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Proposta específica da redação do Enem pode levar aluno a fugir do tema, dizem professores

Ana Carla Bermúdez

Do UOL, em São Paulo

05/11/2017 16h32

Professores ouvidos pelo UOL avaliam que o Enem (Exame Nacional do Ensino Médio) acertou na escolha do tema “Desafios para a formação educacional de surdos no Brasil” para a prova de redação deste ano, mas alertam que, por se tratar de uma proposta muito específica, o candidato que não estiver atento à temática pode fugir do assunto, erro que pode zerar a nota da redação.

“Quando você fala na inclusão tocante a todos os deficientes dá para falar com uma certa amplitude, mas a questão dos surdos é bem específica. Muitos alunos que não estiverem atentos a esse ponto podem acabar caindo na fuga do tema”, diz Rodrigo Noronha, professor de redação do Sistema COC de Ensino.

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Sérgio Paganim, supervisor de português do Curso Anglo, reforça que para conseguir uma boa nota o candidato deve “saber o que a banca quer, lendo bem os textos da coletânea”.

Junto à proposta apresentada, o Enem traz os chamados textos motivadores, que costumam ter dados e informações sobre o tema para que, além de entender melhor o recorte esperado, o candidato possa refletir sobre as várias dimensões do problema.

“Não dá para tirar nota mil colocando o que você quer no texto. É preciso ter uma adequação à proposta”, explica.

Maria Aparecida Custódio, professora do laboratório de redação do Curso e Colégio Objetivo, ressalta que, apesar do assunto específico em relação aos surdos, já era esperado que o Enem trouxesse para debate a temática da inclusão dos portadores de necessidades especiais.

“Existe o Estatuto da Pessoa Com Deficiência e ele não é respeitado. As escolas, por exemplo, não são inclusivas”, disse.

“Esse é um tipo de tema que não tem uma polêmica de ser favorável ou contrário. A polêmica que tem aqui é em relação ao tipo de desafio que é imposto para a sociedade”, afirma Paganim.

Inclusão e invisibilidade

Para os professores, uma boa redação sobre o tema deve trazer argumentos que evidenciem a exclusão dos surdos na sociedade e o preconceito que eles historicamente sofrem.

“Essas pessoas padecem de uma doença chamada invisibilidade. Elas fazem parte da população, mas não são levadas em conta como pessoas que podem ser produtivas, que podem atuar como qualquer outra”, afirma a professora Maria Aparecida, que questiona: “Como se pode contribuir para a formação educacional quando não se leva em conta a Libras [Língua brasileira de sinais], quando eles sequer têm acesso às informações?”.

Para o professor Paganim, um bom caminho para o candidato é refletir sobre de quem é a responsabilidade por tomar ações para a inclusão da comunidade surda.

“Esses desafios, por exemplo, podem ser das instituições, dos professores, dos próprios colegas, das famílias. A quem compete mais ações para a inclusão? Às instituições, aos professores, aos próprios colegas, às famílias?”, questiona.

Noronha lembra que, além da problemática da inclusão, o candidato precisa obrigatoriamente abordar as dificuldades do acesso à educação para a comunidade surda, trazendo soluções para elas.

“Ele pode sugerir classes mistas [com alunos com e sem deficiência auditiva], a inclusão de mais de um surdo em sala de aula para que eles tenham contato um com o outro, escolas preparadas para recebê-los, que a mídia ataque essa segregação, que existam programas educacionais que tenham a surdez como norte”, afirma.

“O candidato tem que enfatizar o preconceito, a exclusão e sobretudo como a escola deixa a desejar em relação ao tratamento esperado para esses estudantes com deficiência auditiva”, destaca a professora Maria Aparecida, que sugere como propostas de intervenção “colocar as leis já existentes [como o Estatuto da Pessoa Com Deficiência] em prática e criar mais cotas”.

Prova do Enem em Libras

O tema sobre a formação educacional dos surdos aparece no mesmo ano em que o Inep (Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira), órgão responsável pela aplicação da prova utilizou pela primeira vez uma vídeo prova traduzida em Libras para participantes com surdez ou deficiência auditiva. Até 2016, os participantes podiam optar pelos auxílios de tradutor-intérprete de Libras e de leitura labial, que continuam disponíveis.

Neste ano, a Cartilha do Participante, que traz dicas para os candidatos e especifica as competências avaliadas na prova de redação, também foi lançada pela primeira vez em Libras.

Confira abaixo o gabarito extraoficial dos quatro cadernos de prova deste domingo: