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Sucesso nos EUA, cursos abertos online não empolgam na Europa

D.D. Guttenplan

Do International Herald Tribune, em Londres

21/02/2013 06h00

Desde que o cientista de computação alemão Sebastian Thrun enviou um email em 2011 anunciando que seu curso na Universidade de Stanford na Califórnia (EUA), “Introdução à inteligência artificial”, seria disponibilizado gratuitamente online, o mundo da educação está ao mesmo tempo entusiasmado e aterrorizado com o advento de grandes cursos online abertos, os chamados MOOCs (Massive Open Online Courses – ou cursos online amplos e abertos).

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  • stu_spivack/Flickr

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O tamanho do público potencial foi uma revelação: mais de 160.000 estudantes de 190 países se inscreveram, levando o Dr. Thrun a deixar seu emprego a abrir sua própria empresa de ensino online, a Udacity.

Os três grandes nomes de cursos online são a Udacity, a Coursera, fundada por dois outros professores de Stanford, e a edX formada por Harvard e o MIT (Instituto de Tecnologia de Massachusetts.)

Dos 248 alunos que receberam as notas máximas no curso do Dr. Thrun, nenhum era de Stanford, o que fez alguns se perguntarem se as universidades americanas de elite não estavam deixando passar potenciais talentos. E as universidades que não fizeram MOOCs temeram perder o barco.

A ansiedade ficou aparente neste mês em uma conferência na Universidade de Londres, que está no ramo de ensino à distância desde 1858, como lembrou o novo vice-reitor da universidade, Adrian Smith. Salientando que há 52.000 alunos inscritos nos programas internacionais da universidade –que fazem as mesmas provas que seus colegas em Bloomsbury e recebem um diploma da Universidade de Londres- Smith disse: “houve muito frisson” em torno dos cursos online.

“Entretanto, ignorá-los é um risco”, disse ele. “Os desafios que impõem ao modelo clássico de transmissão de conhecimento em sala de aula são óbvios. A questão não é mais se devemos considerar os MOOCs, mas com que velocidade devemos nos envolver” no movimento.

Enquanto o ambiente em torno dos cursos abertos nos Estados Unidos lembra os primeiros estágios de um boom de petróleo, a reação na Europa parece distintamente cautelosa.

William Lawton, diretor do grupo de pesquisa britânico Observatory on Borderless Higher Education, que organizou a conferência, disse que os MOOCs nasceram do movimento por fontes abertas de aprendizado.

“Originalmente, a ideia era ampliar o acesso aos cursos de elite”, disse ele. “Mas será que ainda estamos falando de ampliação do acesso quando cada vez mais os empreendimentos giram em torno de novos modelos de negócios e de vantagens competitivas?”

Muitos dos delegados compartilharam o ceticismo de Lawton. John Zvereff, administrador da Universidade Aberta da Catalunha (UOC), em Barcelona, disse que sua universidade, que oferece todas as suas aulas online desde 1995, achou a corrida para os cursos online prematura.

“A Europa está tentando desesperadamente recuperar o tempo perdido”, disse ele. “A Associação Europeia de Universidades de Ensino à Distância está promovendo uma plataforma europeia de MOOCs. Tudo parece ser um modelo de negócios”.

“Acho que devemos responder aos desafios ao modelo de aprendizado”, disse Zvereff. “Na UOC, nossa filosofia se baseia no acompanhamento –cada aluno tem um tutor que fica com ele ou ela até o final da graduação. Até onde eu sei, ninguém nos MOOCs oferece algo assim”.

Drummond Bone, da Universidade de Oxford, disse à conferência que sua universidade “está fortemente associada ao aprendizado face a face, de um a um” e provavelmente não iria mudar.

Mas para as outras universidades europeias, mesmo as bem estabelecidas, a tentação de entrar no trem dos cursos abertos foi irresistível. A Universidade de Edimburgo, fundada em 1583, talvez seja jovem se comparada com Oxford. Mas com 12 candidatos por cada vaga, não faltam alunos.

De acordo com Sarah Gormley, diretora de ensino à distância os primeiros seis cursos online de Edimburgo entraram ao vivo no Coursera no dia 28 de janeiro. Uma semana depois, 295.000 alunos haviam se inscrito para cursos que iam desde filosofia (60.000 alunos) até nutrição equina (20.000).

O esforço até agora custou “algo em torno de seis dígitos –menos de sete- sendo a maior parte em tempo do corpo docente”, disse ela.

Para Edimburgo, o investimento inicial se pagou belamente, no mínimo como exercício de marketing. Mas nem sempre é assim.

Investimento arriscado

Como disse o Dr. Lawton em um documento distribuído aos participantes, o Fathom, um empreendimento online de ensino a distância da Universidade de Columbia em Nova York, iniciado em 2000 com US$ 18 milhões (em torno de R$ 36 milhões) –com parceiros como a Escola de Economia e Ciências Políticas de Londres, Cambridge University Press e a British Library- foi desfeito em 2003 por falta de interesse.

No Reino Unido, o governo investiu 20 milhões de libras, ou cerca de US$ 31 milhões em dinheiro público na UKeU, uma plataforma que reuniu um total de apenas 900 alunos quando inaugurada em 2004.

Um tropeço mais recente ocorreu no Instituto de Tecnologia da Georgia, que poucos dias antes da conferência teve que retirar um MOOC do Coursera que, coincidentemente, se chamava “Fundamentos da Educação Online”, depois que problemas técnicos impediram que os alunos tivessem acesso aos materiais do curso. O exemplo ressaltou os riscos envolvidos nesses empreendimentos.

Como vários participantes da conferência salientaram, seja no caso de uma universidade tentando ampliar o acesso, ou divulgar a qualidade de seus palestrantes, ou identificar potenciais alunos pagantes, o apelo dos cursos abertos depende de sua capacidade em gerar uma grande resposta. Qualquer coisa menor arrisca um embaraço público e perda financeira –o que pode explicar por que as escolas parecem preferir ingressar em consórcios existentes.

Veronica Campbell, diretora de estudos de graduação no Trinity College em Dublin, disse que sua escola não tinha cursos abertos online, nem planos de oferecê-los, mas que “há um temor de ficar para trás”, então estão pensando no que fazer.

Houve amplo interesse na conferência pelo Futurelearn, um estreante britânico patrocinado pela Universidade Aberta de Londres, que tem experiência tanto em ensino à distância quanto em recursos de educação aberta, mas cujo esforço de MOOC até agora consiste de pouco mais que um site e um comunicado à imprensa.

Além do interesse, há também uma suspeita. As universidades europeias foram relativamente rápidas em entrar para o movimento de softwares educacionais abertos, que colocou milhares de palestras e cursos gratuitos online. O site OpenCourseWare Consortium tem versões em inglês, chinês, francês, japonês, coreano e espanhol; há 22 instituições participantes só na Espanha.

Resistência

Mas para alguns europeus, os MOOCs representam um passo atrás. Em vez do idealismo das palestras abertas, têm-se agora os valores do mercado.

A Udacity é financiada pela firma de capital de risco Andreessen Horowitz, que investiu no início do Skype e do Twitter. E apesar dos cursos da Udacity continuarem gratuitos, a empresa anunciou recentemente uma parceria com a firma de ensino Pearson para dar aos alunos a opção de pagar US$ 80 por um exame supervisionado. A Coursera, que como a Udacity é uma empresa financiada por uma firma de capital de risco do vale do Silício, a Kleiner Perkins Caufield & Byers, pode gerar receita licenciando os cursos de seus membros para outras escolas.

Para Hugh Starkey, professor do Instituto de Educação da Universidade de Londres, toda a conversa sobre ampliação de acesso foi apenas uma isca.

Os cursos abertos online estão sendo promovidos por “corporações como a Pearson que querem quebrar o monopólio que as universidades sempre tiveram nas avaliações e introduzir seus fracos exames de múltipla escolha”.

“Não acho que ninguém da Pearson concordaria com isso”, disse Jeff Borden, diretor de ensino online da Pearson, que fez um discurso sobre inovação que atraiu aplausos entusiasmados dos delegados.

Mas foi Campbell do Trinity College Dublin que dirigiu-se a muitas das instituições tentando decidir se este é um movimento que podem se dar ao luxo de entrar –ou de perder. “Se todos entrarem para os MOOCs, os MOOCs ainda existirão?”, perguntou.

Tradução: Deborah Weinberg