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Sem novas questões no banco, MEC deixa covid de lado e outros temas atuais

Segundo dia de aplicação do Enem teve perguntas de matemática e ciências da natureza  - Letícia Mutchnik/UOL
Segundo dia de aplicação do Enem teve perguntas de matemática e ciências da natureza Imagem: Letícia Mutchnik/UOL

Ana Paula Bimbati e Giorgia Cavicchioli

Do UOL, em São Paulo, e colaboração para o UOL, em São Paulo

28/11/2021 19h37

A falta de atualização do BNI (Banco Nacional de Itens), responsável pelas perguntas que formam o Enem (Exame Nacional do Ensino Médio), deixou a edição de 2021 sem perguntas com temas atuais, como a pandemia e a vacinação. Professores avaliam que a escassez do banco tornou a prova mais conteudista também, cobrando um conhecimento prévio dos alunos, sem apresentar fórmulas ou muitos contextos.

Para Fernando Santo, gerente de Inteligência Educacional e Avaliações do Poliedro, a prova de hoje pode ser caracterizada por "questões tradicionais". "Entretanto, vale a pena destacar a presença de questões mais conteudistas que demonstram uma escassez do banco nacional de itens e que podem apresentar um desafio maior ao estudante", explica.

Como exemplo, Santo citou uma das questões de física, que necessitava de uma fórmula para ser solucionada, e uma pergunta de matemática, que tratava de operações com números binários.

Marcelo da Silva Melo, professor de matemática do Curso e Colégio Objetivo, também conta que houve perguntas que tratavam do sistema de numeração. "Teve alguns exercícios bem trabalhosos, em que se precisava fazer muitas análises", afirma.

O UOL noticiou na semana passada que o banco de questões foi responsável por impedir o presidente Jair Bolsonaro (sem partido) de deixar a edição deste ano com a "cara do governo". O banco, no entanto, sofre com a escassez de itens. Servidores do Inep (Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais), órgão responsável pelo exame, dizem que não há garantia da alta gestão de que o processo será totalmente cumprido.

No momento, de acordo com apuração feita pela reportagem, professores escolhidos via chamada pública estão no processo de produção das questões. O que não se sabe até o momento é se há garantia de que esses itens sejam testados previamente.

Tanto o Inep como o MEC (Ministério da Educação) foram informados em fevereiro da falta de questões no BNI. Relatórios do mês em questão e de novembro alertavam para a necessidade de atualização do banco.

Na parte de ciências da natureza, havia perguntas a respeito da tragédia de Mariana, mas não de Brumadinho —que ocorreu mais recentemente. O exame também trouxe uma comparação da taxa de letalidade do ebola e da dengue. O coronavírus ficou de fora.

"Foram provas que seguiram o padrão dos últimos anos", afirma Gabryel Real, gerente de Processos Avaliativos do SAS Plataforma de Educação.

Na avaliação de Guilherme Francisco, professor de biologia do Curso e Colégio Objetivo, a prova do Enem foi bem diferente da tradicional, com temas clássicos, como ecologia, sendo pouco pedidos. "O assunto mais pedido foi botânica, que é um tema que caía muito pouco. Nesta prova houve uma quebra de expectativa. A prova foi de nível médio para difícil", avalia.

Para Rubens Oda, professor de biologia do Descomplica, a prova da disciplina trouxe "conteúdos esperados", "questões mais conteudistas, que não mediam habilidades, mas conteúdos prévios dos alunos".

Uma pergunta sobre a Copa do Brasil só trazia os campeões até 2018.

Segundo Gabriela Toti, professora de química do Curso e Colégio Objetivo, a prova deste ano teve enunciados mais curtos, mas não necessariamente com as respostas já colocadas no texto. "Isso quer dizer que o aluno teria que interpretar o texto muito bem e ter conhecimento específico em química para que ele pudesse responder as questões", diz.

"Em geral, foi uma prova de nível médio. As questões foram muito bem elaboradas e com poucos cálculos. Demandava pouco tempo de resolução. O aluno que estivesse bem preparado faria essa prova rapidamente e se daria bastante bem", afirma.

De acordo com Ricardo Helou Doca, professor de física do Curso e Colégio Objetivo, a prova merece elogios. "Uma prova bem dosada, com 15 questões, versando sobre todo o programa do ensino médio. Sem nenhum problema de interpretações dúbias ou qualquer coisa do gênero", avalia.

A escassez de perguntas, na avaliação de Daniel Perry, diretor do Curso Anglo, deve afetar as próximas edições do Enem. "Os temas debatidos são temas atuais, mesmo que não sejam relacionados com episódios ocorridos neste ano. Muitos desses assuntos já são analisados e são problemas há algum tempo e continuam atuais, como o racismo, pautas ligadas às mulheres, indígenas e meio ambiente", diz.

Respostas de duas perguntas podem confundir alunos

Para o professor Melo, a questão da Copa do Brasil apresenta um problema por não ter uma resposta. "Seria a alternativa E, se no lugar da primeira fração no lugar de nove fatorial sobre três fatorial, fosse sete fatorial sobre dois fatorial", explica.

Uma outra pergunta, a 176 do caderno amarelo, também pode gerar respostas diferentes. "A questão que fala sobre aplicativos, do jeito que falaram sobre a taxa, pode confundir o aluno entre a resposta A e a resposta E", afirma.

O gabarito oficial deve ser divulgado na quarta-feira (1º). O UOL corrige a prova com gabarito extraoficial feito em parceria com o Objetivo.

Como foi o exame?

A prova transcorreu sem graves incidentes. Houve um aluno picado por escorpião em Goiás, mas ele pode pedir reaplicação, a acontecer em janeiro do ano que vem. Mesmo caso dos candidatos do Complexo do Salgueiro, no Rio, que foram afetados pela operação policial em São Gonçalo, na região metropolitana no último domingo (21), deixando ao menos nove mortos.

Ao todo, 3,1 milhões de pessoas se inscreveram para as versões impressa e digital, que são feitos simultaneamente pela primeira vez. Mas houve menor comparecimento hoje, normal para o segundo dia de aplicação porque alunos que acharam ter ido mal já não vão ao domingo seguinte.

Segundo o Inep, houve uma falha técnica de conectividade ocorrida no Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia do Sertão Pernambucano, em Petrolina (PE), que impossibilitou a realização digital da prova. Os alunos que ficaram sem fazer a prova também podem pedir reaplicação.

A maioria dos estudantes ouvidos pelo UOL consideraram a prova mais fácil do que a da semana passada. Em contrapartida, houve estudantes que sentiram mais evidentes suas deficiências nos estudos. Além disso, muitos criticaram os enunciados das questões de hoje, voltadas para matemática e ciências da natureza.