo governou o Brasil

O presidente Getúlio Vargas, cujo nascimento completa 140 anos em abril de 2022 - Hulton Archive/Getty Images
O presidente Getúlio Vargas, cujo nascimento completa 140 anos em abril de 2022 Imagem: Hulton Archive/Getty Images

Murilo Matias

Colaboração para o UOL

19/04/2022 04h00

Quase um século após a presidência do governante que por mais tempo permaneceu no cargo no Brasil, ainda há muito para conhecer e compreender daqueles tempos.

Entre os tantos dissensos e contradições que acompanham a figura de Getúlio Vargas, há uma convergência: a influência para a história brasileira do político que saiu do interior do Rio Grande do Sul para o Palácio do Catete, da então capital Rio de Janeiro, tirando a própria vida quando ainda ocupava o principal posto da nação, em 24 de agosto de 1954.

O presidente que por mais tempo governou o país nascia há 140 anos, em 19 de abril de 1.882, na cidade de São Borja (cerca de 600 km de Porto Alegre). Sua trajetória combinou períodos de revolução, ditadura e eleição pelo voto direto para somar 19 anos no centro do poder, sintetizando em si a complexidade de uma sociedade cujos avanços e retrocessos muitas vezes caminham lado a lado.

"Pai dos pobres" e CLT

Aclamado como "o pai dos pobres" por suas políticas sociais, em especial a criação da CLT (Consolidação das Leis do Trabalho), voltada ao operariado, ou acusado pelo "mar de lamas", devido a denúncias de corrupção, passando por movimentos como queremismo e tenentismo, o "retrato do velho", conforme cantava o jingle em sua vitoriosa campanha pelo voto popular em 1950, tem, se não muitas caras, várias facetas.

"Podemos dividir a história do Brasil em AG e DG — antes e depois de Getúlio", escreve o jornalista Lira Neto, autor de uma trilogia sobre o ex-presidente. "O país era um e passou a ser outro com tudo de positivo e também de negativo durante esse processo de transformação da realidade nacional".

Responsável por articular a derrubada da República do Café com Leite, quando somente mineiros e paulistas dominavam o cenário político, Vargas chega à presidência por meio da Revolução de 1930, no que seria um governo provisório, apoiado essencialmente por militares de baixa patente (tenentismo), após perder a eleição um ano antes.

"Trabalhadores do Brasil"

Reconduzido por uma assembleia constituinte quatro anos mais tarde, introduz reformas fundamentais no campo democrático, a exemplo do voto feminino e o sufrágio secreto, inaugurando uma nova forma de relação do presidente com o povo.

"Ele mudou a forma como os presidentes e as autoridades lidavam com o público. Antes, os presidentes falavam 'meus senhores', e ele começou 'trabalhadores do Brasil', alterando a interlocução do chefe com a sociedade", comenta a cientista política Maria D'Araujo no documentário "Getúlio: a construção do mito".

O progresso no terreno da participação popular, entretanto, seria rapidamente solapado por decisões que cassaram os partidos políticos, impuseram a censura, o fechamento do Congresso e a ameaça a adversários no período que ficaria conhecido como Estado Novo ou ditadura Vargas, entre 1937 e 1945, instituído sob o argumento de que o país estaria ameaçado por uma conspiração de comunistas e judeus, o chamado Plano Cohen.

"Vargas ascende ao poder num mundo dominado por ditaduras. Salazar em Portugal, Franco na Espanha, Mussolini na Itália, Hitler na Alemanha", relata o historiador Francisco Teixeira, da UFRJ (Universidade Federal do Rio de Janeiro).

"No Brasil, a repressão era real, sobretudo a partir da instituição da Lei de Segurança Nacional e do Tribunal de Segurança Nacional, por onde passaram mais de 30 mil pessoas, presas e torturadas sem nenhum direito à defesa. Era uma repressão de massa", afirma o pesquisador.

Tentativa de "branqueamento"

Pouco após o fechamento de regime, o Brasil enviaria tropas para lutar na 2ª Guerra Mundial junto aos aliados, contra os nazistas e fascistas, depois de manter relações com os extremistas, conforme denota o episódio envolvendo a deportação de Olga Benário à Alemanha, em 1936, cumprindo decisão do STF. Do ponto de vista econômico foi a oportunidade para criar empresas públicas como a Vale do Rio Doce e a Companhia Siderúrgica Nacional, fomentando a industrialização baseada na valorização das riquezas nacionais a partir da noção de que tais recursos deveriam servir a um projeto nacional de desenvolvimento.

Se as cidades alcançavam novos patamares e seus trabalhadores alçavam direitos de férias remuneradas, 13º salário e o fim do trabalho infantil, no interior, a estrutura fundiária permaneceria excludente e determinada por oligarquias. Ao mesmo tempo, do ponto de vista da configuração social, verificava-se uma tentativa de branqueamento do país, evidenciada por diretrizes migratórias que privilegiavam a entrada de europeus, junto da falsa premissa da igualdade racial.

"Ninguém mais no Brasil se intitulava como negro: várias cores foram sugeridas para substituir a cor negra; prova disso foi o resultado de uma pesquisa realizada pelo IBGE no período, que resultou em 136 cores de pele diferentes", indica a antropóloga Lilian Schwacz.

O fim da 2ª Guerra, em 1945, empurraria também para o desaguadouro dos 15 primeiros anos da administração Vargas, retirado do posto por militares pouco depois de convocar eleições e colocar novamente na legalidade os partidos políticos. Mas, não demoraria para que o líder retornasse à presidência.

Quatro anos mais tarde, eleito pela população, estrearia sua gestão em uma fase democrática, que terminaria com seu suicídio, não sem antes reforçar seu ideário nacionalista através da criação da Petrobras, do Banco do Nordeste e do BNDES (Banco Nacional de Desenvolvimento) e assentando as bases para a instalação da Eletrobras.

Acossado por uma poderosa oposição interna e externa, Vargas viveria o auge da crise de seu mandato em virtude do atentado contra o adversário Carlos Lacerda, no qual morreu um militar. Gregório Fortunato, guarda pessoal do presidente, foi acusado de promover o ato. Pressionado a deixar o cargo, Vargas encerrou a própria vida, provocando grande comoção.

"Cada vez na nossa vida, hoje, quando uma carteira profissional é assinada, quando se paga o aumento do salário mínimo, isso faz parte do legado", indica o biógrafo José Augusto Ribeiro. "A vida física terminou em 1954, mas a vida política continuou sob a forma desse legado", ele resume.

Quase um século e meio após seu nascimento, as idas e vindas do período getulista provavelmente precisarão ainda de mais tempo para serem completamente compreendidas, se é que um dia o serão.

Para auxiliar nessa empreitada, alguns livros se apresentam na perspectiva de conhecer a complexidade daquela era. Confira as sugestões:

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Getúlio Vargas, meu pai - Alzira Vargas do Amaral Peixoto

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Getúlio Vargas, meu pai - Alzira Vargas do Amaral Peixoto - Divulgação - Divulgação
Imagem: Divulgação

A obra escrita pela filha de Vargas narra a vida do político gaúcho entre 1923 e 1937. Publicada originalmente em 1960, episódios como a morte de Getulinho, irmão mais novo de Alzira, o rompimento do Brasil com o Eixo e o grave acidente de automóvel sofrido por Vargas em 1942 são detalhados pela autora, considerada uma confidente do ex-presidente. Editora Objetiva.

Getúlio 1 (1882-1930) - Lira Neto

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Getúlio 1 (1882-1930) - Lira Neto - Divulgação - Divulgação
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A obra traz o primeiro volume da trilogia escrita pelo autor acerca do que define como o principal homem público da historia brasileira. Abarcando o período antes da chegada ao poder e suas articulações para tornar-se presidente em 1930, as páginas ajudam a entender as bases de sua formação e atuação política, baseando-se em farta documentação e ampla pesquisa junto a diversas fontes. Editora Companhia das Letras.

Getúlio Vargas - Boris Fausto

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Getúlio Vargas - Boris Fausto - Divulgação - Divulgação
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Como um ditador simpático ao fascismo se torna um líder de massas cultuado por setores da esquerda? Como um homem do campo presidiu o país durante sua fase de industrialização mais acelerada? Partindo desses e outros questionamentos, o autor apresenta sua investigação sobre o fenômeno Getúlio Vargas e seu legado em diferentes esferas da vida nacional. Editora Companhia das Letras.

Diário - volume 1 - Getúlio Vargas

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Diário - volume 1 - Getúlio Vargas - Divulgação - Divulgação
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O livro é uma oportunidade aos que desejam tomar contato direto da fonte, a partir dos relatos escritos pelo próprio Vargas em seu diário durante os seus seis primeiros anos de governo, de 1930 a 1936. As anotações permitem entender a maneira como a realidade brasileira era percebida pelo então presidente, que se tornaria o mais longevo governante a ocupar cargo. Editora FGV.

Memórias do Cárcere - Graciliano Ramos

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Memórias do Cárcere - Graciliano Ramos - Divulgação - Divulgação
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Um dos maiores clássicos da literatura brasileira tem relação direta com o período mais agudo de repressão do governo Vargas. O livro narra, ao longo de 686 páginas, as agruras vividas pelo autor alagoano, preso pelo regime de então devido a sua atuação política e jornalística, sem qualquer acusação formal, tendo passado por prisões em Recife e no Rio de Janeiro durante quase um ano. Editora Record.

Operação Brasil: o ataque alemão que mudou o curso da Segunda Guerra Mundial - Durval Lourenço Pereira

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Operação Brasil: o ataque alemão que mudou o curso da Segunda Guerra Mundial - Durval Lourenço Pereira - Divulgação - Divulgação
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O fim da 2ª Guerra, em 1945, influenciaria o término dos primeiros 15 anos consecutivos nos quais Vargas permaneceu no poder. A obra repercute um dos momentos mais decisivos protagonizados pelo presidente ao contextualizar o ingresso do Brasil no conflito, em agosto de 1942, ao lado dos aliados, depois de uma ofensiva nazista contra navios mercantes e de passageiros brasileiros no litoral do nordeste, provocando a morte de civis. Editora Contexto.

Getúlio - Juremir Machado da Silva

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Getúlio - Juremir Machado da Silva - Divulgação - Divulgação
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A obra construiu-se a partir de extensa pesquisa realizada pelo autor e jornalista, que entrevistou 73 pessoas direta ou indiretamente tocadas pela morte de Vargas e leu 150 livros sobre o político ao longo de três anos de trabalho. A partir dos relatos e da investigação, o livro expõe, através de diferentes circunstâncias, os comportamentos do protagonista tanto na intimidade como no poder. Editora Best Seller.

Governo Vargas: um projeto de nação - André Barbosa Fraga e Mayra Coan Lago

Preço: de R$ 59 por R$ 16,86* (desconto de 71%)

Governo Vargas: um projeto de nação - André Barbosa Fraga e Mayra Coan Lago - Divulgação - Divulgação
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O volume destrincha as transformações políticas, econômicas, sociais e culturais vivenciadas durante os períodos de permanência de Vargas na presidência. Dessa forma, a edição contextualiza as fases dos governos provisório (1930-1934), constitucional (1934-1937), ditatorial (1937-1945) e democrático (1951-1954) ao reunir trabalhos de diversos pesquisadores, ampliando as reflexões sobre tais momentos.

* Os preços e a lista foram checados no dia 18 de abril de 2022 para atualizar esta matéria. Pode ser que eles variem com o tempo.

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