Premiado em competição nos EUA vendeu apartamento para voltar a estudar

Com 21 anos, Ramon Coelho de Souza comemorou a entrada no curso de pedagogia da UEMG (Universidade do Estado de Minas Gerais). Hoje, aos 34 anos, ele celebra mais duas conquistas: o diploma de mais uma graduação - em jogos digitais - e um grande prêmio internacional de uma competição estudantil de tecnologia realizada pela Microsoft, a Imagine Cup 2016.

O jovem fez parte da equipe brasileira que venceu uma das categorias com o jogo digital "O sonho de Jequi", que tem como pano de fundo a seca no Vale do Jequitinhonha, em Minas Gerais. A final da competição foi acompanhada pelo UOL em julho. 

Segundo Ramon, tudo isso não teria sido possível se, em determinado momento de sua vida, ele não tivesse tido a coragem de “largar tudo” (carreira, emprego, casa) e recomeçar os estudos.

Para entender melhor a história de Ramon, é preciso voltar alguns anos. Confira a seguir o relato do formando:

"Nasci lá no vale do Jequitinhonha, em Araçuaí [sudeste de Minas Gerais]. Estudei em escola pública durante toda a vida. Mas eu mudei para uma escola particular no ensino médio. Como minha mãe era professora e sabia que seria difícil ter dinheiro para pagar uma faculdade, ela viu que seria melhor eu ter um ensino reforçado para conseguir passar na universidade pública. Então, conheci os dois lados da educação, sabe?

Só tinha mesmo minha mãe, meu pai faleceu quando eu tinha 13 anos de idade. Com muito sacrifício ela conseguiu pagar a escola particular. Foi uma escolha dela para eu ter uma melhor educação. 

Estudei bastante e passei na UEMG com 21 anos. Naquela época, eu queria mesmo era ter estudado ciência da computação, mas, devido à minha dificuldade em exatas e muita facilidade na área de humanas, a pedagogia me pareceu ideal para conseguir realizar meu sonho trabalhar com algo ligado à tecnologia, dando aula de informática para as pessoas.

Nesse meio tempo, comecei a trabalhar numa empresa de e-learning [modalidade de ensino a distância]. Aprendi muito, viajei bastante, mas chegou um momento em que eu me senti infeliz. Eu queria fazer mais por mim e pelas pessoas. Queria estudar, melhorar como profissional. Eu até cheguei a passar num mestrado, mas por causa do trabalho e de uns problemas pessoais não pude fazer. 

Aí, resolvi retomar meu antigo sonho. Prestei o vestibular da PUC-MG [Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais] e passei no curso de jogos digitais, aos 30 anos. Não vou dizer que foi fácil, porque não foi. Eu já era bem-sucedido na minha carreira, na minha área, mas era um sonho que eu queria realizar. A educação liberta. Ela tem o poder de nos transformar.

Durante a [segunda] graduação tive muitos desafios por estar voltando a estudar depois de tantos anos, ainda mais na área de exatas. Como eu já imaginava que não iria ser fácil, eu parei de trabalhar, peguei o apartamento que havia comprado há alguns anos e vendi. Com o dinheiro que consegui, fui me sustentando durante os quatro anos [do curso]. Só assim para eu conseguir me dedicar exclusivamente aos estudos. Era uma coisa que eu queria. Não queria fazer por fazer. Eu queria aprender mesmo. 

Fazer pedagogia, trabalhar com educação me fez enxergar o mundo de outra forma e também entender o mundo de outra forma, aproveitar mais a vida. Por isso, persisti no meu sonho.

Me formei em jogos digitais no final do ano passado, com 34 anos. Foi uma conquista incrível.

Dois anos antes tive a ideia de montar uma empresa para desenvolver jogos educativos. Seria perfeito unir minha formação em pedagogia e meu conhecimento em tecnologia. Já desenvolvemos alguns jogos e vencemos algumas competições de tecnologia. O último prêmio agora foi demais. Nós ganhamos o 3º lugar na categoria "Games" da Imagine Cup. Parece que é o reconhecimento do nosso esforço e ainda mais a certeza de que eu fiz a escolha certa.

Quero espalhar por todos os lugares o quanto acredito que a educação contribui para a vida das pessoas e tem a capacidade de transformação. Assim como ela fez na minha vida."