Aluna de escola privada vê privilégio; jovens na pública relatam despreparo
O segundo Enem (Exame Nacional do Ensino Médio) durante a pandemia do novo coronavírus expôs as desigualdades do ensino no Brasil.
Enquanto em colégios particulares houve rápida adaptação e acesso a equipamentos para estudar, nas escolas públicas se acentuaram os problemas com conexões, falta de conteúdo e a demora em começarem as aulas remotas.
Bianca de Santana Monteiro, 17, reconheceu seu privilégio. A jovem, que presta o vestibular pela primeira vez para arquitetura, diz que ter acesso a um computador e ter internet estável foram fundamentais para seu êxito.
"Eu me preparei só com as aulas do terceiro ano do ensino médio. Tive a sorte de ter acesso à internet, porque ela era necessária todos os dias, e de uma escola bem preparada", conta ela, que estudou a vida inteira em colégios particulares.
Ela diz que isso a coloca na frente dos outros competidores. "Também estudei sozinha, mas vencemos todos os desafios", afirma.
Já Gabriela Cunha, 19, aluna do terceiro ano da Escola Estadual Infante Dom Henrique, em Copacabana, na zona sul do Rio, veio para o segundo dia do Enem sem muita expectativa de pontuação para o curso de engenharia mecânica.
Diz que a pandemia prejudicou bastante o aprendizado dos últimos dois anos, principalmente para alunos da rede pública.
O ensino médio público já não dá muita base para o Enem e na pandemia foi ainda pior. Tive muita dificuldade. Em casa não é o ambiente propício para estudar o tempo todo, muito fácil desfocar do estudo, a rotina mudou, muita gente passou a madrugar. Até voltar ao ritmo vai demorar."
Gabriela Cunha, estudante do Rio
Sem esperança, diz que vai se inscrever para a edição do ano que vem. "Este ano vai servir só de teste."
Só com cursinho para tentar de novo
A estudante Juliana Serrão, 18, tenta seu terceiro Enem. Para ela, os estudantes do ensino público do interior do Amazonas enfrentam desvantagens.
Ela concluiu o ensino médio em 2019 no município de Urucará, a 260 km de Manaus, e neste ano pagou um cursinho na capital para ter chance de um melhor desempenho e uma vaga em medicina, sabendo que enfrenta grande concorrência.
Quando eu vim fazer o cursinho em Manaus, aprendi muitas coisas que nunca tinha visto.
Juliana Serrão, que estuda no Amazonas e tenta o Enem pela 3ª vez
Outra desvantagem que ela relata foi com a pandemia. Diz que 2020 foi um ano perdido: "não tive como focar". Como o Amazonas enfrentava colapso nos hospitais e falta de oxigênio, as provas foram adiadas de janeiro para fevereiro.
Neste ano, Juliana disse que teve aula presencial no cursinho, se dedicou e está mais confiante. "Mas estou nervosa. Nem consegui comer antes de vir."
A amiga Gabrielly de Oliveira, 17, faz o Enem pela primeira vez e diz que ainda não escolheu o curso. Quer aguardar o seu desempenho e acredita ser melhor na área de humanas.
Para ela, a prova de domingo passado foi frustrante porque não caíram os assuntos esperados por ela e foi muito longa. "Fiz simulados, mas não eram assim com tanta interpretação de texto", conta. "Além disso, faltou tempo para analisar com mais cuidado pelo menos dez questões."
Jovem no Rio: 'Não tive o 3º ano'
Mylena Almeida de Oliveira, 18, concluiu o ensino médio neste ano no Colégio Pedro 2º e citou as dificuldades do ensino remoto na rede pública como fatores negativos na preparação para o Enem
"O isolamento começou em março do ano passado. Demorou para começar a aula remota. Levou uns três, quatro meses e foi bem ruim. Acabou que todo mundo foi aprovado. O terceiro ano, que é um ano de revisão, eu não tive."
Mylena dividia ainda o tempo entre estudo e trabalho. "Começava às 7h em uma barraca de praia no Leblon e estudava à noite", diz.
Apesar das dificuldades, a estudante está otimista para ingressar no curso de história ou museologia. Na prova passada a maior dificuldade no exame foi concluir a redação. "Me enrolei com o tempo", explicou.
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