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Vestibulandos, concurseiros e alunos com a "letra feia" procuram aulas de caligrafia em SP

Suellen Smosinski

Do UOL, em São Paulo

06/09/2012 06h00

Há quase 100 anos a família De Franco se dedica ao ensino da caligrafia. Eles já tiveram mais de uma escola na capital paulista - hoje, apenas uma unidade continua funcionando. Mas, será que em um “mundo cada vez mais conectado”, em que crianças interagem logo cedo com tablets e computadores, alguém ainda se preocupa em ter uma boa letra? Em meio a pilhas de exercícios de caligrafia, a resposta para o professor Antônio De Franco Neto é sim.

“Eu considero a tese de substituição da escrita pelas teclas do computador um erro crasso. Se isso acontecer e daqui a dez anos faltar o computador, as pessoas não vão saber nem segurar uma caneta”, afirmou De Franco. “A pessoa se comunica ou falando ou escrevendo. Quem tem uma letra feia, tem 50% da sua comunicação prejudicada”, completou.

Comunicação x Arte

Para Silvia Colello, professora da pós-graduação da Faculdade de Educação da USP (Universidade de São Paulo), é importante distinguir o que é comunicação e o que é arte. “Às vezes a letra é feia, mas você consegue entender sem problemas”, disse.

 

A professora avalia que a preocupação com a letra já foi tão grande no país, que a educação ficava centrada nisso. A caligrafia já foi ensinada nas escolas brasileiras, mas não é mais uma disciplina obrigatória.

 

Para a professora, a possibilidade de ler um texto, a chamada legibilidade, é uma questão importante que deve ser garantida na escola, “mas não deve se sobrepor ao que a língua tem de mais importante, que é a possibilidade de dizer, de tornar os alunos senhores das suas palavras”.

 

“Legibilidade passa a ser um dos critérios, pois de nada adianta ser senhor da sua palavra, se ninguém consegue ler o que você escreve. A escola deve garantir a formação do sujeito leitor e escritor e trabalhar a legibilidade”, disse a professora, que também é autora do livro “A Escola que (não) Ensina A Escrever” (Summus Editorial).

Segundo o professor, a escola tem uma média de 1.000 alunos por ano. Ele estima que pelo menos metade dos estudantes são vestibulandos: “Uma letra bonita, não que vai melhorar a nota, mas faz com que o examinador tenha um entendimento melhor da capacidade do vestibulando. Um professor com três mil provas para corrigir não vai poder se dar ao luxo de tentar interpretar o que a pessoa quis dizer”, afirmou.

Pessoas que costumam prestar concursos públicos, conhecidos como concurseiros, também estão entre os interessados nas aulas. “Como eu faço muito concurso, sentia falta de uma letra melhor. Sempre pensei em fazer o curso, mas deixava pra lá. Minha letra é muito feia, precisei tomar um pouco de vergonha na cara”, contou Karen Sato, 34, funcionária pública, que começou as aulas de caligrafia há menos de um mês e já sente diferença na escrita. 

O estudante Rodrigo Alves, 13, que está na 7ª série, teve sua primeira aula de caligrafia no dia 28 de agosto. “Ele reclamou que a professora dava nota baixa porque não entendia a letra dele”, contou Lidia Alves, 50, mãe do aluno. Ela acredita que antigamente as escolas davam mais atenção para a caligrafia e diz que por mais que “exista o computador, a escrita é eterna”.

Curso por correspondência

Além das aulas presenciais, também é possível fazer o curso de caligrafia por correspondência. Para De Franco, esse é um exemplo de que a tecnologia, ao invés de acabar com a escrita, pode auxiliar no seu ensino. “A tecnologia favorece a interação entre as pessoas. No curso a distância, o primeiro contato é feito pela internet. Depois o material é enviado pelo correio e volta para correção”, disse o professor.