Topo

Matas ciliares

Vista aérea de área de preservação permanente com enorme parte desmatada em Nova Ubiratã, região médio-norte de Mato Grosso - Fernando Donasci/Folhapress
Vista aérea de área de preservação permanente com enorme parte desmatada em Nova Ubiratã, região médio-norte de Mato Grosso Imagem: Fernando Donasci/Folhapress
Lucila Cano

27/02/2015 06h00

O desequilíbrio ambiental que assusta o Brasil e que, como tudo indica, não nos dará trégua no curto prazo, não resulta apenas da falta de obras estruturais, mas também do descaso com a Natureza. As inundações que ano a ano se intensificam na Região Norte e a escassez de água que está se tornando rotina nas Regiões Sudeste e Centro-Oeste são consequências da mesma causa: o desmatamento.

Há anos os estudiosos do meio ambiente alertam governos e populações para danos muitas vezes irreversíveis em decorrência do acelerado processo de desmatamento.

As medidas de proteção ambiental são insuficientes para a realidade que nos bate à porta. Elas precisam ser intensificadas com urgência e, para isso, dependem, inclusive, de cada um de nós.

O desmatamento ocorre em todas as frentes, no campo e na cidade. Os pastos que substituem as florestas são uma ameaça, mas não a única. O cimento que cobre as praças urbanas e os quintais das casas que aboliram as hortas e os jardins igualmente sufoca o solo e impede a absorção da água das chuvas.

Minha avó costumava dizer que a precisão é o que nos move. Sábias palavras as dela, pois todo dia me deparo com mais e mais notícias sobre o que fazer para preservar as áreas de proteção ambiental. Estamos acordando para a importância das matas ciliares. Resta fazer do seu replantio e proteção uma prática permanente.

Telas protetoras

Muitos não entenderam a razão de tantos debates em torno da aprovação do novo Código Florestal Brasileiro. A discussão sobre a metragem de mata que deveria ser preservada nas margens dos leitos de água sensibilizou pouca gente.

Urge reflorestar as terras ribeirinhas. Inundações avançam com os efeitos da erosão nas margens dos rios. No outro extremo, são as nascentes sepultadas pelo lixo que dependem da mata ciliar para respirar e verter água.

O sugestivo nome de mata ciliar vem de uma comparação com os cílios que protegem nossos olhos. A plantação nativa ao longo de rios, igarapés, lagos, nascentes e represas tem a mesma função protetora. E, como tudo na Natureza tem uma razão de ser, a mata deve ser nativa, de plantas da região, naturalmente adaptadas à sua função de equilíbrio do solo.

São essas plantas que possuem raízes adequadas, aéreas, que se agarram às margens, como se fossem telas protetoras. São elas também que cobrem as áreas próximas com suas folhas, como uma forração, um tapete que impede que a poluição chegue às fontes de água. Em outras palavras, é essa forragem que mantém garrafas, latas e lixo a uma distância providencial da água.

Segundo o Código Florestal, a mata ciliar é uma área de proteção permanente, o que equivale a dizer uma área protegida, coberta por vegetação nativa, com a função ambiental de preservar os recursos hídricos, a estabilidade do solo e a biodiversidade para assegurar o bem-estar das populações humanas.

Mudança de rumo

Dificilmente conseguiremos conter os estragos ambientais e reverter parte dos danos já sentidos pelas populações humanas se não mudarmos o padrão de conduta. Em vez do bem-estar aludido pelo código, viveremos tragédias nunca antes imaginadas neste país.

Derrubar árvores, provocar queimadas para o avanço das pastagens, lotear áreas de mananciais para assentar famílias sem teto, despejar lixo em córregos e rios, erguer praças e jardins de concreto são alguns dos crimes ambientais que o homem comete contra a sua própria espécie.

A Natureza nos legou lições simples de aprender e de colocar em prática. A genialidade humana, por sua vez, desenvolve e aperfeiçoa conhecimento e tecnologias sem cessar.

Não há mais lugar para o desmatamento como desculpa para o progresso e crescimento econômico. Insistir nos erros cometidos até agora é prova de arrogância e ignorância. Cabe ao grande vilão da história fazer uma mudança de rumo. Ele tem plenos poderes para dar um final feliz a ela.

* Homenagem a Engel Paschoal (7/11/1945 a 31/3/2010), jornalista e escritor, criador desta coluna.