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Prefeito diz a TV que representante de igreja também negociava verba do MEC

Prédio do Ministério da Educação, em Brasília. Foto: Marcelo Camargo/Agência Brasil - Marcelo Camargo/Agência Brasil
Prédio do Ministério da Educação, em Brasília. Foto: Marcelo Camargo/Agência Brasil Imagem: Marcelo Camargo/Agência Brasil

Do UOL, em São Paulo

24/03/2022 23h45

O prefeito de Boa Esperança do Sul, José Manoel de Souza (PP-SP), revelou hoje, em entrevista ao "Jornal Nacional", da TV Globo, a existência do nome de uma nova personagem no suposto esquema para a liberação de verbas no Ministério da Educação.

Nely Carneiro da Veiga Jardim não trabalhava na pasta, mas participava de reuniões com o ministro Milton Ribeiro e seria uma espécie de intermediária do MEC.

À TV Globo, José Manoel de Souza relatou detalhes de uma reunião de prefeitos com Milton Ribeiro, em março do ano passado. Os pastores Gilmar Santos e Arilton Moura —ambos são acusados de fazerem tráfico de influência dentro do Ministério da Educação— convidaram alguns prefeitos para almoçar num restaurante de um hotel em Brasília e, segundo ele, Nely também estava presente.

Ele [pastor Arilton] me falou: 'Olha, prefeito, eu vou ser bem direto com você. Eu consigo fazer um papel, um ofício agora. Eu te libero a escola profissionalizante. Mas, em contrapartida, você precisa depositar R$ 40 mil na conta da Igreja Evangélica'. Aí eu levantei, bati no ombro dele e disse: 'Muito obrigado, pastor. Mas, para mim, dessa forma não serve. Prefeito José Manoel de Souza

"Desde a primeira reunião que eu fui no Ministério da Educação, e na segunda reunião, estavam os dois, tanto o Arilton quanto o Gilmar. E também junto, nesse restaurante, que conversava, articulava com alguns prefeitos, estava a Nely, que estava junto com ele. Quando eu estava conversando com ele na mesa, ele falou: 'Se você quiser, eu já chamo a Nely. Ela já faz o ofício e hoje mesmo eu libero para você a escola profissionalizante'", completou.

Segundo a reportagem, o nome de Nely consta em duas agendas do MEC como representante da Igreja Cristo para Todos, mas, na época, ela ocupava posto de liderança do MDB na Câmara.

Nely chegou a entrar em contato por meio de aplicativo de mensagens com outro prefeito, que pediu para não ser identificado. Ela aborda o político oferecendo a liberação de verbas no MEC e na Saúde em troca de votos para o deputado aliado.

  • Nely questiona: Bom dia, prefeito. Estamos com orçamento do MEC e Saúde, e queremos em troca uns votos para o nosso deputado estadual da igreja. Interessa?.
  • Prefeito responde: Claro. Quem é o candidato?
  • Nely retorna: É novo. O senhor pode ligar para o pastor Arilton.

Nely foi procurada pela reportagem, mas optou por não se manifestar e desligou o telefone.

Não, eu não tenho nada a declarar, está bem? Eu não tenho nada com isso. O que está aí é o que eu estou vendo, tá? Nely, por telefone

Reportagem publicada pela Folha de S.Paulo, na última segunda (21), o governo federal prioriza a liberação de recursos a prefeituras indicadas por dois pastores que não têm cargos oficiais no MEC: Gilmar Silva dos Santos e Arilton Moura Correia, os mesmos citados pelo prefeito de Boa Esperança.

Na gravação obtida pelo jornal, Ribeiro diz que isso atende a uma solicitação do presidente. Na ocasião, participaram prefeitos, os dois pastores e lideranças do FNDE (Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educação).

Após a divulgação do áudio, diversos parlamentares acionaram órgãos de controle público devido às denúncias contra a gestão de Milton Ribeiro no MEC. Já a Frente de Prefeitos classificou o suposto direcionamento de verbas como "lamentável".

Ministra determina abertura de investigação

A ministra Cármen Lúcia, do STF (Supremo Tribunal Federal), determinou hoje a abertura de um inquérito para investigar o ministro da Educação, Milton Ribeiro. A decisão atende a um pedido da PGR (Procuradoria-Geral da República), que vai apurar as suspeitas dos crimes de corrupção passiva, advocacia administrativa e tráfico de influência.

No documento, a magistrada destaca a gravidade do caso e que, por isso, "não poderia deixar de ser objeto de investigação imediata, aprofundada e elucidativa sobre os fatos e suas consequências, incluídas as penais".

Tem-se dos autos que Milton Ribeiro ocupa o cargo de Ministro da Educação e, nesta condição, teria praticado os crimes apontados, sendo eles 'de corrupção passiva privilegiada (art. 317, § 2º do Código Penal), prevaricação (art. 319 do Código Penal), advocacia administrativa (art. 321 do Código Penal) e tráfico de influência (art. 332 do Código Penal)'. A gravidade do quadro descrito é inconteste e não poderia deixar de ser objeto de investigação imediata, aprofundada e elucidativa sobre os fatos e suas consequências, incluídas as penais. Trecho do documento

Na decisão, a ministra também ressalta a necessidade de "investigar e esclarecer a materialidade e a autoria das práticas" descritas na notícia de crime.

"As circunstâncias expostas, que evidenciariam ocorrência de práticas delituosas a serem apuradas com o prosseguimento de ação penal pública incondicionada, tornam indispensável, segundo a manifestação do Ministério Púbico, o aprofundamento da investigação dos noticiados crimes", escreveu a ministra.

Ribeiro nega pedido de propina

Na terça-feira (22), o jornal O Estado de S. Paulo também revelou que um dos pastores que controlam um gabinete paralelo no Ministério da Educação pediu pagamentos em dinheiro e até em ouro em troca de conseguir a liberação de recursos para construção de escolas e creches, segundo informação repassada pelo prefeito do município de Luís Domingues (MA), Gilberto Braga (PSDB).

Segundo ele, o pastor Arilton Moura solicitou R$ 15 mil antecipados para protocolar demandas da prefeitura e mais um quilo de ouro após a liberação dos recursos.

Questionado sobre o suposto recebimento de propina no MEC, Ribeiro revelou surpresa em entrevista à CNN Brasil. "Eu nunca soube disse, jamais concordaria com isso. Eu sou um ministro que mandou 730 prefeitos para o TCU em 15 meses, por desvio ou por usar de maneira errada as verbas da Educação. Então, eu jamais soube disso", afirmou.