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PF abre inquérito para investigar suspeita de corrupção no MEC

Apuração não envolve pessoas com foro privilegiado, como o ministro Milton Ribeiro - Luis Fortes/Ministério da Educação
Apuração não envolve pessoas com foro privilegiado, como o ministro Milton Ribeiro Imagem: Luis Fortes/Ministério da Educação

Eduardo Militão

Do UOL, em Brasília

25/03/2022 14h01Atualizada em 25/03/2022 14h59

A Polícia Federal abriu, na quinta-feira (24), um inquérito para apurar suspeitas de corrupção envolvendo verbas do Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educação (FNDE), ligado ao MEC (Ministério da Educação). O pedido de inquérito foi feito pela Controladoria Geral da União (CGU).

Porém, paralelamente, existe um inquérito no STF (Supremo Tribunal Federal) que apura a possível participação do ministro no caso. Ontem, a ministra Cármen Lúcia, do Supremo, entendeu que é "imprescindível" investigar todos os possíveis envolvidos no "gabinete paralelo" do MEC, incluindo o presidente Jair Bolsonaro (PL).

Áudios divulgados pelo jornal Folha de S.Paulo mostraram Ribeiro afirmando que o governo federal priorizava o atendimento de pedidos de verbas de municípios que eram indicados por dois pastores evangélicos, Gilson Santos e Arilton Moura.

Além disso, um prefeito afirmou que um dos pastores citados teria pedido propina em ouro para a liberação de verbas no Ministério.

Segundo a Controladoria, em 27 de agosto de 2021, o MEC pediu à CGU que investigasse duas suspeitas. Uma era uma denúncia "anônima que tratava de possíveis irregularidades que estariam ocorrendo em eventos realizados pelo MEC e outra sobre oferecimento de vantagem indevida, por parte de terceiros, para liberação de verbas no âmbito do Fundo nacional de Desenvolvimento da Educação (FNDE)".

Em 3 de março deste ano, a investigação da CGU foi concluída apontando que não haveria participação de agentes públicos, mas de terceiros. Por isso, recomendou o envio à Polícia Federal "ante a possibilidade de ocorrência de crime por ocasião da oferta de vantagem indevida [corrupção, suborno ou propina]".

O pedido só foi enviado à PF em 24 de março, três dias depois de a Folha de S.Paulo revelar os áudios de Milton Ribeirto. O UOL apurou que o inquérito foi aberto ontem mesmo e será coordenado pela Superintendência da PF em Brasília, uma unidade regional.

No STF, Milton Ribeiro é alvo de um inquérito pedido pela Procuradoria Geral da República. Nesse caso, parte dos pedidos de investigações, como tomada de depoimentos e análise técnica dos áudios também será feita pela Polícia Federal.

Ainda não se sabe se a PF vai designar uma delegacia para cuidar da investigação originada a pedido da PGR e outra para a feita a pedido da CGU ou se definirá uma única equipe para cuidar dos dois casos juntos.

A CGU informou que abriu uma outra investigação a partir do noticiário sobre os áudios de Milton Ribeiro revelados pelos jornais Folha de S.Paulo e Estado de S.Paulo.

O pastor Gilmar Santos negou veemente ter recebido ou contribuído para o recebimento de propina. Pelas redes sociais, Santos isentou Bolsonaro de culpa, como Ribeiro também fez. "Gostaria de externar que nenhum pedido fora feito ao Excelentíssimo Senhor Presidente da República", afirmou.

Ontem, Bolsonaro falou pela primeira vez publicamente sobre o assunto, chamando a reação contra o ministro "uma covardia". "O Milton, coisa rara eu falar aqui, eu boto a minha cara no fogo pelo Milton. Minha cara toda no fogo pelo Milton", disse em sua transmissão ao vivo semanal.

O conteúdo do áudio

Na gravação divulgada, Ribeiro fala dos pastores evangélicos Gilmar Silva dos Santos e Arilton Moura Correia. "Foi um pedido especial que o Presidente da República fez para mim sobre a questão do [pastor] Gilmar", diz o ministro no áudio obtido pela Folha de S. Paulo. Sem cargos, eles atuam em um esquema informal de obtenção de verbas do MEC (Ministério da Educação).

Na conversa, participaram prefeitos, os dois religiosos e lideranças do FNDE (Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educação). Na reunião, que aconteceu dentro do MEC, o ministro falou sobre o orçamento da pasta, cortes na educação, e ainda sobre a liberação de recursos para essas obras

"Porque a minha prioridade é atender primeiro os municípios que mais precisam e, em segundo, atender a todos os que são amigos do pastor Gilmar", diz o ministro.

Para isso, porém, Milton Ribeiro fala em uma contrapartida: "então o apoio que a gente pede não é segredo, isso pode ser [inaudível] é apoio sobre construção das igrejas". Na gravação obtida pela Folha, porém, o ministro não detalha como isso seria feito.

De acordo com relatos feitos sob anonimato à Folha por gestores e assessores, os pastores negociam a liberação de recursos às prefeituras em restaurantes e hotéis de Brasília, e depois entram em contato com o ministro. O chefe do MEC, então, determina ao FNDE a oficialização do empenho, reservando o recurso.

Ainda conforme informações do jornal, políticos foram recebidos na casa de Milton Ribeiro fora da agenda oficial. O prefeito de Rosário (MA), Calvet Filho (PSC), gravou um vídeo com o ministro no apartamento dele em Brasília. À reportagem da Folha, ele disse que o encontro foi informal. Ele também negou ter negociado obras com os pastores, tendo conversado com eles apenas "para organizar pregações" na cidade.

No ano passado, em evento no MEC com os dois pastores, prefeitos conseguiram a liberação de recursos para novas obras. Um deles, da cidade de Anajatuba (MA), que tem 27 mil habitantes, conseguiu seis obras empenhadas. De acordo com a reportagem, a prefeitura sequer comprou os terrenos.

Segundo o prefeito do município Helder Aragão (MDB), ele se encontrou com o pastor Arilton em um hotel da capital federal, mas disse não ter amizade com ele: "Fui até um hotel em Brasília onde tinha vários prefeitos e ele falava que conseguia obra para o FNDE". Aragão garantiu, porém, que não negociou obras com os pastores nem com pessoas do MEC, e que os empenhos foram garantidos pelos meios corretos.