Eletricidade, uma breve história: da Antiguidade ao fim do século 19

Não há como pensar na vida atual sem pensar no uso da eletricidade. Olhando à nossa volta, identificamos dezenas de aparelhos que funcionam diretamente com eletricidade (celulares, televisores, rádios, computadores...), e outros que funcionam indiretamente (fogões, automóveis...).

Mas, se nos ativermos aos conceitos físicos mais profundos, perceberemos que todas as coisas (veja bem: eu disse todas as coisas), de uma lâmpada a um gato, só existem e só funcionam devido à eletricidade, visto que o homem sabe, atualmente, que os átomos (ou as partículas elementares) possuem características elétricas (cargas).

Contudo, nem sempre soubemos disso. O homem investiga a natureza há muito tempo -e os conceitos formulados atualmente já passaram por diversas mudanças. Vejamos alguns aspectos dessa longa caminhada.

Da curiosidade humana primitiva ao conhecimento na Antiguidade

Relâmpagos
Relâmpagos Imagem: Xuân Thong Tran/Pexels

É difícil definir quando o homem passou a se interessar pelos fenômenos naturais, incluindo os elétricos. Os relâmpagos, por exemplo, constam em vários textos religiosos antigos como manifestações de deuses ou punições divinas. O peixe-elétrico também aparece na lista de observações, com referências curiosas em textos egípcios de antes de 2.700 a.C.

Mas é na Grécia que surgem os primeiros estudos mais sistematizados sobre eletricidade, quando Tales (600 a.C.) descreve observações feitas sobre o âmbar -que em grego se escreve (elektron)-, resina proveniente de algumas árvores, que ficava eletrizada quando friccionada e atraía folhas, penas e outros objetos leves (algo semelhante ao que acontece quando a televisão é desligada e, ao aproximarmos o braço da tela, nossos pelos são atraídos). Dessa forma, podemos dizer que a eletricidade nasce como o estudo dos fenômenos associados ao âmbar.

Por outro lado, fenômenos magnéticos eram observados em ímãs (pelos gregos, por chineses e por indianos, séculos antes de Cristo), e a construção das primeiras bússolas data desse período. Contudo, a compreensão de que o magnetismo e a eletricidade são fenômenos de mesma origem só vai ser concluída nos séculos 19 e 20.

Da decadência do Império Romano ao fim da Idade Média

A partir do fim do Império Romano, nos primeiros séculos depois de Cristo, a ascensão da religião cristã, tornando-se diretriz dominante da vida ocidental, e o incêndio criminoso na Biblioteca de Alexandria levam a uma diminuição das pesquisas científicas. E a Europa passa por um longo período sem desenvolver estudos sobre a eletricidade.

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No entanto, nesse mesmo período, árabes, indianos e chineses continuam fazendo pesquisas científicas: a bússola passa a ser utilizada na navegação marítima (pelos asiáticos) e a matemática é aprimorada no que diz respeito à álgebra, aos algoritmos e aos sistemas de numeração (pelos árabes).

Do Renascimento à Idade Moderna

A partir do século 13, os europeus voltam a explorar o mundo da ciência. Depois de redescobrirem as teorias da Antiguidade, passam a desenvolver a física da forma como estamos acostumados hoje: baseada em observação, teorização, sistematização e previsão de fenômenos.

O físico inglês William Gilbert (1544-1603) escreve em latim e publica, no ano de 1600, o "De Magnete, Magneticisque Corporibus, et de Magno Magnete Tellure" (Sobre o Magnetismo e os Corpos Magnéticos, e Sobre o Grande Magnetismo da Terra). Paralelamente, no decorrer do século 17, alguns físicos continuam os estudos de Tales sobre a eletricidade estática (eletrostática), como o alemão Guericke (1602-1686), na região em que hoje é a Alemanha, e Boyle (1627-1691), na Irlanda.

Além deles, no final desse mesmo século surgem trabalhos publicados por Gray (1666-1736) na Inglaterra, sobre a movimentação e a fluidez das cargas (eletrodinâmica), e por Du Fay (1698-1739), na França, sobre a possibilidade de existirem cargas diferentes (positiva e negativa) nos corpos eletrizados.

No século 18 temos Benjamin Franklin (1706-1790), que trabalha em diversas pesquisas sobre a conservação das cargas, nos EUA, e Galvani (1737-1798), na Itália, desenvolvendo pilhas e descobrindo a íntima relação entre eletricidade e biologia, no que diz respeito ao funcionamento dos músculos (bioeletricidade). Alessandro Volta (1745-1827), também na Itália, constrói as primeiras pilhas, na forma de dispositivos de armazenamento das cargas elétricas, mais eficientes do que os antigos geradores eletrostáticos.

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Século 19

No início do século 19, o dinamarquês Öersted (1777-1851) percebe que existe uma forte relação entre condutores elétricos e materiais magnéticos (a bússola, em especial). Então, o campo de estudo do eletromagnetismo começa a ser explorado com mais afinco. Nessa mesma época, Ampère (1775-1836), na França, amplia o conhecimento sobre a relação entre carga elétrica em movimento e magnetismo. Já Faraday (1791-1867), um inglês, trabalha com a ideia de campo elétrico e campo magnético, construindo os primeiros motores elétricos da história.

Além destes, Ohm (1789-1854), na Alemanha, desenvolve circuitos elétricos e estuda a relação entre dispositivos elétricos, corrente elétrica e tensão, o que permitiu a Nikola Tesla (1856-1943), na Sérvia, desenvolver motores mais consistentes, baseado no estudo aprimorado dos campos elétrico e magnético.

Ainda no final de século 19, o físico e matemático escocês Maxwell (1831-1879) formula as bases matemáticas da teoria do eletromagnetismo, quando justifica as relações existentes entre eletricidade e magnetismo, seja materialmente, com as cargas, seja eletromagneticamente, com os campos. Prevê também a existência das ondas eletromagnéticas, mais tarde confirmadas por Hertz (1857-1894), e que hoje permitem que utilizemos celulares, GPS, TVs, rádios, etc.

Muitos outros físicos, químicos e cientistas que trabalharam com eletricidade, direta ou indiretamente, não foram citados aqui -como Edison, Einstein, Planck, Gauss, etc.-, bem como muitas teorias (a eletrodinâmica quântica, a relatividade, a radioatividade, etc.). Ainda assim, espero que esta breve história tenha aguçado um pouco mais o seu interesse em conhecer a natureza.