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"Para não passar fome", funcionário da Gama Filho vira ajudante de pedreiro

Pedro Paulo Boa Hora, 56, era auxiliar de biblioteca na Universidade Gama Filho  - Arquivo pessoal
Pedro Paulo Boa Hora, 56, era auxiliar de biblioteca na Universidade Gama Filho Imagem: Arquivo pessoal

Luciano Pádua

Do UOL, no Rio de Janeiro

24/01/2014 17h19Atualizada em 24/01/2014 18h54

De auxiliar de biblioteca a ajudante de pedreiro "para não passar fome”. Essa é a atual realidade de Pedro Paulo Boa Hora, funcionário da Universidade Gama Filho. Com o descredenciamento da instituição e da UniverCidade, ambas controladas pelo Grupo Galileo, muitos empregados enfrentam dívidas, confisco de bens e outras dificuldades por causa da falta de pagamento.

Pedro Paulo tem 56 anos, é cardíaco – um problema na válvula mitral descoberto na própria Gama Filho - e agora auxilia em uma obra na casa de seu sobrinho, que o contratou mais para ajudar o tio do que por sua experiência – nula – nesse ramo. Afinal, ele passou 18 anos trabalhando somente na Gama Filho, 12 deles na biblioteca da instituição.

“Nunca trabalhei com obra na minha vida. Foi uma porta que se abriu por consideração do meu sobrinho. Não tenho experiência nenhuma. Nunca imaginei que, aos 56 anos, estaria fazendo isso. É só para ter o que comer mesmo”, desabafa o funcionário.

Com quatro filhos, dois já casados, de 32 e 27 anos, e outros dois sob sua responsabilidade, de 18 e 8 anos, ele viu a situação financeira de seu lar se abalar desde que a universidade parou de pagar seus salários, em setembro do ano passado. São quatros meses sem os vencimentos, fora o pagamento do 13º e das férias. Some-se a isso o fato de o FGTS (Fundo de Garantia), criado justamente para proteger o trabalhador, não ser depositado em sua conta desde 2000.

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Pedro Paulo conta que os filhos mais velhos têm ajudado muito e conseguem cestas básicas para a família. Houve um momento em que ele precisou recorrer a uma igreja de Padre Miguel, onde vive, na zona norte do Rio, para obter alimentos. “No natal foi muito triste. Tive que contar com a ajuda dos meus filhos, minha esposa teve que fazer cesta de natal para os outros para tentar ganhar algum dinheiro e fiquei na obra. Não pude dar presente de natal à minha filha de oito anos. Decepcionei a expectativa dela”, frustra-se.

Na universidade ele recebia R$ 900 mensais. Agora, como ajudante de pedreiro, recebe R$ 800. A diferença pode parecer pouca, mas não leva em consideração os benefícios de trabalhar em uma universidade e o fato de estar arriscando sua saúde com uma atividade que exige mais de seu organismo.

Mais que um local de trabalho

Para ele, a Gama Filho era mais do que um simples local de trabalho. Na instituição ele se formou em direito e um de seus filhos fez o curso de administração. Os planos eram de que seu filho de 18 anos pudesse estudar na universidade. Além disso, o funcionário contava com atendimento médico na instituição, uma das maiores referências no Rio na área de medicina. Agora, enfrenta as longas filas dos hospitais públicos superlotados.

A situação se agrava de maneira significativa: mesmo que não receba, nem trabalhe, na Gama Filho, Pedro Paulo ainda mantém vínculo empregatício com a faculdade. Ou seja, legalmente, não pode buscar outras oportunidades.

“Para tentar uma oportunidade, tenho que me desligar da Gama Filho. Esse impasse do vínculo empregatício me impede de buscar um emprego. E no [departamento de] Recursos Humanos ninguém me atende. Quero pedir demissão, mas nem isso posso fazer”, conta Pedro Paulo.