Topo

Após ganhar e perder chefia do Enem, economista vai para cargo inferior

Reprodução/Youtube
Imagem: Reprodução/Youtube

Ana Carla Bermúdez e Leandro Prazeres

Do UOL, em São Paulo e em Brasília

18/01/2019 12h32Atualizada em 18/01/2019 18h10

Após ganhar e perder em 24 horas o cargo responsável pela coordenação do Enem (Exame Nacional do Ensino Médio), o economista Murilo Resende Ferreira foi nomeado nesta sexta-feira (18) como assessor do MEC (Ministério da Educação). Nos bastidores, a decisão foi vista como um "prêmio de consolação", já que o posto que o economista ocupará agora é de nível inferior aquele para o qual ele tinha sido escolhido.

A nomeação de Ferreira para o cargo de assessor da Sesu (Secretaria de Educação Superior do MEC) foi publicada em portaria assinada pelo ministro da Educação, Ricardo Vélez Rodríguez, no Diário Oficial da União na manhã desta sexta. 

Defensor das ideias do programa Escola Sem Partido e crítico do que classifica como "ideologia de gênero", Ferreira chamou os professores brasileiros de "manipuladores" e afirmou que eles não querem "estudar de verdade". As afirmações foram feitas em 2016, durante audiência pública do MPF-GO (Ministério Público Federal).

Na noite de quarta-feira (16), ele havia sido nomeado para o cargo de diretor de avaliação básica do Inep (Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira), posto responsável por comandar todas as avaliações de larga escala, incluindo o Enem. 

A nomeação havia sido feita por meio de uma portaria assinada pelo ministro da Casa Civil, Onyx Lorenzoni, publicada no Diário Oficial.

Na noite desta quinta (17), no entanto, Lorenzoni assinou outra portaria que tornou "sem efeito" a nomeação de Ferreira, sem explicitar os motivos para a decisão. Procurada pelo UOL, a Casa Civil ainda não se manifestou sobre a decisão de demitir Ferreira do cargo. Já o Inep afirmou se tratar de uma decisão do MEC.

Em nota, o MEC afirmou que, no cargo de assessor, Ferreira atuará em um grupo especial de trabalho no Inep --que, entre outras atribuições, ajudará no acompanhamento, análise e direcionamento do Enem. "A decisão foi tomada pelo ministro da Educação e pelo presidente substituto do Inep para que o novo assessor especial consiga desenvolver o trabalho de forma ampla e substantiva", diz o texto.

Em entrevista ao jornal "O Estado de S. Paulo", o engenheiro Marcus Vinicius Rodrigues, cotado para a presidência do Inep, disse que a nomeação de Ferreira para a diretoria foi um "erro".

"O governo está chegando e precisa de um tempo para se adaptar. Estamos conhecendo a casa e houve um erro. Um erro natural, porque a indicação dele seria para uma assessoria especial", afirmou. 

Ele negou, no entanto, que a má repercussão após a nomeação de Ferreira tenha levado à anulação, e fez elogios ao economista. "O professor Murilo é um dos grandes quadros do país, é um pensador. Ele faz parte de um grupo que busca pensar um Brasil novo", disse.

Nomeação gerou críticas

O currículo de Ferreira não aponta nenhuma experiência na área de educação básica. Em seu blog, o economista descreveu a si mesmo como "estudioso do marxismo e do movimento revolucionário desde 2003".

Doutor em economia pela FGV (Fundação Getulio Vargas), ele foi aluno do curso online de filosofia de Olavo de Carvalho, um dos influenciadores do governo do presidente Jair Bolsonaro (PSL). 

Sua nomeação para a chefia do Enem gerou críticas de educadores e deixou funcionários do Inep assustados. Daniel Cara, coordenador geral da Campanha Nacional pelo Direito à Educação, afirmou que a nomeação do economista demonstrava compromisso com uma visão de que o Enem seria um instrumento de "doutrinação".

Servidores do Inep evitaram comentar o assunto, por medo de represálias, mas mostraram preocupação com eventuais problemas na execução do Enem e de outras avaliações.

Indefinições no Inep

Após a exoneração de Maria Inês Fini da presidência do Inep na última segunda-feira (14), o governo ainda não definiu quem irá ocupar o cargo.

Apesar de o engenheiro Marcus Vinícius Rodrigues ser cotado para o posto, há rumores de que a demora para a publicação da nomeação no Diário Oficial é fruto da dificuldade da equipe de Bolsonaro em oficializar o nome.

Ao UOL, Fini disse não considerar normal a demora para a nomeação do próximo presidente, já que "há ações formais a serem tomadas" dentro do Inep.

Para a divulgação dos resultados do Enem 2018, liberados na manhã desta sexta, o instituto não realizou coletiva de imprensa, como é de praxe. Em nota, alegou que o ministro Vélez Rodríguez se encontra em agenda em Roraima e que o Inep está em "processo de transição". 

"Tão logo a nova diretoria esteja integralmente nomeada será realizada uma coletiva de imprensa com a nova gestão da autarquia", diz o comunicado.