Ribeiro sobre crianças deficientes nas escolas: 'Não queremos inclusivismo'
O ministro da Educação, Milton Ribeiro, voltou a comentar as suas declarações sobre crianças com deficiência "atrapalharem" o ensino dos demais estudantes e, em alguns casos, ser "impossível a convivência". Em entrevista ao programa Direto ao Ponto, da Rádio Jovem Pan, Ribeiro reforçou o discurso que o MEC (Ministério da Educação) e o governo não querem o "inclusivismo" dessas crianças nas escolas e usou novamente o termo "atrapalhar".
"O que nós queremos? Nós não queremos o inclusivismo. Criticam essa minha terminologia, mas é essa mesmo que eu continuo a usar. É claro que existe uma deficiência como a Síndrome de Down, que existem alguns graus, que a criança colocada ali no meio, socializa. Mas 12% não têm condições de conviver ali [na sala de aula]."
Ribeiro completou a fala dizendo que o seu posicionamento não é discriminatório e disse ser preocupado com o aprendizado dos outros estudantes na sala de aula.
A bancada do PSOL na Câmara dos Deputados entrou com uma representação no MPF (Ministério Público Federal) pedindo a abertura de uma investigação contra o ministro da Educação pelas declarações. De acordo com os parlamentares, as falas do ministro foram "desrespeitosas" e "discriminatórias".
"Isso não quer dizer que eu estou excluindo, que eu estou sendo uma pessoa usando de discriminação. Eu estou olhando não apenas para a criança que é o objeto do meu cuidado, mas para as outras crianças também que vão ter dificuldade de aprender porquê? Porque geralmente as professoras não têm a capacitação necessária, nem todas, para cuidar de pessoas com esse tipo de deficiência", afirmou.
O ministro também usou a questão das paraolimpíadas para validar a fala de que pessoas com deficiência tem limitações que não as permitem "competir" com pessoas sem deficiências.
"Esse diagnóstico de limitações que as pessoas possuem é um diagnóstico feito pela sociedade. Estamos no meio das paraolimpíadas, por quê? Porque nós descobrimos que tem pessoas com limitações físicas, no caso, que não podem competir com outras que não tem. Então, nesse paralelismo, embora com grandezas diferentes, que eu me referi a quase esses 12%", disse o ministro se referindo a uma porcentagem, segundo ele, de alunos com deficiência que "impede que ela tenha o convívio" com outras crianças em salas de aula.
Ribeiro ainda disse que foi "infeliz" ao usar o termo "atrapalhar" para se referir às crianças com deficiência, mas repetiu o termo na entrevista.
"Eu quando usei a palavra atrapalhar, eu fui infeliz. Eu disse isso, mas usando com todo o cuidado ou fazendo novamente. Se usei a palavra atrapalhar, um atrapalha o outro nesse sentido de caminhar na educação. A palavra atrapalhar não é a melhor. A gente se equivoca, mas um prejudica o progresso do outro."
O posicionamento do ministro, que também é pastor evangélico, vai contra o que defende a educação inclusiva e até o PNE (Plano Nacional de Educação). Ele chegou a defender a criação de turmas e escolas especializadas que atendam apenas estudantes com deficiência.
Ribeiro também criticou a antiga norma do PNEE (Política Nacional de Educação Especial) que definia turmas mistas, o que é recomendado por especialistas pelo ganho social e inclusivo tanto de crianças com deficiência quanto de alunos sem ela.
Proposta barrada no STF
Em outubro de 2020, o presidente Jair Bolsonaro (sem partido) havia publicado decreto para que o governo federal, estados e municípios oferecessem "instituições de ensino planejadas para o atendimento educacional aos educandos da educação especial que não se beneficiam, em seu desenvolvimento, quando incluídos em escolas regulares inclusivas e que apresentam demanda por apoios múltiplos e contínuos".
Na prática, o texto pretendia retirar as crianças com deficiência das turmas regulares para que fizessem parte de turmas exclusivas para elas.
O decreto foi alvo de questionamento no STF (Supremo Tribunal Federal), que suspendeu a nova política, naquele mesmo ano. Na próxima segunda, o Supremo fará uma audiência pública para discutir a proposta.
Uma das metas do PNE é universalizar o acesso à educação para alunos de 4 a 17 anos com deficiência, "preferencialmente na rede regular".
O Anuário Brasileiro de Educação Básica, feito pelo Todos pela Educação em parceria com a Editora Moderna, apontou que nos últimos dez anos as matrículas quase duplicaram. Em 2010 eram 702,6 mil e em 2020 chegou a 1,3 milhão. Até o ano passado, 88,1% dos alunos com deficiência estavam matriculados nas chamadas salas comuns, conhecidas também como turmas mistas.
Apesar disso, o trabalho em torno do assunto necessita de esforços, já que apenas 56,1% dessas escolas possuem banheiro adequado, por exemplo.
Entenda o caso
Em entrevista ao programa Novo Sem Censura, da TV Brasil, no último dia 9, o ministro da Educação criticou o que chamou de "inclusivismo".
"O que é o inclusivismo? A criança com deficiência era colocada dentro de uma sala de alunos sem deficiência. Ela não aprendia, ela atrapalhava, entre aspa, essa palavra falo com muito cuidado, ela atrapalhava o aprendizado dos outros, porque a professora não tinha equipe, não tinha conhecimento, para poder dar a ela atenção especial", afirmou ao criticar as diretrizes anteriores para inclusão dos alunos com deficiência na rede pública.
Dias depois, em visita ao Recife, Ribeiro afirmou que existem crianças com graus de deficiência em que "é impossível a convivência em sala de aula" e defendeu o uso de salas especiais para esses alunos. "Nós temos 1,3 milhão de crianças com deficiência que estudam nas escolas públicas. Desse total, 12% têm um grau de deficiência em que é impossível a convivência", afirmou o ministro. "O que o nosso governo fez? Ao invés de jogá-los em uma sala de aula simplesmente pelo inclusivismo, nós estamos criando salas especiais para que essas crianças possam receber o tratamento que merecem e precisam", acrescentou.
Com a repercussão das declarações, o Ministério da Educação afirmou, por nota, que Ribeiro "manifestou publicamente o seu pedido de desculpas às pessoas que se sentiram ofendidas". A pasta disse ainda que "reafirma o seu compromisso com o desenvolvimento de políticas públicas que contemplem de fato as necessidades das modalidades especializadas".
Bate-boca com Romário
O ex-jogador e senador Romário (PL-RJ) criticou o ministro nas redes sociais. O parlamentar do PL é pai de Ivy, menina de 16 anos que tem síndrome de Down e criticou a atitude de Ribeiro.
O ex-jogador de futebol e atual parlamentar classificou as falas do integrante do governo Jair Bolsonaro (sem partido) como vindas de uma pessoa "imbecil" e afirmou que não era de se esperar que um ministro da Educação tivesse a postura apresentada por Ribeiro.
"Somente uma pessoa privada de inteligência, aqueles que chamamos de imbecil, podem soltar uma frase como essa. Existem aos montes, mas não esperamos que estes ocupem o lugar de ministro da Educação de um país", escreveu Romário, no Twitter.
Ribeiro reagiu e disse que é "deselegante" um dos representantes do Senado Federal se dirigir a um ministro com palavras ofensivas. Ribeiro afirmou ainda que a frase comentada por Romário foi tirada de contexto.
"Quero acreditar que o Sr. não tenha assistido à entrevista e 'caiu na onda' de quem distorceu o sentido de minha frase. Para poupar seu tempo e energia, trago esclarecimentos dos seus próprios e seguidores", disse o líder do MEC.
Quero acreditar que o Sr. não tenha assistido à entrevista e 'caiu na onda' de quem distorceu o sentido de minha frase.
-- Milton Ribeiro (@mribeiroMEC) August 17, 2021
Para poupar seu tempo e energia, trago esclarecimentos dos seus próprios e seguidores. Fique com Deus! pic.twitter.com/X96fDb07GW
Em nota, a Comex/MEC (Comissão Externa de Acompanhamento do Ministério da Educação), formada por deputados federais, concordou com as críticas de Romário e afirmou que a fala do ministro é "segregadora e vai contra as leis e as normas constitucionais brasileiras que promovem a inclusão aos estudantes com deficiência".
O grupo pediu ainda que Ribeiro dê esclarecimentos ao Congresso e peça desculpas aos alunos brasileiros com deficiência.
*Com informações do Estadão Conteúdo
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