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Flexibilidade é segredo de sucesso em escolas rurais da Colômbia

Crianças de diferentes idades e estágios escolares trabalham em pequenos grupos e em seu próprio ritmo - Divulgação/Wise Qatar
Crianças de diferentes idades e estágios escolares trabalham em pequenos grupos e em seu próprio ritmo Imagem: Divulgação/Wise Qatar

Sara Hamdan

Do New Your Times

11/11/2013 15h04

Myriam Mazzo é professora em Armenia, uma comunidade rural na Colômbia de cerca de 300 mil pessoas incrustada entre as montanhas a sudoeste de Bogotá. Em sua escola de apenas uma sala de aula, ela ensina crianças de diferentes idades e estágios escolares, que trabalham em pequenos grupos em seu próprio ritmo. Em lugar de se posicionar em pé a frente de uma lousa, Myriam passa pelos grupos, servindo mais de guia que de instrutora.

Usando o método multisseriado, ela tem ensinado a ler, escrever e fazer contas gerações de crianças, filhos e filhas de agricultores locais. Seus alunos do ensino fundamental são muitas vezes os primeiros de suas famílias a frequentarem os bancos escolares.

Myriam tem usado esse método de ensino Escuela Nueva por 28 anos, após sua experiência lecionando em uma escola pública tradicional da Colômbia. O método, desenvolvido por Clara Victoria (Vicky) Colbert de Arboleda nos anos 1970, foi feito especificamente para professores como Myriam, que dão aulas em salas multisseriadas em comunidades rurais.

"Com a Escuela Nueva, o aluno é um líder, não mais uma criança tímida em uma sala de aula tradicional", disse Myriam em entrevista por telefone. "Ele não é aquele aluno com medo de falar ou de compartilhar ideias, é participativo, democrático, sabe como compartilhar e trabalhar em grupo, e - mais importante - ele pode trabalhar em seu próprio ritmo, assim é motivado a voltar após longos períodos de ausência."

Recursos inadequados e baixo desempenho acadêmico normalmente levam a altas taxas de desistência e de repetência em escolas tradicionais. Na região de Quindío, perto de Armenia, por exemplo, estudantes têm de superar não apenas a pobreza e a falta de recursos educacionais, mas também uma cultura que encoraja as crianças a trabalharem para ajudar na renda família - e a tentação do dinheiro fácil ganho com o tráfico de drogas.

De volta à escola

O programa flexível Escuela Nueva incentiva estudantes que deixaram a escola a voltarem às salas de aula para estudar em seu próprio ritmo e fazer provas quando estiverem prontos.

"Se um aluno aprende mais rápido, posso guiá-lo e ele se desenvolver ainda mais rápido; se um estudante tem dificuldades ou esteve longe da escola por um tempo, ele pode ser auxiliado", diz Myriam. "Se o aluno estiver afastado por causa de uma doença ou porque seus pais agricultores foram trabalhar em outra região, quando voltar a escola, ele pode seguir seu aprendizado de onde parou --assim os alunos ficam motivados, sua auto-estima continua alta, e eles nunca repetem conteúdos."

A estratégia do Escuela Nueva também quer tornar a educação mais relevante para a vida cotidiana dos estudantes e de suas famílias --mapeando o local em que morar, por exemplo, e aprendendo sobre o calendário agrícola. O material didático direciona os alunos a compartilhar o que aprendem nas escolas com suas famílias e comunidades.

Décadas após o modelo ter sido desenvolvido em 1975, Escuela Nueva recebeu apoio -- inclusive financeiro -- do governo colombiano, da Unesco e do Banco Mundial, e foi implementado dentro da política nacional de educação da Colômbia no final dos anos 1980. Em 1988, a Unesco declarou que a Colômbia era o único país da América Latina em que as escolas rurais tinham melhor desempenho que as escolas urbanos por conta do método Escuela Nueva.

Entre 2007 e 2009, o programa ensinou 700 mil crianças na Colômbia, e o modelo está implementado em 20 mil escolas por todo o país, em áreas rurais e urbanas. Escuela Nueva foi expandido internacionalmente para 19 países, incluindo o Brasil, as Filipinas e a Índia, beneficiando mais de 5 milhões de crianças pobres.

Premiado

Clara Victoria e o modelo ganharam uma série de prêmios ao longo dos anos, mais recentemente o prêmio de US$ 500 mil da Wise, entregue pela World Innovation Summit for Education em Doha (Qatar). O prêmio anual, financiado pela Fundação Qatar para Ciências, Educação e Desenvolvimento Comunitário, reconhece inovações que contribuem para a educação internacional.  

"Quando você vê estas escolas isoladas e invisíveis, por que esperar por uma grande e completa reforma educacional feita pelo governo?", disse Clara Victoria, em Doha, ao receber o prêmio. "Nós começamos o projeto de baixo para cima, fazendo pequenas alterações nas salas de aula e trabalhando com professores rurais para melhorar a auto-estima, os resultados e os recursos."

O método transforma o paradigma convencional do aprendizado em que o professor é o único a falar e a transmitir informações dentro da sala de aula. A ideia é que os estudantes estejam no centro do processo de aprendizado. Apesar da filosofia não ser nova, sua aplicação a baixo custo em comunidades rurais é revolucionária.

"Você pode imaginar uma criança que abandona a escola e é obrigada a repetir o mesmo ano a cada vez que volta?", disse. "Onde fica a auto-estima? Então desenvolvemos materiais didáticos que promovem o aprendizado em seu ritmo e um cronograma flexível, pois o que tínhamos antes em nossas escolas simplesmentes não funcionava."

"A mudança não vai acontecer dentro de algum escritório, ela tem de acontecer na base."