Alvo de ministro, professor relata ameaças por defender luta contra cortes
Professor há 21 anos, o doutor em filosofia e professor do Ifal (Instituto Federal de Alagoas) Wanderlan Porto está sofrendo uma série de ameaças após ter um vídeo publicado em que aparece pedindo luta e "ira revolucionária" a alunos contra o bloqueio de verbas e um eventual fechamento da instituição por falta de recursos. "Disseram que meus dias estão contados", relata ao UOL.
O vídeo enviado por uma internauta teve inclusive comentários do ministro da Educação, Abraham Weintraub. "Inacreditável a forma de comunicação", diz o ministro em resposta a uma postagem, pedindo que a usuária envie o material à Ouvidoria do MEC.
Em resposta a outro seguidor que pediu a exoneração do professor, Weintraub deixa a entender que isso ocorrerá, mas que levaria tempo. "Primeiro temos de apurar, abrir um PAD etc. Demora um pouco para esse 'servidor' ser exonerado. Porém, abrir um PAD já assusta muito essa turma de 'corajosos' que usa crianças e menores de idade como bucha de canhão", afirma.
Apesar de citar crianças na sua fala, o Ifal só tem alunos do ensino médio, técnico e superior. A instituição de ensino superior, que tem 14 campi em Alagoas, teve um contingenciamento de R$ 12,6 milhões (25% do orçamento).
No mesmo dia em que o ministro comentou do vídeo, o MEC divulgou uma nota dizendo que professores, servidores, funcionários, alunos e até mesmo pais e responsáveis "não são autorizados a divulgar e estimular protestos durante o horário escolar". Ainda pediu que denúncias sejam feitas para a Ouvidoria do MEC.
O MPF (Ministério Público Federal) deu dez dias ao MEC para cancelar a nota.
Vídeo foi feito durante o intervalo das aulas
O vídeo foi gravado na manhã da quarta-feira (29), no campus do Ifal em Maceió. A fala do professor --e de outros professores-- foi feita a convite do grêmio estudantil, no horário de intervalo dos estudantes.
Nas imagens, o professor aparece dizendo que os alunos da instituição devem lutar para reverter o bloqueio de verbas instituído pelo MEC. "Com esse corte, essa escola fecha em setembro. Não sou eu quem está dizendo, é uma portaria da nossa reitoria", afirma, citando que o Ifal "é a maior instituição pública em termos de capilaridade".
"[Se fechar] vocês não terão para onde ir, não terão futuro. Encham-se da ira revolucionária que cada estudante tem em si. Assumam o papel da história que cabe a cada um de vocês. Meninas, assumam o papel de luta; meninos, assumam o papel revolucionário", diz.
Em entrevista ao UOL, Porto conta que uma série de ameaças foram feitas a ele após a publicação. "A primeira ameaça que recebo nomeadamente é a do ministro, que fala de mim a partir de alguém que me chama de criminoso. Ele se refere a minha pessoa como 'elemento'. Posteriormente, alguém na linha do tempo brada: 'Exonera'. E aí ele diz que sim", afirma.
"Posteriormente, nas minhas redes sociais, vários perfis entram e começam a me agredir, afirmando que, se me encontrarem na rua vão me encher de porrada, que vão me deixar em coma e que meus dias estão contados. É isso que temos vivido de ontem para hoje", conta.
Porto diz que não está indo atrás de comentários feitos fora de suas redes sociais. "Alguns amigos meus estão me informando de outras coisas, mas eu tenho apenas observado o meu perfil mesmo e algumas citações que são feitas a mim", relata.
No Ifal desde 2013 e ensinando filosofia, o professor conta que nunca pensou viver algo parecido na carreira. "Nunca vivi algo assim, nem sequer respondi processo disciplinar. Estou com 21 anos sem nenhum problema mais sério, nem na rede pública, nem na privada", afirma.
Ele diz acreditar que a ameaça é uma tentativa de censurar professores e alunos.
Entendo que o objetivo desse sensacionalismo virtual é impedir a defesa de uma educação pública, gratuita e de qualidade. Não nos impedirão porque não recuaremos
Wanderlan Porto, professor do Ifal
Para o professor de direito criminal da Ufal (Universidade Federal de Alagoas) Welton Roberto, o vídeo não traz nenhum ato ilegal. Não houve nenhum crime. E o ministro não tem essa atribuição ou competência de exonerar nenhum professor concursado. Nem ele nem a reitoria devem abrir qualquer procedimento porque não tem conduta irregular nenhuma", afirma.
O Sindicato dos Servidores Públicos Federais da Educação Básica e Profissional de Alagoas também emitiu uma nota defendendo o professor. "A defesa da educação não é crime e os estudantes e servidores estão unidos em prol da escola pública, ameaçada pelos cortes do governo Bolsonaro", afirmou.
A assessoria de imprensa do Ifal informou que não vai abrir nenhum procedimento administrativo contra o professor por entender que a fala, feita num momento de intervalo das aulas, faz parte da democracia. A instituição disse que a direção do Ifal não vai se posicionar sobre as falas do ministro.
Em nota publicada após a divulgação do caso, o Ifal informou que está finalizando ajustes orçamentários para se adequar aos bloqueios. "A equipe de gestão da reitoria está em constante estudo para garantir a manutenção dos serviços do Ifal em 2019 e emitirá novas orientações ao término desses estudos realizados pela Proad [Pró-Reitoria de Administração]", diz o texto.
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