Ela foi à escola pela 1ª vez aos 85 anos e agora entrou na faculdade


Luciana Spacca
Colaboração para o UOL
29/03/2025 05h30
Iolanda Conti, 91, pisou pela primeira vez em uma sala de aula aos 85 anos de idade. Ela sempre teve o sonho de aprender a ler e escrever, mas, até então, nunca havia tido a oportunidade.
Nunca tinha entrado em uma sala de aula, não sabia o que era uma lousa, não sabia nada. Eu só tinha visto os meus filhos estudando no caderno.
Iolanda Conti
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Iolanda é natural de Piranguçu, cidade do interior de Minas Gerais. Ela foi para São Paulo aos 11 anos de idade. Na capital paulista, se casou e teve três filhos.
Para ajudar na economia da casa, passou a vida trabalhando nas mais diferentes funções: foi babá, faxineira, cozinheira e ajudante de padaria. Com o trabalho, acabou deixando os estudos de lado.
A ideia de finalmente matricular Iolanda na escola surgiu da filha dela, a fisioterapeuta Vera Lúcia Ribeiro Conti, 51. Em 2018, ela inscreveu a mãe em um programa da EJA (Educação de Jovens e Adultos), do governo federal, destinado a pessoas que nunca tiveram acesso à educação na idade apropriada.
"Um dia, nós estávamos passando por uma escola fundamental do bairro e vi a placa. Estava escrito: temos vaga para todas as idades, adultos, jovens e até idosos. Entramos e inscrevi a minha mãe na mesma hora", lembra Vera.
No fim de 2024, Iolanda recebeu o diploma do ensino médio e, junto com a formatura, veio a surpresa: um convite para cursar nutrição em uma faculdade em Guarulhos, cidade em que mora com a filha atualmente.
"Ela ganhou uma bolsa de 100%, para os quatro anos de curso. Nós fomos na faculdade conversar numa terça-feira depois do Carnaval, e na quinta ela já estava na sala de aula", explica a filha de Iolanda.
Sonho de ser enfermeira
Iolanda revela que, na verdade, sempre quis ser enfermeira.
"Desde criança, eu tinha o sonho de ser enfermeira para cuidar das pessoas, mas como eu não tive estudo antes, sei que agora não é mais possível. Mesmo assim, eu gosto muito de comida, de cozinhar, de utilizar bem todos os alimentos. Uso muito a casca das frutas e legumes nas minhas receitas. Então fazer nutrição também me deixa muito feliz", conta.
Eu gosto de comer bem. Não é comer muito, mas comer bem. Arroz, feijão, uma carne, bastantes legumes, abobrinha, chuchu, ovo. Um prato bem colorido. Não cheguei a essa idade à toa, né?
Iolanda Conti
A faculdade fez algumas adaptações para que Iolanda possa acompanhar todas as aulas, que são tanto presenciais quanto a distância. Os professores, por exemplo, utilizam caixa de amplificação e microfone durante as aulas para que ela ouça tudo o que está sendo falado sem problemas. Nos dias de prova, ela também terá uma tutora que a acompanhará caso ela apresente alguma dificuldade.
Mesmo assim, a filha de Iolanda tem acompanhado a mãe nos primeiros dias de aula na faculdade. "Ela é muito participativa durante as aulas. Ela é a aluna mais velha da sala e todo mundo gosta muito dela. Sempre param para ouvir quando ela está falando", diz Vera.
Eu não falo que sou uma aluna velha porque velho é trapo, é pano velho. Minha mãe sempre dizia isso. Então eu falo que sou experiente. Eu sou uma caloura veterana. E estou bem conservada!
Iolanda Conti
Expectativas para o futuro
Para o futuro, Iolanda afirma que quer terminar os quatro anos de curso e continuar adquirindo conhecimento. "Não quero perder nenhuma aula. Se não tiver como ir de carro ou ônibus, eu vou até a pé se precisar", diz.
Eu tenho muita vontade de viver. E acredito sim que vou pegar o meu diploma com 95 anos. Tudo o que Deus tiver preparado para mim daqui para a frente tenho certeza que será maravilhoso.
Iolanda Conti
A filha de Iolanda também criou uma conta para a mãe no Instagram, onde ela pretende compartilhar o dia a dia e as curiosidades de uma universitária de mais de 90 anos.
"Quando eu matriculei a minha mãe na escola, foi porque eu queria animá-la, ela andava muito triste. Mas foi a força de vontade dela que a trouxe até aqui. Ela é um exemplo de que nada é impossível, que a idade não é um limitador, e queremos mostrar isso para as pessoas. No que depender de mim, tudo o que eu puder fazer para ajudá-la, eu vou fazer", diz Vera.