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Caipirismo preconceituoso: alguns pontos para você repensar na festa junina

Getty Images/iStockphoto
Imagem: Getty Images/iStockphoto

Thiago Varella

Colaboração para o UOL, em Campinas (SP)

29/06/2023 14h44

Junho é o mês da quadrilha, da roupa xadrez, das comidas típicas, dos bigodinhos desenhados com lápis e das trancinhas falsas nos cabelos das meninas. Mas, vale prestar atenção no exagero do "caipirismo".

O que é enfatizado na quadrilha são seus aspectos grotescos. Há um exagero em roupas rasgadas, remendadas e em trejeitos, explorando-se o caipirismo desdenhosamente, preconceituosamente. Os tipos sociais rurais apresentados pararam no tempo e não ultrapassaram o Jeca Tatu, de Monteiro Lobato, das primeiras décadas do século 20."
Jadir de Morais Pessoa, professor da Faculdade de Educação daUFG (Universidade Federal de Goiás)

O professor ressalta que diversos elementos da festa tradicional acabaram sendo esquecidos, com a festa reduzindo-se à quadrilha e aos trajes. Não que isso não seja importante, mas há muito mais a explorar —especialmente nas escolas.

"Em vez de se fixar quase que exclusivamente no caipirismo, que só visa reproduzir o preconceito contra o homem rural, as festas poderiam alcançar os demais aspectos da tradição, como o fenômeno do solstício, ancestralmente constitutivo desse ciclo festivo, o fogo, o mastro e a evocação do espírito da fertilidade."

As comidas típicas regionais, por exemplo, simbolizam as colheitas e podem ser uma forma de trazer para os jovens uma consciência da relação campo e cidade. Ou um momento de preparo artesanal e coletivo de alimentos.

A festa junina é celebrada no fim do mês de junho, não apenas por causa dos santos Antônio (dia 13), João (24) e Pedro (29), mas pelo solstício de verão, que marca uma nova temporada de colheita.

No hemisfério norte, onde a festa tem sua origem, ele ocorre entre os dias 20 ou 21 de junho —é o dia em que o sol está mais no centro do céu, também conhecido como dia mais longo do ano.

"A festa é quando os camponeses comemoram coletivamente a colheita e trabalham em toda a sua organização artística e cultural com uma estética própria e diferenciada. Na escola, pode ser um projeto com todos os professores envolvidos para que de fato seja uma festa de solidariedade e construção coletiva, como é nos sertões nordestinos, por exemplo, cujas famílias recebem os festeiros com fartos banquetes", explica Betania Libanio Dantas de Araujo, professora do Departamento de Educação da Unifesp (Universidade Federal de São Paulo).

Dentro desse espírito, analisa Araujo, é possível acolher a própria história da comunidade e as heranças culturais.

Festa laica ou religiosa?

Uma das principais questões levantadas hoje em dia sobre a festa junina nas escolas é sobre o seu caráter religioso. Não raro, algumas famílias não-católicas não permitem que seus filhos participem das festividades justamente por serem consideradas homenagens a Santo Antônio, São João e São Pedro.

Para a pedagoga Tania Finkelmann Landau, é possível celebrar a festa junina sem ferir os preceitos de um ensino laico e trazendo famílias de diferentes tradições religiosas para a celebração.

"A festa junina é uma celebração da cultura popular brasileira. Ela tem sim um aspecto marcado pela religiosidade, mas podemos explorar outros elementos como a dança e o cancioneiro. A parte religiosa pode ser abordada dentro da escola como uma questão do respeito à diversidade", afirma.

O importante é que o estudante não seja impedido de conhecer a cultura —e nem seja obrigado a participar .

Também é possível suprimir da festa junina a parte da religiosidade e celebrar a parte folclórica não-religiosa, acredita Pessoa. (Com informações de texto publicado anteriormente)