Com problema em apps, mães não conseguem comprar uniforme e itens escolares
Até o ano passado, a atendente Suelen Santos, mãe do Rafael, 8, e do Lucas, 7, retirava os uniformes dos filhos direto na Escola Municipal Doutor Fábio da Silva Prado, na Mooca, zona leste de São Paulo. Em 2021, a prefeitura decidiu mudar a entrega e disponibilizou aplicativos para compra das roupas e materiais escolares.
A nova medida, no entanto, tem trazido "mais problemas do que soluções", segundo Suelen, que tem dificuldades para conseguir comprar os uniformes. "Já liguei na prefeitura, na escola e na empresa do aplicativo. Na última vez, disseram que o dinheiro não estava liberado e que estaria disponível no dia 31 [de julho], mas ainda não aconteceu", contou.
Suelen diz que é "jogada de um lado para o outro" sem respostas da gestão de Ricardo Nunes (MDB), nem do aplicativo ou da escola. "Tenho duas crianças matriculadas e até agora não consegui o uniforme."
Seus filhos estão participando das aulas presenciais desde abril e, ela afirma que tem gastado mais no orçamento mensal para manter os filhos na escola com roupas confortáveis.
Um levantamento prévio do TCM (Tribunal de Contas do Município) de São Paulo, divulgado em junho, já apontava que 89% dos alunos da capital estavam com problemas para comprar o uniforme pelo aplicativo. A pesquisa foi respondida por mais de 2 mil famílias.
O principal problema apresentado pelos pais, segundo o órgão, foi a indisponibilidade do valor no aplicativo. A secretaria afirma que é importante manter os dados cadastrados para que os benefícios sejam ofertados.
Dentro dessa estatística também está a desenvolvedora de site Carolina Borges. Ela contou que fez a atualização dos dados, conforme pede o município, mas não teve o dinheiro liberado para a compra de uniformes. "A resposta é que a prefeitura precisa liberar o dinheiro", completa.
Procurada pela reportagem, a SME (Secretaria Municipal de Educação) disse que precisava dos documentos das mães ouvidas para apurar os casos. Para proteger as fontes, o UOL não repassou todos os dados.
O caso da Carolina foi o único respondido pela pasta. Segundo a prefeitura, o dinheiro está disponibilizado e um novo e-mail foi cadastrado para o recebimento dos créditos.
A desenvolvedora de sites confirmou que recebeu uma ligação da pasta na quinta-feira (5), depois que a reportagem entrou em contato com a secretaria. Ela aguardava o dinheiro ser depositado no aplicativo, até a última atualização deste texto.
A designer de unhas Jaqueline Bispo, mãe da Laura, de 2 anos, foi até um mutirão da prefeitura e foi informada que o crédito para a compra de uniformes seria liberado na última sexta-feira (6). "Achei estranho, porque as aulas começaram no dia 2", contou. O valor, no entanto, não foi liberado na data prometida.
Para as mães, o uso de dois aplicativos dificultou o processo para adquirir o uniforme e material escolar. Para Suelen, por exemplo, a retirada dos itens na escola, como foi feita até o ano passado pela rede municipal, era mais "prática" e "rápida".
"Além de ter um celular com memória que caiba o aplicativo, o responsável precisa saber ler, ter internet. É restritivo para algumas famílias e deveria ser uma política que garantisse acesso para todos", argumenta Carolina. Ela é responsável pela página Ocupa Mãe, que reuniu relatos de outras famílias que enfrentam o problema neste ano.
Questionada sobre a mudança da entrega dos benefícios e como famílias sem celular ou internet seriam atendidas, a prefeitura se limitou a dizer que a "aquisição descentralizada dá maior poder às famílias", já que elas podem escolher os materiais que precisam e os tamanhos corretos dos uniformes.
As centrais de ajuda, oferecidas pelo município, se limitam ao site, e-mail ou telefone, ou seja, todas dependem de um aparelho celular ou internet.
O Mercado Pago, responsável pelo aplicativo de uniforme, disse que a liberação dos créditos às famílias acontece assim que o usuário realiza a criação da conta e validação dos dados.
A empresa explicou também que o valor disponível não aparece como saldo na conta e, sim, como um banner que traz o benefício. "Ou seja, mesmo com o saldo da conta zerado, o usuário pode estar com o valor ativo para uso."
Os valores, segundo o aplicativo, são enviados para o email cadastro na SME. A empresa disponibiliza a central de atendimento 0800 858 800 para tirar dúvidas dos responsáveis.
Sem uniforme, sem material escolar
A filha de Raquel —outra mãe que aceitou falar com a reportagem, mas sem a publicação de seu sobrenome—, foi prejudicada duplamente. O dinheiro dos dois benefícios, de uniforme e material escolar, não estão disponíveis nos aplicativos.
As respostas que recebe, porém, são as mesmas das outras mães. "O pessoal do aplicativo fala que tenho que ligar no 156 e lá dizem que a escola precisa liberar uma senha, mas não disseram nada disso na reunião de pais [que ocorreu na quinta-feira passada]", conta.
O mesmo levantamento do TCM apontou que 71% das famílias não compraram o material escolar, porque não têm o valor disponível no aplicativo. Assim que têm a verba creditada, os responsáveis precisam se deslocar para um fornecedor credenciado para fazer a compra dos itens.
A prefeitura liberou R$ 387,10 para a compra dos uniformes e para adquirir o material varia de R$ 33,40 a R$ 178,41, conforme a etapa escolar.
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