Gabinete paralelo de pastores controla agenda e verba do MEC, diz jornal
Um grupo de pastores ligados ao ministro da Educação, Milton Ribeiro, lidera um gabinete paralelo que tem o controle da agenda e até do orçamento da pasta, segundo reportagem publicada hoje pelo jornal O Estado de S. Paulo.
O grupo é liderado pelos pastores Gilmar Silva dos Santos, presidente da Convenção Nacional de Igrejas e Ministros das Assembleias de Deus no Brasil, e Arilton Moura, assessor de Assuntos Políticos da entidade. O ministro Ribeiro também é pastor.
Conforme a apuração, eles não têm vínculos com a administração pública nem com o setor de ensino, mas possuem trânsito livre no ministério, facilitando o acesso de outras pessoas a Ribeiro, além de participarem de reuniões fechadas em que são discutidas agendas prioritárias da pasta e uso de recursos destinados à educação do país.
Segundo o "Estadão", os pastores atuam como lobistas, viajam em voos da FAB (Força Aérea Brasileira), destinado a autoridades, e facilitam a interlocução do gabinete do ministro com prefeitos e empresários.
A reportagem informa ter identificado, nos últimos 15 meses, a presença de Santos e de Moura em 22 agendas oficiais no MEC (Ministério da Educação), sendo 19 com o ministro. Algumas das reuniões são descritas como "de alinhamento político".
Os pastores atuam levando prefeitos a Brasília, participando de encontros no ministério, e acompanham Ribeiro em viagens pelo Brasil.
Segundo o jornal, no dia 16 de fevereiro, Ribeiro e o Arilton receberam, no gabinete do MEC, a prefeita de Bom Lugar (MA), Marlene Miranda (PCdoB), e o marido dela, Marcos Miranda. Segundo ele, a reunião foi para tratar da liberação de R$ 5 milhões para construção de uma escola na cidade. Miranda disse ao jornal que "o encontro foi agendado para tratar de assuntos do município, e não de igreja". Questionado se foi preciso fazer uma contribuição ao pastor, ele respondeu: "Que eu saiba, não".
A reportagem teve acesso a um vídeo em que Santos afirma ser o responsável por garantir verbas para prefeituras. A gravação foi feita durante uma viagem de Ribeiro a Centro Novo do Maranhão (MA), em maio do ano passado.
"Estamos fazendo um governo itinerante, principalmente através da Secretaria de Educação, levando aos municípios os recursos, o que o MEC tem, para os municípios", disse em vídeo.
No evento, o ministro da Educação disse preferir fazer o contato direto com os prefeitos, sem a intermediação de deputados ou senadores, função designada aos seus "amigos" pastores.
"Nós já fizemos em alguns lugares. Sem política, sem discurso de parlamentar nenhum. Respeito os parlamentares, mas é técnica", afirmou.
Em agosto, os pastores levaram o ministro para uma agenda com prefeitos em Coração de Maria (BA). Ao discursar, o pastor Arilton Moura agradeceu a presença de Ribeiro, deixando claro que ele havia patrocinado a visita do ministro.
"Houve o maior interesse de trazer o ministro, nosso irmão, nosso amigo, para cá. Esse é o nosso governo. É o governo do presidente Jair Bolsonaro (PL)."
Ribeiro saudou "meus amigos Arilton e Gilmar" e disse que "as coisas aconteceram também pela instrumentalidade dos senhores".
Conforme a reportagem, os pastores atuam principalmente na intermediação entre o MEC e prefeitos do Progressistas, do PL e do Republicanos, partidos que integram o Centrão.
O bloco de legendas comanda o FNDE (Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educação), órgão que concentra os recursos do ministério e é presidido por Marcelo Ponte, ex-assessor do ministro-chefe da Casa Civil, Ciro Nogueira, presidente do Progressistas. O FNDE tem um orçamento de R$ 945 milhões — no total, o MEC tem R$ 45 bilhões de verba.
Em 11 de março do ano passado, também houve uma reunião no gabinete do ministro com a presença dos pastores e representantes de 20 cidades. O site da prefeitura de Vianópolis (GO) informou a presença do ministro Ribeiro e dos religiosos "que, juntos, conduziram a reunião com as autoridades convidadas".
Um informe da prefeitura também falou sobre o objetivo do encontro: "A reunião foi para orientar sobre os recursos ligados à educação".
Durante congresso religioso em outubro passado, em Camboriú (SC), Ribeiro voltou a falar sobre a ligação entre ele e os pastores.
"Quero agradecer o honroso convite que eu tive da liderança aqui desse nosso encontro, à minha amizade ao pastor Gilmar, Arilton, que estão lá em Brasília, mais perto", afirmou. Gilmar dos Santos também falou: "Nesses últimos anos, Deus me deu esse privilégio de comungar uma comunhão e uma amizade muito sólida com o pastor Milton Ribeiro. Minha gratidão ao pastor Arilton Moura, fique de pé, pastor Arilton, pastor da nossa convenção, que é nossa base ali em Brasília".
Em janeiro do ano passado, num encontro de prefeitos com o ministro, na sede do MEC, Santos também explicou sua atuação. "Nós solicitamos esta reunião com o ministro para trazer ao conhecimento dele vários prefeitos que trabalham também com a igreja. Muitos deles são obreiros da nossa igreja e estão exercendo lá sua administração da maneira que o presidente da República defende, sem corrupção."
Procurado pelo jornal, Ribeiro não se manifestou. O UOL também entrou em contato com a assessoria do MEC e aguarda retorno.
O Estadão tentou contato com os pastores por meio da Assembleia de Deus Cristo para Todos, mas não obteve resposta. A reportagem também tenta localizá-los. O espaço está aberto para manifestação.
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