Estados com bolsa diminuem evasão escolar; programa de Lula começa em 2024
A proposta do governo Lula de pagar uma bolsa para alunos de ensino médio é uma estratégia já usada por estados brasileiros para reduzir a evasão escolar. Especialistas ouvidos pelo UOL afirmam, entretanto, que a medida sozinha não resolve o problema.
O que aconteceu
Ao menos seis estados têm programas de bolsa no ensino médio, segundo levantamento do UOL: Alagoas, Bahia, Goiás, Rio Grande do Sul, Santa Catarina e Tocantins. Os demais estados não responderam, disseram não ter esse tipo de programa ou ainda estudam implementá-lo.
Meio milhão de jovens acima de 16 anos abandonam a escola a cada ano. É o que concluiu uma pesquisa publicada este ano pela Firjan/Sesi em parceria com o PNUD (Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento). Só 46% dos alunos mais pobres concluem o ensino médio, segundo o levantamento.
A necessidade de trabalhar é a principal justificativa citada por jovens para abandonar a escola. Segundo o IBGE, 9,5 milhões de jovens de 14 a 29 anos não completaram o ensino médio, seja por terem abandonado a escola antes do término desta etapa ou por nunca a terem frequentado. O trabalho é apontado como o principal motivo por 40,2% deles.
Resultados nos estados
Em Alagoas, 30 mil alunos que deixaram a escola na pandemia voltaram após benefício começar a ser pago. O Estado paga R$ 100 mensais a alunos do ensino médio regular e R$ 150 para os do ensino integral. Estudantes do último ano recebem, de uma só vez, o valor de R$ 2.000 quando concluem o ano letivo. É preciso ter frequência escolar superior a 90%.
Goiás reduziu a evasão em 51%. Em 2021, ano em que o benefício começou a ser pago, a taxa de evasão era de 18,5%. No ano seguinte, caiu para 9%. "Quando essa bolsa é vinculada a aprendizagem e frequência, vai funcionar. Acho que a grande sacada foi colocar o pagamento mensal. Um relatório da empresa que administra o cartão dessa bolsa mostra que 78,1% dos alunos gastam com alimentação. Quem tem fome, tem pressa", diz Fátima Gavioli, secretária de Educação de Goiás
A relação entre evasão e vulnerabilidade socioeconômica já foi comprovada em pesquisas. "No estudo que a gente fez com dados de 2020 da PNAD [Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios], verificamos que 91% das crianças e adolescentes de 6 a 17 anos que estavam fora da escola viviam em famílias com renda per capita de até um salário mínimo", diz Romualdo Portela de Oliveira, diretor de pesquisa e avaliação do Cenpec, ONG da área de educação.
Bolsas sozinhas não são a solução. Na avaliação dos especialistas, é necessário uma combinação de ações para engajar os alunos. "Não existe política que seja bala de prata, é uma política adicional. Acho que tem uma discussão legal sobre o novo ensino médio, com idas e vindas, o que é natural, de se tornar mais atrativo", diz o pesquisador Vladimir Ponczek. O modelo será discutido novamente pelo Congresso.
Qual é a proposta do governo Lula?
Uma MP (Medida Provisória) instituindo o programa já foi publicada, mas ainda não há informações sobre valores. Há expectativa de que um depósito seja feito em conta no nome do aluno ao final das séries para ser sacado somente na formatura, mas cálculos estão sendo feitos para que também seja recebido um valor mensal que varia de R$ 100 a R$ 300. O texto passa a valer imediatamente, mas para virar lei deve passar pelo Congresso. Os valores aventados para o custo anual do programa ficam entre R$ 6 bilhões e R$ 7 bilhões.
O benefício será para alunos do ensino médio de escolas públicas com famílias inscritas no Cadastro Único. São cerca de 2,4 milhões de estudantes, segundo o relator do projeto na Câmara, Pedro Uczai (PT-SC). O MEC (Ministério da Educação) será o responsável por estipular as condições para o recebimento — frequência, aprovação, participação em exames e no Enem serão levados em conta.
Beneficiados pelo Bolsa Família ou BPC não terão direito às bolsas, segundo o deputado. O programa já paga, no mínimo, R$ 600 por família, além de um valor extra para jovens de até 18 anos, sob a condição de que as famílias garantam a manutenção da frequência escolar. Questionado se alunos que já recebem as bolsas concedidas pelos estados também terão direito ao benefício, o MEC informou que o desenho do programa será detalhado pela pasta e pela Fazenda, sem especificar quando isso ocorrerá.
Programa tem bom custo-benefício, diz especialista. Um estudo do Insper de 2020 mostra que o país perde R$ 220 bilhões por ano, o equivalente a 3,3% do PIB, pelo fato de jovens não concluírem a educação básica.
Em geral, quando a gente coloca na ponta do lápis, um programa desse parece ter bastante custo efetivo. É bastante sentido, e os benefícios passam os custos em algumas vezes. Mas os detalhes são fundamentais, então, dependendo exatamente de como é o desenho, ele pode ter implicações bem diferentes.
Vitor Pereira, professor da Enap (Escola Nacional de Administração Pública)