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90 anos da Revolução de 32: veja 7 curiosidades que não te contam na escola

Cartaz de convocação para alistamento de voluntários, na Revolução de 32 -  Arquivo público do Estado de São Paulo
Cartaz de convocação para alistamento de voluntários, na Revolução de 32 Imagem: Arquivo público do Estado de São Paulo

Rafael Souza

Colaboração para o UOL

09/07/2022 04h00

No dia 9 de julho é comemorado o Dia da Revolução Constitucionalista de 1932 em São Paulo, um evento histórico para o Brasil e cercado de polêmicas.

Enquanto alguns defendem os paulistas pela nobre defesa da democracia e pela criação de uma Constituição, outros acreditam que foi certo o governo federal reprimir os paulistas porque o real objetivo era atender aos interesses das elites cafeicultoras e até mesmo a independência de São Paulo.

Em 23 de maio de 1932, a morte de cinco jovens por integrantes da Legião Revolucionária (grupo partidário do governo Vargas) foi o estopim para a revolta dos paulistas contra o governo federal.

Os combates duraram 87 dias com 934 mortos, mas estimativas não oficiais indicam até 2.200 mortes. Nesse período, há muitas histórias que não são contadas: a participação de negros, a influência de mulheres e imigrantes, além da morte de Santos Dumont fazem parte do contexto da guerra.

Veja abaixo sete curiosidades da "revolução".

Campanha de arrecadação e indústrias financiaram revolucionários

Os paulistas tinham uma grande desvantagem contra as tropas federais: a falta de armamentos e equipamentos de defesa, principalmente após o governo federal proibir a importação dos arsenais vindos de outros países.

Com isso, muitas indústrias em São Paulo ajudaram fabricando capacetes e munição. Além disso, uma campanha conseguiu arrecadar uma grande quantidade de joias e objetos de ouro doados pela população, para financiar os combatentes paulistas. Até a Cervejaria Brahma contribuiu distribuindo chope aos soldados.

Sons de matracas enganaram tropas federais

Matraca - Núcleo MMDC de Piracicaba - Núcleo MMDC de Piracicaba
Matraca
Imagem: Núcleo MMDC de Piracicaba

Diante do problema da falta de armamentos, os paulistas tiveram que apelar para a criatividade e o 'blefe' para evitar o avanço das tropas federais.

Um equipamento usado nessa época foi criado pelo professor Octávio Teixeira Mendes, do batalhão de Piracicaba, e se chamava "catraca", antes de ser rebatizado de "matraca".

O instrumento tinha uma manivela acoplada a uma roda dentada que tocava em uma lâmina de aço. Quando os soldados rodavam a manivela, saía um forte som parecido com uma rajada de metralhadora.

O barulho assustava os inimigos e os fazia recuar, garantindo também que as tropas paulistas ganhassem tempo retardando o avanço das tropas getulistas.

Sigla MMDC virou 'MMDCA'

A sigla MMDC representa os nomes dos quatro jovens mortos no levante de 23 de maio: Miragaia, Martins, Dráusio e Camargo. No entanto, a morte de Alvarenga Orlando de Oliveira ficou esquecida por muito tempo.

O motivo é que não se tinha certeza se a morte de Alvarenga aconteceu em 23 de maio e no contexto da revolução constitucionalista. Há relatos de que ele foi ferido somente em agosto, mês de sua morte.

Somente em 1993 o pesquisador Hely Felisberto Carneiro reuniu provas de que Alvarenga foi gravemente ferido com um tiro de fuzil das tropas getulistas em sua coluna lombar, que esfacelou sua medula, no dia 23 de maio. Depois desse dia, ficou quase três meses internado, até sua morte, no dia 12 de agosto.

Após o trabalho de Hely, a Sociedade Veteranos de 1932 reconheceu a omissão do nome de Alvarenga, que foi acrescentado à sigla MMDC por meio de uma Lei Estadual promulgada em 2004.

Atletas foram à guerra

No mesmo ano da revolução aconteciam as Olimpíadas de Los Angeles. Vários atletas paulistas não conseguiram viajar e outros voltaram ao Brasil após os jogos e se alistaram para lutar na Força Constitucionalista.

Não somente os atletas olímpicos se alistaram, como também um dos maiores nomes do futebol brasileiro e estrela naquela época: Arthur Friedenreich, que brilhou pelo Paulistano e fez o gol da vitória contra os uruguaios no Campeonato Sulamericano de 1919, uma das primeiras grandes conquistas da seleção.

O jogador não só foi combatente, como também liderou uma divisão com mais de 800 desportistas, começando como sargento até chegar ao posto de tenente. Saiu da guerra como herói.

Guerra teria provocado o suicídio de Santos Dumont

Sabe-se que Santos Dumont morreu quando se enforcou em 1932, em um hotel em Guarujá (SP) e que o aviador já vinha sofrendo com depressão.

O que teria provocado o suicídio ainda é um mistério, mas existem fortes indícios de que a guerra entre federais e paulistas teriam sido o estopim em um quadro de tristeza que Dumont já vinha apresentando diante do mau uso de sua maior criação: o avião.

Desde a primeira guerra mundial, Dumont lutava para evitar que o avião fosse usado em batalhas, mas nunca obteve sucesso. Ao voltar ao Brasil, Dumont estava em Guarujá e de lá teria visto aviões das tropas getulistas atirarem bombas contra cidades paulistas, o que teria provocado uma grande tristeza que fez o grande inventor voltar ao hotel em que estava hospedado e se enforcar com uma gravata.

Participação dos imigrantes e da 'Legião Negra'

Legião Negra - Ricardo Della Rosa/Acervo pessoal - Ricardo Della Rosa/Acervo pessoal
Legião Negra
Imagem: Ricardo Della Rosa/Acervo pessoal

Durante a revolução, todas as colônias estrangeiras estabelecidas em São Paulo colaboraram com o Movimento Constitucionalista. Até mesmo soldados japoneses pegaram em armas. Outros grupos ajudavam realizando doações de comida aos combatentes, como arroz e banana que eram plantados por agricultores japoneses do oeste paulista.

Além deles, havia um grupo que contribuiu com a afirmação dos negros na sociedade e nos campos de batalha. A 'Legião Negra' foi um batalhão étnico que chegou a reunir 2 mil voluntários durante os meses de combates. Eram considerados fortes, destemidos e foram apelidados de 'Pérolas Negras'.

Revolução ajudou as mulheres a conquistar direitos

Carlota Pereira - FGV - FGV
Carlota Pereira
Imagem: FGV

Em 1932, o Brasil já vivia um marco histórico para as mulheres: a nadadora Maria Lenke, com apenas 17 anos de idade, foi a primeira mulher sul-americana a disputar uma Olimpíada.

Mas além desse espaço ocupado pela mulher, outras ações iriam demonstrar a força feminina e o justo direito das mulheres em conquistar mais direitos, afinal, naquela época, a mulher não podia sequer votar.

No contexto da guerra, a médica Carlota Pereira de Queirós foi um importante nome por liderar a União Cívica Feminina durante a revolução, que posteriormente deu força ao movimento que garantiria o voto feminino.

Na guerra contra as tropas federais, ela deixou o laboratório de clínica pediátrica onde trabalhava e mobilizou mais de 700 mulheres para prestar assistência aos feridos.

Mesmo com os paulistas perdendo a guerra contra as tropas federais, o saldo positivo foi a Assembleia Nacional Constituinte - grande objetivo dos constitucionalistas - no qual Carlota esteve presente como a única mulher.

No ano seguinte, o voto feminino passou a ser previsto na Constituição Federal e Carlota se elegeu como a primeira mulher deputada federal do país.