Como Santo Antônio fez parte do Exército brasileiro séculos após morrer
Hoje em dia, qualquer pessoa reconhece Santo Antônio como o "santo casamenteiro". No entanto, o monge franciscano tem uma tradição militar muito mais antiga, e chegou até o posto de tenente-coronel do Exército brasileiro séculos após sua morte, que ocorreu em 1231.
Santo Antônio e a tradição militar brasileira
No Brasil, Santo Antônio virou militar muito antes da Independência. Em 1595, na guerra contra os franceses na Bahia, o santo foi apontado como o responsável pela vitória do exército, que ainda era português à época. Com isso, Santo Antônio foi incorporado como soldado raso, sentando praça no Regimento de Lagos, no reinado de Afonso 6º.
Santo esteve ligado também às invasões holandesas e Palmares. Na época dos conflitos, durante o século 17, Santo Antônio foi nomeado tenente da Fortaleza do Buraco, no atual estado de Pernambuco. Já no século 18, o franciscano chegou ao posto de capitão, motivado pela vitória nas tentativas de invasão francesas ao Brasil.
Carreira militar de Santo Antônio se espalhou pelo Brasil. Em 1767, o governo de São Paulo concedeu ao santo a patente de coronel das Tropas Auxiliares e Milícias (organização militar de origem portuguesa) da Capitania. Em 14 de julho de 1810, D. João 6º concedeu ao santo a promoção a sargento-mor. Posteriormente, em 26 de julho de 1814, ele foi elevado ao posto de tenente-coronel e mais tarde recebeu o grão-colar da Ordem de Cristo como condecoração.
Sendo-me presente a viva devoção do povo do Rio de Janeiro para o glorioso Santo Antônio, que moveu um dos meus augustos predecessores a dar ao mesmo Santo, em 1711, o posto de capitão [...], depois do feliz assalto em que os habitantes da Cidade resistiram ao ataque dos franceses e tendo o céu abençoado os meus esforços para salvar a monarquia da grande e difícil crise a que se tem achado exposta, esperando ainda maior auxílio para sua final e inteira restauração, para que muito há de concorrer, como devo piamente esperar, a intercessão do mesmo glorioso Santo a quem tenho particular devoção: Hei por bem que se eleve-o ao posto de sargento-mor de infantaria desta Capitania e que pela Tesouraria se lhe fique pagando o competente soldo.
D. João 6º em decreto real de 1810
Com a promoção dada pelo rei, o santo começou a receber um "salário". O soldo (remuneração básica de cada patente) foi pago à Igreja até abril de 1911. Em 1923, o Ministro da Guerra solicitou a opinião do Consultor-Geral da República sobre a necessidade de atender ao pedido de um guardião de um Convento no Rio de Janeiro, que desejava receber o soldo destinado a Santo Antônio. O local leva o nome do franciscano.
O Gabinete deu um parecer contrário à solicitação. Rodrigo Octavio, o então consultor-geral, afirmou que não havia um titular do direito adquirido para que se pudesse aprovar a retomada dos pagamentos.
Essa capacidade jurídica, essa qualidade de pessoa, não pode ser encontrada quer no Santo, impessoalmente, quer na sua imagem existente no Convento desta Cidade, argumentou o consultor-geral.
Santo Antônio permaneceu nas Forças Armadas até 1924. Neste ano, um decreto emitido pelo presidente da República, Artur Bernardes, e pelo Ministro da Guerra, transferiu o santo para a reserva militar.
Santo Antônio e o militarismo pelo mundo
Não é só no Brasil que Santo Antônio é padroeiro militar. O primeiro registro da relação de Santo Antônio com organizações militares em Portugal foi em 1668. Dom Pedro 2º ("o Pacífico") ordenou que o santo fosse recrutado e ingressasse como soldado raso no 2º Regimento de Infantaria em Lagos, sendo promovido posteriormente a capitão e coronel.
Em 1810, o santo chega à patente de general. A promoção ocorreu durante as Guerras Napoleônicas, especificamente na Batalha do Buçaco, quando, acompanhados da imagem do santo, os portugueses venceram o general Masséna.
Santo Antônio também "lutou" na Guerra Peninsular. O conflito entre o império francês e a aliança entre Reino Unido, Portugal e Espanha rendeu ao santo o posto de tenente-coronel, com sua imagem sendo levada nos combates pelo Regimento de Infantaria N.º 19 em Cascais (município litorâneo português).
O santo tem ligação militar também em Timor-Leste, outra ex-colônia portuguesa. Na cidade de Manatuto, de onde é padroeiro, há uma imagem do franciscano, na qual ele é chamado de "coronel Santo Antônio".
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