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Com questões sociais e sobre Rayssa Leal, acaba o 1º dia do Enem 2022

Hanrrikson de Andrade, Rafael Neves, Caê Vasconcelos, Jessica Bernardo, Maurício Businari e Juliana Kirihata

Do UOL, em Brasília, e colaboração para o UOL, em Santos (SP) e São Paulo

13/11/2022 12h03Atualizada em 13/11/2022 21h35

Terminou hoje às 19h o primeiro dia de provas do Enem 2022. Com 3,4 milhões de inscritos, o menor número em 17 anos, o exame teve questões sobre temas como a Amazônia, Estado Democrático de Direito e a Guerra na Ucrânia. Nomes como o músico Chico Science e a skatista Rayssa Leal foram citados nas questões.

Os candidatos fizeram hoje as provas de Linguagens e Ciências Humanas, além da redação, que teve como tema "Desafios para a valorização de comunidades e povos tradicionais no Brasil". No próximo domingo (20), as disciplinas do exame serão Matemática e Ciências da Natureza.

Segundo professores consultados pelo UOL, a prova foi mais interpretativa do que a de anos anteriores, sem abandonar a "tradição" de incluir muitas questões sociais. Para Guilherme Freitas, professor de história das Escolas SEB, a grande questão da prova de humanas foi sobre "o que é o Estado de Direito".

"Questionava o que seria considerado uma violação do Estado de Direito. A resposta certa, neste caso, é o ato de não reconhecer o resultado das eleições de representantes políticos", disse. "Essa seria uma das questões mais importantes devido ao atual momento político", afirmou Freitas.

Pelo segundo ano consecutivo, no entanto, a prova não teve nenhuma questão sobre temas ligados a regimes totalitários, como a ditadura militar no Brasil ou a Guerra Fria. Esse conteúdos são obrigatórios do Ensino Médio, mas deixaram de ser abordados pelo Enem durante o governo de Jair Bolsonaro.

Algumas questões continham mapas em seus enunciados. Uma delas tratava de rochas ígneas, outra sobre incidência de luz solar, para tratar desta forma de geração de energia alternativa, e outra sobre petróleo e gás.

Na área de ciências humanas, uma das questões apresentava uma tirinha para discutir inclusão digital. Sob o título "Sem internet, favelas sofrem para se preparar para o Enem", a ilustração mostrava um estudante em uma casa segurando um celular na ponta de uma vara, tentando encontar um sinal de wi-fi.

Rayssa Leal, Carolina Maria de Jesus e Chico Science. Na literatura, Machado de Assis, Antônio Prata e Carolina Maria de Jesus foram alguns dos autores citados no primeiro dia de prova do Enem. Vivian Ulhôa, coordenadora pedagógica do Poliedro Colégio, disse que, como já era esperado, pouquíssimas questões abordavam questões muito restritas à gramática.

"A interpretação de texto e a análise do discurso foram muito mais cobradas nas questões de língua portuguesa, com alguns tópicos "clássicos" do Enem aparecendo: tipologias textuais, composição de gêneros discursivos e funções da linguagem."

Vivian destaca ainda a presença de uma questão sobre a inovação trazida por Chico Science à produção musical e outra que citava a skatista Rayssa Leal e a desconstrução de estereótipos de gênero.

A pergunta sobre Chico Science abordou a criação do manguebeat, estilo musical fundado no início da década de 1990 com a ideia de resgatar as raízes culturais de Pernambuco.

Já a questão sobre Rayssa Leal, que em 2021 se tornou a medalhista olímpica mais jovem da história do Brasil, tratou da desconstrução do skate e de outros esportes radiciais como exclusivas do público masculino.

Impressões sobre o exame. Na UniSantos, em Santos (SP), a aluna Lorrana Barbosa de Souza, 18, foi uma das primeiras a finalizar a prova. Moradora do bairro do Valongo, a jovem ainda cursa o ensino médio e levou junto os estudos da escola com a preparação para o Enem.

"Eu não planejava prestar este ano ainda, por mim eu deixaria para o ano que vem, para ter tempo de me preparar mais. Mas aí acabei topando participar por incentivo dos professores e dos meus colegas. Hoje vim com meus amigos, eles ainda estão lá dentro", contou.

Lorrana disse que, se der algo errado, pretende continuar no ano que vem a estudar, se preparar melhor para a prova. Com a pretensão de cursar direito, ela sabe que a área é bem concorrida e que tem que se destacar bastante no Enem para conseguir uma vaga em uma boa universidade.

"Só não pode parar. A gente tem que correr atrás do que quer. Este ano foi uma simulação. Experimentar o nervosismo, a ansiedade. A redação de hoje, por exemplo, que pedia para a gente falar sobre os povos originários. Não cheguei a me preparar tanto para desenvolver esse tema. Então, o susto é na hora. E a gente tem que resolver na hora. Já as demais questões, de ciências humanas e de linguagem, achei que seriam mais difíceis."

Dificuldade na redação. Para Matheus de Castro Silva Neves Mesquita, 17, que deixou o local de prova por volta das 15h40, o tema da redação, "Desafios para a valorização de comunidades e povos tradicionais no Brasil', também foi um complicador hoje. A exemplo de Lorrane, ele também está concluindo o ensino médio este ano e pretende cursar relações internacionais.

"Me surpreendi com o tema proposto. Achei que eles escolheriam algo bastante atual, ligado à política. Eu não estava preparado, mas consegui desenvolver um texto legal", afirmou. "O resto da prova foi mais de boa, mas tinha algumas pegadinhas para confundir a gente. Teve uma questão ligada ao feminicídio que eu fiquei um tempo parado nela, tentando compreender a sacada da pergunta."

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Rodrigo se surpreendeu com pergunta que fazia menção a medalhista olímpica
Imagem: Jessica Bernardo/UOL

Decepção com o tema. Um dos primeiros vestibulandos a terminar o primeiro dia de provas do Enem na UNIP da Barra Funda, zona oeste SP, Rodrigo Alves, 28, sentiu que o exame teve o mesmo nível de dificuldade que nos anos anteriores. "Estava tranquilo, para mim não mudou muita coisa", contou. Ele afirma que se surpreendeu com uma pergunta que citava a skatista e medalhista olímpica Rayssa Leal.

Já o estudante Gabriel Valente, 18, contou que foi pego de surpresa com o tema da redação. "Achei a prova tranquila, estava nos parâmetros que eu esperava.Mas a redação me decepcionou um pouco, esperava alguma coisa sobre a nova política que está entrando no Brasil, ou sobre a pandemia", explicou o jovem.

Assim como Gabriel, Leonardo de Moura Sousa, 18, também não esperava que fosse este o assunto da dissertação. "Foi um baque, mas eu dei um jeito", contou o aluno. Na expectativa para o próximo domingo, quando as provas serão sobre ciências exatas e da natureza, Leonardo disse vai aproveitar a semana para estudar alguns conteúdos. "Eu devia ter estudado mais, ter dormido melhor", lamentou.

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Enem 2022: Leonardo de Moura Sousa, 18, fez uma autocrítica: 'Devia ter dormido melhor'
Imagem: Jessica Bernardo / UOL

Fazendo o Enem pela segunda vez, a adolescente Larissa dos Santos Lima, 17, disse acreditar que foi melhor neste ano. "Estava mais fácil. Principalmente a redação, o tema foi muito mais claro para mim esse ano. Deu pra fazer mais rápido", afirmou a vestibulanda, que quer cursar Jornalismo e já leu sobre os povos tradicionais do Brasil. Agora, ela torce para ir bem no segundo dia de provas.

Desafio na pandemia. Ao UOL, a estudante Carine Vitória da Silva, 18, relatou ter enfrentado dificuldades durante a pandemia para estudar (por meio de aulas online) com foco nas provas do Enem.

"A professora treinou a gente, mas com certeza é difícil", comentou a aluna, que pretende cursar Veterinária.

Carine e os colegas Lucas Fagundes Santiago, 18, e Rafael Fernandes Pereira, 18, levaram cerca de uma hora para sair do bairro em que moram, no Jardim Paulistano, zona norte de São Paulo, e chegar até o local de prova, na Unip da avenida Marquês de São Vicente, na Barra Funda, zona oeste da capital paulista.

No terceiro ano do ensino médio, Rafael acredita que a prova deste ano o ajudará a entender melhor os conteúdos que devem ser estudados e pretende prestar o Enem novamente em 2023.

"Esse ano eu estou mais para pegar experiência para o ano que vem, para ver o que estudar no ano que vem."

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Lucas, Carine e Rafael fizeram a prova do Enem 2022 em São Paulo
Imagem: Jessica Bernardo/UOL

Vai bem em 'Humanas'. A estudante Eduarda Ariel Soares, 17, já se formou no Ensino Médio e passou o último ano se dedicando exclusivamente aos estudos para a prova do Enem. Apesar da ansiedade, ela disse que se sente preparada para ir bem no exame, principalmente em Português e História, matérias que ela acredita dominar.

"Estou um pouco nervosa com a prova nas áreas de Exatas, me dou melhor nas matérias de Humanas, mas acredito que me preparei para ir bem também nessas matérias".

Eduarda frequentou dois cursinhos preparatórios para conseguir juntar o conhecimento necessário para se sentir preparada e ir bem no exame do Enem. Ela se dedicou 6 horas por dia, nos últimos 12 meses.

"Quero cursar Psicologia. Sei que é bem concorrido, então o namoro, as saídas com a galera, tudo ficou em segundo plano. No momento, para mim, o mais importante é conseguir uma boa colocação em uma boa faculdade".

Viagem de quase uma hora até o local da prova. Luana Cristina Puglisi, 17, fez um deslocamento de quase uma hora de casa até a UniSantos (Universidade Católica de Santos). Moradora da Praia Grande, ela foi ao município vizinho de Santos, no litoral de São Paulo, para fazer a prova do Enem digital.

"Eu leio melhor no computador, e também digito melhor no computador. Eu até que escrevo bem à mão, mas como hoje era dia de redação, eu não quis arriscar. Preferi fazer a prova digitalmente."

Luana diz que há um ano vem estudando diariamente as matérias para a prova cerca de 8 horas por dia. O tempo de estudo aumentou nos fins de semana, quando chegou a se dedicar 13 horas por dia.

"Mesmo assim, eu sinto que não me preparei como queria. Sinto ainda uma certa carência de conhecimento na área de Exatas. Sou uma apaixonada pela área de Humanas e também pela natureza. Por isso eu quero prestar e cursar faculdade de Química. Quero ensinar química para outras pessoas".

Confiança para uns. Fábio Gustavo Apolinário Silva, 19, saiu da Freguesia do Ó, na zona norte de São Paulo, para fazer o exame na Barra Funda. Na expectativa de cursar história na USP (Universidade de São Paulo), ele conta que estudou durante todo o ano para o Enem.

"Eu fiz um cursinho popular no bairro do Tatuapé e estudei um pouco em casa também", contou o jovem.

Realidade para outros. Daniel Monteiro, 19, presta o Enem pela segunda vez. Ele relatou não ter conseguido se dedicar aos estudos como gostaria.

"Eu achei que conseguiria conciliar trabalho com estudo, mas eu fiquei muito exausto", disse ele, enquanto explicava que havia comprado um curso online para ajudá-lo a se preparar para o próximo ano.

Despedida. Esta é a última edição realizada durante o governo de Jair Bolsonaro (PL) — nos últimos quatro anos, a prova passou por turbulências e denúncias de supostas tentativas de interferência.

Recém-eleito em 2018, Bolsonaro criticou uma pergunta da prova que tratava do "dialeto secreto" usado por gays e travestis. Numa entrevista para o apresentador José Luiz Datena, ele afirmou que na sua gestão o MEC (Ministério da Educação) não traria de "assuntos dessa forma".

Enem na reta. Nos últimos anos, o exame, esteve na mira do governo Bolsonaro. Além de o presidente criticar perguntas da prova, seus ministros sinalizaram que queriam ter acesso prévio às questões do exame, que se tornou a principal porta de entrada ao ensino superior.

Foi também durante sua gestão que o Inep (Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais), responsável pelo exame, passou pela pior crise de sua história. Dezenas de servidores pediram exoneração às vésperas do Enem 2021 e criticaram a falta de critério técnico nas decisões do órgão.

Sob o governo Bolsonaro, o instituto teve cinco trocas na presidência e sucessivas mudanças na liderança das diretorias do órgão.

De acordo com servidores ouvidos pelo UOL, a situação só melhorou de agosto deste ano para cá com a última troca na presidência — Carlos Moreno, servidor de carreira e com experiência técnica, assumiu o comando do Inep naquele mês.

Como é a prova do Enem. Hoje, os participantes precisam responder 90 perguntas relacionadas a ciências humanas e linguagens. Eles também devem produzir uma redação com tema determinado pelo Inep.

De acordo com o edital do Enem, é obrigatório levar:

  • Caneta esferográfica de tinta preta, fabricada em material transparente.
  • Documento de identificação original e com foto.

Como a prova do Enem é longa, é importante pensar também na alimentação e na hidratação: leve uma garrafa de água transparente e lanches práticos para fazer durante o exame. Hoje, 13, o exame termina 19h.

É importante saber ainda quais são os erros que zeram a redação do Enem, que pode eliminar o candidato na busca por uma vaga no ensino superior.

O uso de máscara de proteção contra a covid-19 não será obrigatório e os candidatos devem seguir a legislação de cada estado. O UOL reuniu outros materiais que são recomendados e quais não devem ser levados.

Já no domingo que vem (20), os alunos terão 90 perguntas das provas de matemática e ciências da natureza para responder. Sem redação, a prova durará 30 minutos a menos — encerrando às 18h30.

Cuidado com itens proibidos

O edital do Enem proíbe que o candidato faça a prova portando uma série de itens. Antes de entrar na sala, o participante receberá um envelope porta-objetos para guardar todos os itens proibidos.

Equipamentos como telefone celular, tablets e relógios inteligentes devem ser desligados e mantidos dentro do porta-envelopes lacrado desde o ingresso até a saída definitiva do local de provas.

Por isso, cuidado: qualquer tipo de notificação desses dispositivos, mesmo que seja um alarme, é motivo para eliminação do candidato.

Não é permitido fazer o Enem usando boné, gorro e óculos escuros. Caneta de cor azul, lápis e borracha também não podem ser usados na prova.

Veja aqui a lista completa dos objetos que são proibidos na prova do Enem.