Com teclado e pastor: alunos fazem 'intervalos bíblicos' nas escolas de PE
O MP-PE (Ministério Público de Pernambuco) vai abrir uma audiência pública sobre "ensino religioso" e "laicidade" em escolas da rede pública do estado. Prevista para o fim de novembro, a consulta vem após uma reunião recente com o SEE-PE (Secretaria de Esportes e Educação) e o Sintepe (Sindicato dos Trabalhadores da Educação de Pernambuco), que relatou a existência de "cultos bíblicos" nos intervalos da escola pública.
O tema atraiu a atenção de deputados da bancada evangélica, que veem "desrespeito" à possibilidade de barrar as manifestações religiosas.
O que aconteceu
MP-PE instaurou um procedimento administrativo para acompanhar políticas públicas em abril. Documento dizia que o objetivo era "acompanhar o ensino religioso/laicidade nas unidades escolares da rede pública (no Recife)". Em setembro, o órgão fez uma consulta a pessoas envolvidas na área da educação para ouvi-las sobre o tema. Participaram, por exemplo, a presidente do Sintepe, Ivete de Oliveira, o assessor jurídico da SEE-PE Filipe Alencar, além de Eduardo Andrade, que é gerente geral de anos finais do Ensino Fundamental do SEE-PR.
Quando questionado sobre a situação do ensino religioso, o Sintepe mencionou que havia reclamações sobre os "intervalos bíblicos". Especificamente que a prática durava quase todo o intervalo e tinha virado praticamente um "culto", com presença de instrumentos musicais (como teclado) e de pessoas de fora da escola, inclusive pastores. De acordo com o sindicato, o promotor resolveu aumentar o escopo do acompanhamento de políticas públicas e decidiu fazer uma consulta pública sobre o assunto e o uso de dependências das escolas neste contexto religioso.
No TikTok há dezenas de vídeos de alunos vestidos com uniforme e nas dependências da rede de ensino público de ensino de Pernambuco. Tem gravações de rodas de oração, pregações feitas dentro da sala de aula e estudo bíblico (chamado de "intervalo bíblico").
Nós não somos contra o intervalo bíblico. A nossa preocupação é que a escola pública seja laica, conforme a legislação, com respeito a todas as crenças
Ivete de Oliveira, presidente do Sintepe
A reunião feita em setembro gerou uma notícia no site do MP-PE mencionando a participação da secretaria estadual e do sindicato para "debater a realização de cultos em escolas públicas". Como resultado, alguns sites noticiaram que o MP-PE estava investigando os "intervalos bíblicos". Consultado, o MP informou que está apenas fazendo uma consulta, e que não é uma investigação formal. A audiência pública está marcada para 27 de novembro.
Bancada evangélica critica a atuação do sindicato sobre os "intervalos bíblicos"."Qual é o mal que isso faz para a educação?", questiona o deputado Joel da Harpa (PL-PE), em vídeo publicado no Instagram. Político ressalta que o "intervalo bíblico vai continuar" e que é um "direito do cidadão".
O deputado André Pereira (PL-PE) fez crítica semelhante em sua página do Instagram: "Tentar impedir que alunos, por iniciativa própria, se reúnam na escola, nos intervalos de aula, é um desrespeito aos evangélicos e à própria laicidade do Estado".
Sindicato rebate crítica dos deputados, dizendo que "é a favor do ensino religioso de acordo com a lei e com o estado laico". Em nota, entidade diz que currículo do ensino religioso "incentiva o desenvolvimento de habilidades como reconhecer, respeitar e valorizar a crença de cada um e a diversidade das religiões" e o "combate a qualquer preconceito e discriminação".
Secretaria estadual de educação diz que a "ação é organizada pelos próprios estudantes, no intervalo das aulas, sem prejuízo ao calendário escolar". Além disso, em nota, a SEE-PE informa que "respeita a laicidade do Estado, a diversidade, a pluralidade e a valorização das diferenças".
Luiz Antônio Cunha, mestre em Planejamento Educacional pela PUC-Rio, professor titular da área da educação da UFRJ, bacharel em sociologia e especialista no estudo de religião na educação, acha "preocupante" o que está acontecendo em escolas pernambucanas e diz que a "colonização religiosa" é antiga no país. No passado, a Igreja Católica fazia isso. Com a Constituição declarando que o estado é laico, houve interrupção. No entanto, agora, citando o exemplo de Pernambuco, a estratégia tem sido feita por igrejas neopentecostais.
É preocupante o que está acontecendo, pois a escola não é lugar para a disputa de religiões. Religião deveria ser mencionada apenas nos contextos educacionais, como para falar da história do país. Não pode haver nenhum tipo de favorecimento a religião.
Luiz Antônio Cunha, professor titular da UFRJ
21 comentários
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Cleibe Avelino da Silva Fernandes
Está errado e pronto a não ser que possa também fazer um culto ao candomblé ou ao espiritismo. Vai poder? Esses pastores vão apoiar?
Mara Sandra Zanin
Bem, se evangélicos podem, então católicos, budistas, religiões de matriz africana também podem! E adeus escola laica! Ora é escola quartel, ora é teocracia! Muito difícil a situação da Educação no Brasil!
Raquel Ribeiro dos Santos
os umbansdista poderão cantar ponto para os orixas, os ateus levantar questionamentos sobre as pseudo religiõesou os budistas entoar mantras? essa liberdade só se aplica para o segmento """religioso""" que mais desrespeita as demais ??????POR FAVOR, HEIN !!!!!!!!