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Sem aula há 5 meses, aluno do Maranhão tenta estudar com vídeo pelo celular

Com acesso restrito à internet, Diêgo procura continuar estudando por conta com o celular - Arquivo pessoal
Com acesso restrito à internet, Diêgo procura continuar estudando por conta com o celular Imagem: Arquivo pessoal

Ana Carla Bermúdez

Do UOL, em São Paulo

22/08/2020 04h00

Calouro do curso de Letras-Inglês na UEMA (Universidade Estadual do Maranhão), Diêgo Aguiar Cardoso, 20, não chegou a ter mais do que duas semanas de aula na universidade, em março, antes da suspensão das atividades devido à pandemia do coronavírus.

"Desde então, não teve mais nada", conta o estudante, que diz que nenhum tipo de atividade acadêmica remota foi oferecida pela universidade nos últimos cinco meses.

Morador da zona rural de Aldeias Altas, a cerca de 390 km da capital São Luís, ele tem se esforçado para continuar estudando por conta própria, apesar do acesso limitado à internet. No interior, segundo ele, a conectividade via satélite costuma apresentar instabilidade com frequência. "Um problema é quando falta energia, aí não tem internet. E muitas vezes ela fica ruim o dia inteiro", afirma Diêgo.

Sem computador, ele procura continuar estudando apenas com o celular. "O que eu faço mais é ver aulas no YouTube, que eu vou pesquisando, principalmente de inglês", conta. "Assisto várias videoaulas, baixo músicas em inglês e procuro a tradução delas. Isso ajuda muito. Também assisto séries e filmes em inglês."

Sem atividade escolar em julho

Diêgo conta que tinha esperanças de que as aulas voltassem, mesmo que de forma remota, no mês de junho —o que não aconteceu. Apesar da falta de atividades, ele também não teve férias em julho, como tradicionalmente acontece no calendário escolar do Brasil. Ao longo de todos esses meses sem aula, o jovem conta que ficou estudando por conta própria.

Uma pesquisa divulgada na quinta-feira (20) pelo IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística) aponta que 8,7 milhões de estudantes brasileiros de 6 a 29 anos não tiveram nenhum tipo de atividade escolar no mês de julho. O número representa um a cada cinco alunos (19,1%) dessa faixa etária no país.

Os dados mostram que o Nordeste foi a segunda região com pior índice de falta de atividades escolares em julho (26,3%), atrás apenas da região Norte (41,6%). Considerando apenas os estudantes do ensino superior, um em cada três alunos do Nordeste (29,9%) não teve atividades nem estava de férias em julho.

A pesquisa revelou ainda que apenas 8,9% dos estudantes brasileiros disseram estar de férias no mês de julho, dado que evidencia as modificações que tiveram de ser realizadas no calendário escolar devido à pandemia.

Na UEMA, havia previsão de retomada do primeiro semestre letivo de 2020, de forma remota, no dia 24 de agosto. Para isso, a instituição criou um programa de auxílio emergencial de inclusão digital e contratou uma empresa de telefonia móvel para o fornecimento de até 5 mil chips com pacotes de dados para alunos mais vulneráveis.

Mas, segundo a universidade informou em nota publicada em seu site, houve atraso por parte da empresa contratada na entrega dos chips, e o retorno foi adiado para o dia 9 de setembro.

Opção pelo ensino remoto

Procurada pelo UOL, a UEMA afirmou, em nota, que fez duas consultas sobre as "condições tecnológicas" de professores e alunos dos cursos presenciais e também ofereceu formação aos profissionais para o ensino remoto.

Entre 29 de junho e 31 de julho, houve um "período especial" de experiência com o ensino a distância, mas a participação foi facultativa. "Foram ofertadas 265 disciplinas", diz a universidade.

Depois disso, a UEMA decidiu pela retomada de todos os cursos de graduação de forma remota. "Todas as informações sobre as ações da Uema, antes e durante todo o período da pandemia, são amplamente divulgadas em seus canais digitais de comunicação."

A universidade não explicou, entretanto, por que alunos como Diêgo não tiveram atividades formais durante cinco meses.

O cenário da UEMA — que é estadual — é semelhante à situação em que se encontram as universidades e institutos federais do país. Levantamento divulgado pela Andifes (Associação Nacional dos Dirigentes das Instituições Federais de Ensino Superior) aponta que 54 das 69 instituições de ensino já retomaram ou retomarão as aulas remotamente —a maioria delas, segundo a entidade, retornou apenas em agosto.

Perspectiva de retomada e mudanças

Diêgo diz se sentir prejudicado com a falta de aulas principalmente porque, pouco antes da suspensão das atividades presenciais, os alunos estavam "começando a entrar no ritmo".

"Quando a gente sai da escola, do ensino médio, é totalmente diferente de uma universidade. É mais atividade, é mais puxado", afirma.

Ao mesmo tempo, ele avalia que o fato de ter que estudar por conta "é até bom por um lado, porque as pessoas têm que buscar o próprio conhecimento, e não esperar pelos outros".

Com a perspectiva de retomada do semestre letivo, o jovem já planeja mudanças para poder acompanhar as atividades a distância.

"Quando começarem as aulas remotas eu não vou ficar no interior, vou para a cidade", diz ele, que deve sair da casa dos pais para passar um tempo com o avô. "Na cidade tem internet, na casa do meu avô, e eu vou para lá."