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Autodidatismo: especialista dá dicas para estudar sem professor

Edgard Matsuki

Do UOL, em Brasília

14/01/2013 20h11

Por muitas vezes, a vontade de aprender é maior do que a possibilidade de ter uma pessoa capacitada e com tempo disponível para nos ensinar. Com isso, cabe ao aluno se lançar à própria sorte e buscar o conhecimento. É o chamado autoaprendizado. O que pode parecer uma necessidade, na verdade apresenta muitas vantagens. É o que garante o professor Pedro Demo (doutor em sociologia com PhD na Alemanha e nos EUA).

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Autor de livros sobre o assunto como "Metodologia para Quem quer Aprender" (editora Atlas), Demo afirma que o autodidatismo ajuda na criatividade e pensa que o próprio ensino tradicional deveria dar mais autonomia para o estudante. Nesta entrevista, ele dá dicas para quem quer estudar por conta.

Porém, logo avisa: não há esquema pronto para aprender por conta. O estudante é que tem de descobrir o que é melhor para ele.

Existem técnicas que podem tornar o autoaprendizado mais efetivo?

Pedro Demo - Há sugestões do tipo autoajuda que são enganosas porque prendem o estudante a esquemas. Parte da aprendizagem significa libertar-se de esquemas rígidos em nome da autonomia. Não havendo fórmula pronta, a sugestão é caprichar nas “habilidades” como saber pensar, pesquisar, elaborar, questionar, perguntar, duvidar...

Pensando nisso, como o estudante pode aprimorar essas habilidades?

Um pouco dessas habilidades vêm da própria pessoa, mas com certeza podem ser melhoradas na vida, na boa escola (que permite ao aluno refletir e criar). Exercitar a autoria é uma boa forma de a pessoa aprender a pensar, já que acaba exercitando o “saber pensar”.

Para quem gosta, bons videogames ajudam a pessoa a resolver problemas. Um exemplo é o Sim City, no qual a pessoa tem que administrar uma cidade.

Como o estudante pode organizar um plano de estudo sozinho?

Quem deve pensar no plano de estudo é o próprio aluno. Ao analisar a dificuldade da disciplina que quer aprender, ele pode dividi-lo em partes e estipular um tempo de aprendizado. Para desenvolver a autonomia, qualquer pessoa precisa organizar-se, tomar iniciativa, saber pensar, questionar e se autoquestionar.

O aluno também deve pensar em quais tipos de apoio podem ajudar. Existe uma metodologia chamada Scaffolding, no qual o estudante começa com um apoio no aprendizado e cada vez menos necessita dele. Também é muito importante imergir no assunto. Uma boa forma de fazer isso é exercitar a autoria, já que para criar é preciso estudar muito.

No livro "Metodologia para Quem Quer Aprender", você cita que disciplina e indisciplina são necessárias para quem quer estudar. Por quê?

É preciso ter disciplina, porque o estudo rende melhor em condições ordenadas: com horário, com pontualidade e com coordenação.

Mas a criatividade é mais inspirada na indisciplina, na habilidade de sair da rotina. Indisciplina não significa quebrar tudo, agredir os outros, apontar confusão, mas saber divergir, perguntar, duvidar, buscar outros caminhos.

Muitas pessoas se dizem “autodidatas”. Isso significa que nem todo mundo é capaz de aprender sozinho?

Há pessoas autodidatas, no sentido de que sabem aprender por si, pois possuem boa cabeça, usam lógica com facilidade, induzem e deduzem, inferem, sacam soluções. No fundo, todos podem aprender sozinhos, porque aprendizagem é algo sozinho, de dentro para fora. A escola, em geral, tolhe a iniciativa própria, porque é uma instituição autoritária e instrucionista. “Ensina”, mas não cuida que se aprenda.

Em que sentido as novas tecnologias podem ajudar no autoaprendizado?

Tecnologia pode ajudar e atrapalhar. Elas servem para pesquisar, elaborar e questionar. Mas também podem ser usadas para plagiar, copiar, e enganar. Cabe ao aluno ter consciência de usá-las bem.

Além dos videogames, há bons recursos tecnológicos como programas de exercícios e apostilas. Porém, o ideal é ter consciência de que não devemos nos prender a apenas um apoio. Ficar só com internet é pobreza, porque a história tem um acervo imenso de construção de conhecimento que vem antes da web.

Por que há muitas pessoas autodidatas que se dão bem em áreas como tecnologia e negócios?

Em toda história, a tecnologia é o grande emblema da criatividade humana. De certa forma, criar o que é novo faz parte da própria tecnologia. E para criar o que é novo, há de se fazer sem professor. Neste sentido, podemos ver que a autoria ajuda muito quem busca o autoaprendizado.

Quais são as principais vantagens do estudo por conta. E desvantagens?

Vejo como principal vantagem o exercício da pessoa ter que buscar soluções para as próprias fraquezas. Com certeza ajuda no autodesenvolvimento. Por outro lado, há o risco da pessoa que faz tudo sozinha não desenvolver a autocrítica, pois não tem um nível de comparação. Só é importante também pensar em outra coisa: estudo por conta não significa isolar de tudo e todos. Quando for preciso, vale buscar ajuda.

Você acredita que o ensino da forma tradicional nas universidades pode ser substituído por novos métodos de autoaprendizado?

Deve, porque o “ensino” hoje é um disparate instrucionista. É preciso inventar sistemas de “aprendizagem”, nos quais professores e estudantes se encontram para aprenderem juntos, exercitando a autoria. Ao lado do conteúdo que todo mundo precisa dominar para tornar-se profissional, é importantíssimo desenvolver habilidades autorais. Quem sabe essas habilidades, sobrevive aos tempos. Quem só escuta aula, falece na primeira esquina.