Denúncias de ameaças a escolas caem no país, mas média ainda é de 6 por dia
O Brasil apresenta queda brusca no registro de denúncias de ameaças e ataques contra escolas feitas em um canal criado pelo governo federal em abril. Entretanto, o número ainda é considerado alto por especialistas, com média de 6 casos por dia em outubro.
O que aconteceu
Foram 30.914 denúncias do dia 6 de abril a 29 de outubro. Esse número se refere a comunicações com dados duplicados — quando várias pessoas reportam o mesmo link com uma ameaça ou conteúdo violento. Nesse mesmo período, foram 9.611 denúncias únicas. Os dados são do Ministério da Justiça e foram obtidos pelo UOL via LAI (Lei de Acesso à Informação).
Em outubro, foram 66 denúncias únicas e 191 duplicadas. O número ainda é alto, embora tenha ocorrido uma redução expressiva de maio em diante, segundo Telma Vinha, pesquisadora da Unicamp que estuda violência nas escolas.
"Vamos supor que 10% disso realmente estivesse caminhando [para cometer um ataque]. É muito", comenta a pesquisadora. "Ao mesmo tempo, é necessário cuidado antes de fazer uma denúncia, não sei quantos desses registros não têm um medo, que é justificável, por trás. As escolas deveriam trabalhar mais nesse sentido de cautela, conversar com a família, porque às vezes é um jovem que não tem outra maneira de manifestar que está sofrendo."
Canal para denúncias foi anunciado após ataque com mortes a uma creche em Blumenau (SC). Em 5 de abril, um homem de 25 anos matou quatro crianças e feriu outras cinco com uma machadinha. No dia seguinte, o governo lançou a Operação Escola Segura, com ações para coibir ataques. O canal é uma parceria do Ministério da Justiça com a SaferNet Brasil, ONG que atua na promoção e defesa dos direitos humanos na internet.
Mês de abril foi o que registrou o maior número de denúncias. Foram 29.473 duplicadas e 8.660 únicas em 25 dias. Naquele mês, além do ataque em Blumenau, publicações circularam nas redes sociais anunciando novos ataques no dia 20, data em que ocorreu o massacre numa escola de Columbine (EUA) em 1999. Escolas e creches amanheceram vazias, mas não houve registro de incidentes naquele dia. No fim de março, um ataque numa escola de São Paulo deixou uma professora morta e cinco feridos.
Desde o ano passado estávamos acompanhando um aumento exponencial de postagens relacionados a isso, e não se tinha um lugar para denunciar. Quando o governo cria o canal, você tem represada uma série de perfis que eram muito evidentes. Não existia medo de expor, isso era aberto. Logo depois, várias ameaças começaram a circular, foram plantadas para causar pânico. Isso tudo foi denunciado.
Telma Vinha, pesquisadora da Unicamp
O canal pode ser acessado aqui e as denúncias são anônimas. No campo "página da internet" deve-se informar o link da postagem e é recomendado o preenchimento do campo "comentário", com informações como o município, estado e nome da escola em que ocorre a denúncia, além da mídia social de origem da ocorrência. Qualquer pessoa pode enviar informações no canal, e elas são mantidas em sigilo.
A SaferNet é responsável pela tecnologia de filtragem, e uma equipe do ministério analisa o conteúdo das denúncias. Se identificado potencial risco a alguma escola, as forças de segurança são informadas para adotar as medidas necessárias. Em casos de emergências, a orientação é entrar em contato com o 190 ou a delegacia mais próxima.
Operação evitou ataque em Santa Catarina, diz ministro da Justiça e Segurança Pública. No dia 7 de novembro, Flávio Dino declarou que a Operação Escola Segura agiu para evitar um atentado com uso de armas brancas. Segundo ele, a operação foi possível em razão de relatório enviado pelo Ciberlab (Laboratório de Operações Cibernéticas) do ministério, "com informações oriundas de redes sociais". Desde o início da operação, foram 400 prisões e apreensões de menores, informa o governo Lula.
Redes sociais lideram ranking de links denunciados
O X (antigo Twitter) teve 3.887 links denunciados. Na sequência, aparecem Instagram (2.658) e TikTok (696).
O Twitter foi comprado pelo bilionário Elon Musk em outubro do ano passado e desde então tem sido alvo de críticas pelas mudanças nas regras de moderação de conteúdo. Elas se tornaram cada vez mais permissivas em relação a conteúdos extremistas, desde a troca de comando na direção da companhia.
Infelizmente, esse conteúdo violento ocupa um espaço relevante nas mídias mainstream.
Thiago Tavares, presidente da SaferNet
Aquele que era conteúdo de nicho hoje é facilmente encontrado em plataformas comerciais, e existem algumas razões para isso. Grupos extremistas procuram recrutar, radicalizar e cooptar jovens para ataques e, para conseguirem êxito, precisam falar com uma audiência mais ampla. E essa audiência não está na deep web, está nas redes sociais.
Thiago Tavares
Empresas donas das redes sociais precisam ficar atentas para detectar e moderar esses conteúdos, diz especialista. Tavares destaca que tem sido cada vez mais comum que as ameaças sejam postadas nessas redes — o ataque ocorrido numa escola de São Paulo em outubro foi anunciado na véspera, diz. Reportagem do UOL mostrou que postagens sobre o atirador continuavam sendo disseminadas nas plataformas dias após o ato.
X e Meta não comentam sobre denúncias. Procurado pela reportagem, o X respondeu aos questionamentos enviados com um e-mail automático, em inglês, com os dizeres "ocupado agora, volte mais tarde". A Meta, responsável pelo Instagram, informou que não iria comentar. Já o TikTok disse que suas diretrizes deixam claro que conteúdos com discursos de ódio não são permitidos e que estabelece parceria com especialistas em segurança para se manter em dia com o que chamou de "desafios complexos".
Quando um conteúdo é identificado como uma potencial violação, ele pode ser removido por meio da tecnologia ou marcado para análise adicional por nossa equipe de moderação. Trabalhamos para sempre evoluir nossa abordagem em moderação de conteúdo.
TikTok, em nota
Ministério da Justiça informa que ações não têm prazo para determinar. Já o MEC (Ministério da Educação) afirmou que o titular da pasta, Camilo Santana, recebeu no fim de outubro o grupo de trabalho interministerial criado para desenvolver estratégias de prevenção e enfrentamento da violência nas escolas e que um relatório desenvolvido será apresentado à sociedade "em data a ser divulgada em breve".
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