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Após dez anos, CEUs ainda precisam trabalhar em rede e integrar comunidade

Marcelle Souza

Do UOL, em São Paulo

01/08/2013 06h00

No dia 1º de agosto de 2003, cerca de 8.000 pessoas acompanharam a inauguração do primeiro CEU (Centro Educacional Unificado), em Guaianases, zona leste de São Paulo. Dez anos depois, os 45 equipamentos previstos no projeto original foram construídos, mas falta integração da rede para cumprir seu objetivo.

10 anos de CEUs

  • Junior Lago/UOL

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  • Sergio Lima/Folhapress

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Realizados em diferentes gestões e com plantas diversas, os CEUs funcionaram nos últimos anos de forma desarticulada, tanto na rede, quanto entre as escolas que o compõem, segundo especialistas ouvidos pelo UOL.

“Falta uma política central articuladora dessas potencialidades [esporte, cultura e educação], não dá pra tratar as escolas do CEU com as outras da rede”, afirma Rosa Maria de Freitas Rogerio, doutoranda pela Faculdade de Educação da USP.

Reinaldo Pacheco, pesquisador do tema, concorda com o diagnóstico. “Hoje os CEUs dependem muito do tipo e das pessoas que estão lá. Em alguns lugares, as equipes são mais afinadas com as demandas comunitárias, em outros, não. Não criou de fato uma rede, falta integração interna do equipamento, uma articulação da proposta política da educação”, afirma.

Sobre o problema apontado pelos especialistas, a Secretaria de Educação afirma que pretende melhorar a integração entre CEUs e capacitar gestores e coordenadores desses equipamentos. “Estamos iniciando um grande processo de formação das pessoas envolvidas com os CEUs, é uma formação em gestão, mas que passa por linguagem artística, esportiva e pelos projetos das bibliotecas. A nossa diretriz é que todos trabalhem coletivamente com um objetivo comum”, afirma Martha de Betânia Juliano, coordenadora dos CEUs.

Aumento do acesso

Os centros foram projetados como unidades que reúnem educação, esporte e cultura em regiões periféricas da cidade. São formados por um CEI (Centro de Educação Infantil), uma Emei (Escola Municipal de Educação Infantil) e uma Emef (Escola de Ensino Fundamental). Todos os CEUs possuem ainda uma biblioteca, um teatro, quadra esportiva e um telecentro.

A escolha da localização dos espaços levou em conta o cruzamento de dados como IDH (índice de desenvolvimento humano), demanda escolar, falta de equipamentos esportivos e culturais, e desemprego. “Os CEUs estão em áreas onde você identifica bolsões de pobreza. Quando foram planejados, era importante otimizar a aplicação dos recursos em determinadas áreas”, afirma Maria Aparecida Peres, que foi secretária de Educação em 2003 e 2004.

CEUs em São Paulo

RegiãoCEUs
zona leste18
zona norte7
zona oeste3
zona sul17
centro0

Desde 2003, o projeto aumentou significativamente o número de bibliotecas, de teatros e de locais de acesso gratuito à internet. “A gente percebe o impacto que esses espaços causaram na periferia de São Paulo. Em lugares onde havia só mato, agora existe um local de lazer e de convivência. Foi um impacto urbano e cultural, que trouxe milhares de possibilidades e mudou a cara da comunidade”, avalia a pesquisadora da USP.

Apesar de se concretizarem como polos esportivos e de cultura, há críticas em relação ao projeto arquitetônico e à própria proposta dessas unidades.

“O CEU não cumpriu a função de atingir todas as crianças com uma escola boa e de qualidade, de zerar o déficit de vagas. A opção foi por um grande equipamento que teria que cumprir outras demandas de educação não formal. Só que essa carência poderia ter sido cumprida de outra forma, revitalizando as escolas já existentes e abrindo novas casas de cultura”, diz Pacheco.

O atual prefeito de São Paulo, Fernando Haddad, prometeu a construção de 20 novos CEUs em seu Programa de Metas 2013-2016. Para isso, a atual gestão pretende transformar equipamentos onde funcionam clube-escolas ou clubes da comunidade em CEUs. Os recursos para a expansão devem vir do MEC (MInistério da Educação), segundo o prefeito. 

Sem continuidade

Outro ponto importante, de acordo com os especialistas, é que o projeto perdeu a articulação com outras secretarias e hoje se concentra sob a gestão somente da Secretaria de Educação. A justificativa é que não se pode pensar em um equipamento com demandas culturais e esportivas, entre tantas outras, apenas do ponto de vista educacional.

Histórico
21 CEUs foram construídos nos anos 2003 e 2004, na gestão da prefeita Marta Suplicy. Eles têm em média 14 mil m²
24 CEUs foram inaugurados entre 2007 e 2009, durante a gestão de Gilberto Kassab. Eles possuem em média 11 mil m²
O atual prefeito, Fernando Haddad, anunciou que vai contruir mais 20 CEUs em seu mandato

Hoje parte da programação dos CEUs é decidida pela secretaria e parte pela unidade, que seleciona os pedidos da população.

Além disso, algumas unidades ainda não são usadas em sua totalidade, como em São Mateus, onde faltam manutenção e projetos que desenvolvam a comunidade local. Nos CEUs da primeira fase, por exemplo, há uma padaria, uma cozinha industrial pensada para ser usada em cursos de especialização técnica. Na maioria deles, como no Campo Limpo, o espaço foi fechado por falta de parcerias.

A secretaria afirma que está fazendo um mapeamento desses espaços nos CEUs da cidade e que pretende realizar parcerias com empresas e com o Senai (Serviço Nacional de Aprendizagem Industrial) para a implementação de cursos profissionalizantes. “A ideia é começar a envolver mais as secretarias do Esporte e da Cultura nos CEUs, além de trabalhar em comunhão com outros órgãos, em projetos de saúde na escola, trabalho e geração de renda, direitos humanos, por exemplo”, diz a coordenadora dos CEUs.

Comunidade deixou de ser o centro

Os primeiros projetos do CEU contaram com participação efetiva das comunidades, que montaram comissões para discutir as demandas de cada região. Em alguns casos, os projetos iniciais foram alterados, como a mudança do teatro e a inclusão de pistas de skate.

Em alguns lugares, a participação ativa dos moradores foi reduzida gradativamente, com extinção das assembleias com a comunidade e a redução dos poderes do conselho gestor. “É preciso resgatar a ideia do CEU como um grande centro integrador da comunidade”, defende Rosa.

Para tentar se aproximar dos moradores, a secretaria afirma que vai investir mais na participação da comunidade.