Topo

SP dá primeiro passo para aprovação de volta às aulas com "compra de vagas"

Aprovação da volta às aulas na Câmara de São Paulo na primeira discussão - Divulgação/Câmara Municipal de São Paulo
Aprovação da volta às aulas na Câmara de São Paulo na primeira discussão Imagem: Divulgação/Câmara Municipal de São Paulo

Alex Tajra e Lucas Borges Teixeira

Do UOL, em São Paulo

29/07/2020 23h26

Resumo da notícia

  • Câmara dos Vereadores aprovou projeto em primeira discussão
  • Além da contratação de vagas de ensino infantil pela rede pública, texto autoriza a contratação de professores em regime emergencial
  • Emendas que pediam adiamento do retorno presencial para 2021 ou para quando houvesse vacina foram rejeitadas
  • Pela lei, os alunos poderão ser aprovados automaticamente, com 25% deles estudando em período integral para reforço
  • Procuradoria da Câmara Municipal de São Paulo havia recomendado a rejeição da proposta pela CCJ
  • Para entrar em vigor, projeto precisa ser aprovado em segunda discussão para, depois, ir à sanção do prefeito

A Câmara dos Vereadores de São Paulo aprovou hoje em primeira discussão o projeto que regulamenta a volta às aulas nas escolas públicas da capital, incluindo a controversa proposta de "compra" de vagas em escolas particulares. Agora, o PL 452 vai a segunda votação na próxima quarta-feira (5). Não há, ainda, previsão de data para o retorno, embora alguns cálculos realizados pelo governo estadual sugiram que os alunos poderão retornar às escolas em setembro.

Em debate acalorado com grande parte da presença on-line, o plenário da Câmara Municipal decidiu pela aprovação do projeto em primeira discussão por 32 votos a 16. O PL, votado em regime de urgência, não especifica uma data para retorno das aulas, mas as emendas do PT — oposição ao prefeito Bruno Covas (PSDB) — que pediam adiamento do retorno presencial para 2021 ou para quando houvesse vacina foram rejeitadas.

De um lado, a situação argumentou que cabe aos pais definirem se seus filhos devem ou não voltar às aulas, desde que haja protocolo de segurança nas escolas. Do outro, a oposição argumentou que não há como garantir a segurança dos alunos e trabalhadores e a retomada poderia aumentar a disseminação do novo coronavírus.

Além da contratação de vagas de ensino infantil pela rede pública, o texto, elaborado pelo Executivo, autoriza também a contratação de professores em regime emergencial e o repasse de verbas para a compra de material escolar e de uniformes a partir de 2021 às famílias dos estudantes.

Para entrar em vigor, o projeto precisa ainda ser aprovado em segunda discussão, marcada para a próxima quarta-feira para, depois, ir à sanção do prefeito. Deverá ocorrer ainda mais uma audiência pública para debater o projeto na próxima terça (4).

Rejeitado pela Procuradoria, aprovado na CCJ

A aprovação da normativa contraria a Procuradoria da Câmara Municipal de São Paulo, que havia recomendado a rejeição da proposta pela CCJ (Comissão de Constituição e Justiça). A Procuradoria citou ao menos quatro pontos do projeto que foram considerados ilegais (veja mais abaixo). Mesmo com os pontos citados pela Procuradoria como irregulares e contrários ao que pensa o Ministério Público, o relatório da vereadora Rute Costa (PSDB) na CCJ foi pela legalidade do projeto.

O texto garante assistência à saúde dos estudantes, aos professores para melhores condições de trabalho, auxílio para compra de uniforme e de material escolar. Os pontos são considerados "extraordinários" pelo poder público levando em consideração a pandemia do novo coronavírus. Pela lei, os alunos poderão ser aprovados automaticamente, com 25% deles estudando em período integral para reforço.

A proposta envolve também apoio pedagógico, que deve ser utilizado como "recuperação das aprendizagens", que deve ser aplicado fora do horário das aulas. O Programa São Paulo Integral, também proposto com a lei, possibilitará às escolas aderir ao ensino integral, seja por iniciativa própria ou por indicação da Secretaria Municipal de Educação.

Já o Programa Mais Educação Infantil — que permite à Prefeitura contrate de forma emergencial instituições privadas de ensino para atender crianças de 4 a 5 anos — é um dos pontos mais criticados do projeto. Os contratos devem ser encerrados até o final do ano, após vagas na rede municipal serem disponibilizadas às crianças; o artigo, no entanto, tem sido tratado como uma compra de vagas nas escolas particulares, que enfrentam situação delicada por conta do coronavírus.

Ontem, em audiência pública da CCJ (Comissão de Constituição, Justiça e Legislação Participativa) e da Comissão de Educação, Cultura e Esportes, a vice-presidente da Aprofem (Sindicato dos Professores e Funcionários Municipais de São Paulo), Margarida Genofre, classificou a ideia como uma "privatização absurda", que visa "socorrer escolas particulares que estão perdendo alunos nessa pandemia".

"Existe uma pressão econômica das escolas particulares para resolver o problema delas, esse é o debate", disse hoje Antonio Donato, vereador pelo PT. "Quem conversa na periferia vê os pais apavorados, vê os profissionais de educação extremamente preocupados", disse o parlamentar.

"Projeto não dialoga com os professores, não dialoga com as mães, não dialoga com a saúde", disse Juliana Cardoso, também da bancada petista. "É um projeto que dialoga, principalmente, com a iniciativa privada."

Outra crítica, encampada principalmente por professores, sindicatos e vereadores alinhados à esquerda, é em relação ao dispositivo que permite contratar professores e auxiliares de educação de forma temporária. Os contratos de prazo determinado são considerados precários pelos professores e prejudicam os profissionais que prestaram concurso e aguardam chamamento, dizem os vereadores contrários ao projeto.

A Procuradoria da Câmara citou que o programa Programa Mais Educação Infantil cria uma espécie de "voucher" para as crianças de 4 e 5 anos e considerou a prática irregular. O órgão também afirmou que credenciar escolas particulares para repasse de verba pública é inconstitucional.

No parecer da vereadora Rute Costa, que relatou o projeto na CCJ, ela afirma que o "voucher" está em "sintonia com o ordenamento jurídico".

"Não vi inconstitucionalidade no projeto, não enxerguei, mesmo porque a ida das crianças às escolas é facultativa, não haverá reprovação", disse a relatora Rute Costa durante os debates de hoje na Câmara, quando questionada sobre as ilegalidades apontadas pela Procuradoria. "É uma forma sensível de a prefeitura enxergar a volta às aulas. Quem quiser e puder, mantenha as crianças em casa."

Os números da pandemia também foram citados por vereadores nas críticas ao projeto. Até ontem, a cidade registrava mais de 213 mil casos confirmados, e 9.540 vítimas da covid-19. Levando em consideração as mortes suspeitas, esse número sobe para 15.240 pessoas que morreram por conta do coronavírus.

Protesto

O projeto de retorno às aulas tem sido alvo de críticas de vereadores, sindicatos, professores e entidades representantes do setor. Mais cedo, professores da rede pública estadual de São Paulo realizaram um protesto contra a volta às aulas presenciais.

A manifestação começou nos arredores do Estádio do Morumbi, na zona sul de São Paulo, e rumou para o Palácio dos Bandeirantes, sede do governo paulista. A manifestação foi organizada pela Apeoesp (Sindicato do Professores do Ensino Oficial do Estado de São Paulo).

Em coletiva realizada quase que concomitantemente ao ato, o governador João Doria afirmou que a Apeosp "tem um viés político, não é de hoje". Em resposta à reivindicação de professores temporários que querem receber um auxílio, pois não conseguem receber se não lecionam, Doria disse que "não faz sentido que o dinheiro público seja utilizado para pagar quem não está trabalhando".