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Escolas que descumprem a lei, a matrícula é a primeira parcela da anuidade

Aline Arruda/UOL
Imagem: Aline Arruda/UOL
Guilherme Perez Cabral

25/09/2017 04h00

Lembro a todos. O valor com nome de “matrícula”, pago pelo estudante ou seu responsável, nada mais é do que a primeira parcela do preço anual (anuidade) cobrado pela instituição de ensino.

Os contrato de prestação de serviços educacionais e o valor cobrado pelas escolas, faculdades e universidades seguem regras próprias, previstas na Lei nº 9.870/1999.

A lei prevê a forma como é calculado o preço em cada ano, mencionando os acréscimos admitidos em relação período ano anterior. E estabelece que o montante apurado será dividido pelo número de meses (daí se falar em “mensalidade”). Quanto à matrícula, repito, é a primeira parcela. Só isso.

A lei autoriza, vale ressaltar, “a apresentação de planos de pagamento alternativos, desde que não excedam ao valor total anual ou semestral”. Em suma, faculta à escola apresentar opções para o pagamento, dividindo o MESMO valor em mais vezes, ou, ainda, conferindo desconto a quem paga à vista. Veda, por outro lado, cobrar a mais, criar novas parcela, chamando o desrespeito praticado de “matrícula”.

Retomar o óbvio, repetir o que é evidente tem um motivo. Nos últimos dias, deparei-me com dois casos de descumprimento da regra. Instituições de ensino superior praticando ilegalidades, cobrando “matrícula” que não é a 1ª parcela da anuidade.

Um jovem advogado, no auge da arrogância própria de ignorantes (só a ausência de saber justifica a crença de saber tudo), disse próximo a mim – eu acabei escutando – que a taxa de matrícula, para além da anuidade, cobrada pela faculdade onde estudou, é válida. Freud deve explicar. Sério, o sujeito foi sacaneado por anos. Tiraram-lhe dinheiro indevidamente. Agora, com carteirinha da OAB, assume e reproduz o discurso do ladrão.

O outro caso. Um colega me consultou sobre o assunto. Contou de um parente seu que entrou em Medicina e a Universidade exigia, a título de matrícula, um valor exorbitante, para “garantir a vaga”. Errado. Ilegal.

Gostaria que fosse só uma infeliz coincidência. Mas a verdade é que, no Brasil, o direito continua se confundindo com privilégio. Vale para quem tem poder e influência (ou lambe botas de quem tem) para impor a aplicação.

A lei está lá, mas não se “institucionaliza”. Não nos habituamos ao seu cumprimento e também não temos expectativa de que os outros vão cumprir.

O direito só funciona na base da sanção, da pena. Diz Michel Miaille, é associado à imagem da polícia: “como os homens não são suficientemente ajuizados para respeitar a ordem social, é preciso forçá-los a esse respeito”. Forçar os outros, claro. No nosso caso, vale sempre o juízo prévio de conveniência, análise das forças em conflito, o cálculo egoísta das vantagens e desvantagens de ser legal.

O direito, concordo com Miaille, para ser direito, tem de sobreviver com pouco ou nenhum uso da repressão. A observância da lei como uma prática habitual. Todos, assim, confirmando a expectativa geral de que todos cumprirão as regras do jogo.

Isso exige, sem dúvida, um aprendizado longo e difícil. Desanimam, portanto, casos como o aqui narrado. A própria escola dando o mau exemplo. Agindo de forma ilegal, cobrando o que não pode.

Levanta a questão sobre quem educará os educadores de um direito que valha para e seja respeitado por todo mundo. Como, senão com o uso da força, colocar na linha, instituições de desensino e pupilos da canalhice que proliferam por aí.